Ao '20 de fevereiro' o que é do '20 de fevereiro'.

Afirmações, pregações, comparações, conclusões, reiteradamente, de tudo li e ouvi sobre a tamanha precipitação decorrente da depressão 'Oscar' na comparação com o 20 de fevereiro de 2010. Porém ao vazio de fundamentos sobra o ruído informativo.

Acresce que os dois eventos, pelas suas caraterísticas, não podem ser devidamente comparáveis. Seria como fazer um paralelo entre um maratonista isolado e uma equipa de 400 metros estafetas.

Vejamos. Nos dias 5 e 6, a tempestade 'Oscar' causou uma grande precipitação centrada na zona do Areeiro e é de relevar o facto de que a estação do Chão do Areeiro atingisse um máximo histórico de precipitação em Portugal num longo período de 24 horas, quer num dia (497,5 mm), quer em 24 horas deslizantes até às 14:40 do dia 6 (609,8 mm).

Mas as restantes estações ficaram bem abaixo. O Observatório do Funchal, com 116mm no dia 6 de junho e 133.8mm nas 24 horas deslizantes até 12:30 do dia 6, ficou bastante abaixo do seu máximo diário de 292,7mm em 28/03/2021, assim como dos 144,3mm no '20 de fevereiro'.

Por outro lado, o que mais distinguiu e potenciou a catástrofe do '20 de fevereiro' foi a rápida escorrência da enorme e sinérgica precipitação ocorrida em períodos curtos e quase simultâneos nas diversas estações.

Assim, no '20 de fevereiro', os máximos em períodos deslizantes de 1, 6 e 12 horas foram no Areeiro de 78.5mm, 272.1mm e 372,4mm, enquanto no passado dia 6 foram de 38.3mm (48,8%), 186,6mm (68,6%) e 331.2mm (88,9%), e no Funchal registaram-se máximos de 51.3mm, 111.5mm e 138,4mm, em confronto com 22,2mm (43,3%), 54,8mm (49,1%) e 78,7mm (56,9%) no dia 6.

Note-se, ainda, que os recentes máximos no Funchal para os períodos de 1, 6 e 12 horas foram até inferiores (respetivamente 78%, 86% e 67%) àqueles observados no dia 2 (dois) de fevereiro de 2010.

E esta é uma caraterística relevante na diferenciação destas duas intempéries. Se a depressão 'Oscar' surge após meses de fraca pluviosidade, o '20 de fevereiro' é o culminar de meses de intensa precipitação muito acima da média.

Conforme calculado pelo IPMA, desde 1 de outubro de 2009 até 31 de janeiro de 2010 a precipitação média na Madeira foi de 930 mm, muito acima da média de 701 mm.

O mês de dezembro de 2009 merece especial referência com valores excecionais de precipitação na Madeira. No Funchal o acumulado mensal foi de 286mm, o maior valor desde 1949, e no Areeiro totalizou 1103mm, 2,5 vezes a média.

Mais ainda, em fevereiro de 2010, a precipitação total foi 4,2 vezes a média no Porto Santo, 4,3 vezes no Lugar de Baixo, 3,6 vezes no Areeiro com 1379mm e 7,1 vezes no Funchal com 459mm.

Não quero aqui depreciar as obras de reparação e prevenção efetuadas pelos mais de mil milhões de euros alocados com grande solidariedade nacional na Lei de Meios e que naturalmente mitigaram as consequências desta última tempestade.

Nomeadamente poderão ter sido importantes os açudes de retenção de cargas sólidas nas ribeiras, mas infelizmente ninguém competente apresentou fotos ou notas da sua eficácia.

Por isso, mais do que pregações e conclusões não fundamentadas fico esperando por análises e relatos quantificados e objetivos.

Óscar Teixeira