Crónicas

Calheta

Passou o dia do concelho e recordei um episódio. Estávamos numa campanha autárquica, usava-se megafones na saída das missas, à porta das igrejas. Fui colaborar com os companheiros da Calheta. Na cidade comentava-se que o CDS poderia disputar a câmara local. O nosso candidato estava a iniciar-se na política.

Em cima do muro aguardei que os oradores adversários acabassem as intervenções. Chegaram primeiro. Quiçá mais “beatos” do que nós, sabiam a que horas acabavam as celebrações da eucaristia.

Foi aí que ouvi o desaforo, “o PSD tem de trazer gente do Funchal para falar”. Atrevimento, pensei. Ao lado do candidato adversário que me provocava estava o então líder do partido centrista, que sorria matreiro, indiferente ao facto de ser tão funchalense como eu.

Discursei depois. Terminando, anunciei o nosso candidato e passei-lhe o megafone. Era a 1ª vez e não estava à espera. Mas saiu-se bem. O mais é começar, diz o povo com razão, virou tagarela e um dotado experiente orador.

Acabadas as eleições, estava a almoçar com a minha mãe quando me perguntou por onde tinha andado na campanha. Na Calheta, respondi. É o concelho do teu avô, disse-me. Materno, já se vê. Não queria acreditar no que estava ouvindo. Então sou descendente de calhetense? E só agora é que me dizes? Ora bolas, desabafei.

Pois é. O meu bisavô era da Calheta e a minha bisavó do Porto Moniz. Encontraram-se, imagino, algures onde deixou de haver classificativa do rali e casaram. A descendência foi grande. E o meu avô um deles. Por obra e graça do destino acabei por lá a viver, intermitentemente, há já muito tempo. E onde espero, se Deus permitir, passar os últimos dias da minha vida. Mas não tem pressa.