Hugo Mendes afirma que se colocou "na mão dos advogados"
O ex-secretário de Estado Hugo Mendes admitiu hoje que se colocou "na mão dos advogados" na negociação da saída de Alexandra Reis da TAP e que o Ministério agiu de boa fé, respeitando o princípio da responsabilidade dos gestores.
"Eu pus-me na mão dos advogados, o meu papel não era fazer 'compliance' [conformidade] jurídica, [...] e nós agimos de boa fé, respeitando o princípio da responsabilidade dos gestores", afirmou Hugo Mendes, na audição na comissão de inquérito à TAP que durou quase sete horas.
O ex-governante reiterou ainda que nunca foi sinalizado pela empresa qualquer risco inerente ao acordo que permitiu o pagamento do uma indemnização de 500.000 euros a Alexandra Reis e que, numa reunião no dia 01 de fevereiro de 2022, o assessor jurídico da TAP apresentou "a possibilidade" de se pagar aquele montante pela saída antecipada da então administradora, mas não foi discutido o enquadramento jurídico do acordo.
"Se me pergunta se a ex-CEO sonegou informação, eu não sei quais foram os passos nem tenho de saber os passos dados do ponto de vista societário a partir do momento em que a nossa intervenção cessa. [...] Já agora gerimos a empresa da Avenida Barbosa du Bocage [Ministério das Infraestruturas] e já agora com os salários deles", respondeu Hugo Mendes ao deputado do BE Pedro Filipe Soares.
O ex-secretário de Estado da equipa de Pedro Nuno Santos - que estará na quinta-feira na mesma comissão de inquérito - sublinhou mesmo que "a mais interessada em que a TAP cumpra a lei é mesmo a engenheira Christine Ourmières-Widener", que foi exonerada das funções de presidente executiva na sequência da polémica indemnização.
Hugo Mendes rejeitou também as afirmações do ex-presidente do Conselho de Administração da TAP, Manuel Beja, na comissão de inquérito, de que o ex-secretário de Estado era uma "força de bloqueio" em relação ao processo de recrutamento de dois administradores, que teria custos para a TAP.
Naquela altura, em 2022, o país tinha ido a eleições antecipadas em janeiro, mas o Governo de maioria absoluta de António Costa só viria a tomar posse em 30 de março, e a anterior equipa do Ministério das Infraestruturas ainda não sabia se se manteria no Governo, e, por este motivo, Hugo Mendes aconselhou Manuel Beja a aguardar.
"Eu não fui força de bloqueio, eu achei que a legitimidade democrática era mais importante que a pressa do doutor Manuel Beja", reiterou o ex-secretário de Estado.
Ainda sobre o ex-presidente do Conselho de Administração, que se queixou na comissão de inquérito de dificuldade em falar com o então ministro Pedro Nuno Santos, Hugo Mendes disse que a quase totalidade das comunicações com empresas públicas tuteladas pelas Infraestruturas eram feitas com o secretário de Estado, que tinha delegação de competências, e não com o ministro.
"O que eu posso dizer é que sempre que o doutor Manuel Beja queria falar comigo, eu falava com ele", assegurou.
Na reta final da audição, Hugo Mendes revelou ainda que tentou fazer reuniões com a presidente executiva, o administrador financeiro e o presidente do Conselho de Administração, porque Manuel Beja queria ser informado, o que considerou legítimo.
"Creio que fiz duas reuniões e correram muito mal, correram mal, porque eu percebi que havia tensão forte entre as pessoas. Foi meu entendimento segmentar as reuniões, [...] e transmitia tudo o que sabia ao doutor Manuel Beja. Foi a opção que me pareceu melhor, porque às tantas eu não queria estar ali a mediar o que me pareciam ser tensões entre administradores", afirmou, acrescentando nunca se ter furtado a prestar qualquer informação a Manuel Beja.
Já em resposta ao deputado comunista Bruno Dias sobre a redução do número de trabalhadores na companhia, o ex-secretário de Estado disse que a Comissão Europeia está sujeita ao Tribunal Europeu de Justiça, sendo, por isso, "híper prudente nas suas decisões", com a agravante de ter de lidar com "um litigante profissional chamado Ryanair".
"Os cortes de trabalhadores até ao osso, eles podem ter acontecido, mas foram completamente involuntários", acrescentou Hugo Mendes.
Relativamente ao comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) a dar nota que Alexandra reis renunciada ao cargo na TAP para abraçar novos desafios profissionais, o ex-secretário de Estado sublinhou que aquela comunicação era da responsabilidade dos órgãos sociais da TAP.
"Não digo que não fosse falso, estou a dizer que do nosso lado volto a invocar o princípio da boa fé. [...] A entidade emitente é a TAP, se tivesse sido o Governo, isso era outra coisa", afirmou, tendo também insistido que 500.000 euros de indemnização a uma administradora pareceu-lhe um valor passível de ser aceite, até porque havia algumas rescisões amigáveis com trabalhadores cujo valor pago foi de cerca de 250.000 euros.
Hugo Mendes revelou ainda que a remuneração de Alexandra Reis era inferior em 45% à do seu antecessor, David Pedrosa.
Já o deputado da IL Bernardo Blanco questionou o ex-responsável sobre uma auditoria da EY que concluiu terem sido pagos 8.5 milhões de euros a 13 administradores da TAP, tendo sido o último pagamento a cada um deles feito entre 2020 e 2023, tendo Hugo Mendes respondido desconhecer esta auditoria.