Sérvia prendeu no seu território três polícias kosovares albaneses
As autoridades sérvias anunciaram ontem a detenção de três polícias kosovares suspeitos de entrarem ilegal na Sérvia e planearem uma ação terrorista, com Pristina a acusar Belgrado de ter sequestrado o grupo a partir do Kosovo.
O diretor do gabinete para o Kosovo e Metohija do Governo sérvio, Petar Petkovic, disse aos 'media' locais que os polícias kosovares foram detetados perto da aldeia de Gnjilica, município de Raska, num bosque "profundamente no interior da Sérvia".
Assegurou que os detidos, que definiu como terroristas, estavam equipados com armas automáticas, dispositivos GPS e outro material.
"A sua detenção pela polícia sérvia impediu que cometessem um ato penal perigoso. A investigação dirá qual seria", acrescentou Petkovic.
O mesmo responsável indicou que as autoridades sérvias estão dispostas a divulgar todos os dados sobre o caso e inclusive aceitar, se necessário, uma investigação internacional destinada a provar que as detenções ocorreram em território sérvio, ao contrário do que alega Pristina.
O primeiro-ministro do Kosovo, Albin Kurti, assegurou na capital kosovar que os polícias foram "sequestrados" em Leposavic, em território kosovar, a cerca de 300 metros da fronteira com a Sérvia.
"A entrada das forças sérvias no território do Kosovo é uma agressão com o objetivo de escalada e desestabilização", disse Kurti, que exigiu a libertação imediata dos polícias e uma condenação internacional.
Kurti também associou este incidente à detenção na terça-feira de um cidadão sérvio kosovar, Milun Milenkovic, acusado de "ser um dos líderes do crime organizado" no Kosovo.
A detenção dos polícias kosovares ocorre num momento de forte tensão entre o Kosovo e a Sérvia devido à recusa dos sérvios kosovares em aceitarem responsáveis locais albaneses kosovares na sequência de eleições municipais de abril passado que boicotaram em massa, com uma taxa de abstenção perto dos 97%.
Cerca de 120.000 sérvios vivem no Kosovo (numa população total de 1,8 milhões de habitantes), incluindo um terço no norte do território onde são maioritários.
Os incidentes mais graves registaram-se em 29 de maio, quando a polícia especial kosovar recorreu à força para dispersar os manifestantes sérvios que impediam o acesso dos albaneses aos edifícios municipais, rodeados por soldados da força multinacional da NATO no Kosovo (KFOR).
Cerca de 80 pessoas ficaram feridas nos confrontos entre os manifestantes sérvios kosovares e soldados da KFOR. A polícia kosovar detete três sérvios, incluindo Milenkovic, por suposto envolvimento nestes incidentes.
Belgrado já acusou as autoridades kosovares de terem espancado brutalmente os detidos, e quanto a população local continua a exigir a retirada dos representantes albaneses e da polícia de choque kosovar. A organização de novas eleições nestes territórios já foi admitida por diversos responsáveis albaneses kosovares, após fortes pressões da mediação internacional.
Hoje, Petkovic acusou Kurti de "fazer tudo para criar o caos e provocar conflitos, forçar a população sérvia a uma reação desmesurada" para justificar "a expulsão da população sérvia do Kosovo".
Belgrado nunca reconheceu a secessão unilateral do Kosovo -- a sua antiga província do sul e considerada o berço da sua nacionalidade e religião --proclamada em fevereiro de 2008 na sequência de uma guerra iniciada com uma rebelião armada albanesa em 1997 que provocou 13.000 mortos, na maioria albaneses, e motivou uma intervenção militar da NATO contra a Sérvia em 1999, à revelia da ONU.
Desde então, a região tem registado conflitos esporádicos entre as duas principais comunidades locais, num país com um terço da superfície do Alentejo e cerca de 1,7 milhões de habitantes, na larga maioria (perto de 90%) de etnia albanesa e religião muçulmana.
O Kosovo independente foi reconhecido por cerca de 100 países, incluindo os Estados Unidos, que mantêm forte influência sobre a liderança kosovar, e a maioria dos Estados-membros da UE, à exceção da Espanha, Roménia, Grécia, Eslováquia e Chipre.
A Sérvia continua a considerar o Kosovo como parte integrante do seu território e Belgrado beneficia do apoio da Rússia e da China, que à semelhança de dezenas de outros países (incluindo Índia, Brasil, África do Sul ou Indonésia) também não reconheceram a independência do Kosovo.
Os dois países negoceiam a normalização das relações assente num novo plano da UE, apoiado pelos Estados Unidos, com o seu roteiro acordado por Belgrado e Pristina em março passado, mas que o atual aumento da tensão se arrisca a comprometer em definitivo.