Jornalistas e estudantes de comunicação social da Venezuela tentam combater desinformação
Dezenas de jornalistas e estudantes de comunicação social se reuniram na Universidade Católica Andrés Bello para debater técnicas e mecanismos para combater a desinformação e a situação dos profissionais do setor.
O encontro foi promovido pela delegação da União Europeia na Venezuela, em conjunto com os portais web Efecto Cocuyo y Es Paja, e a Aliança Pró-Jornalismo, daquela universidade.
"No caso venezuelano, trata-se de um processo complexo. A Venezuela está a viver um desmantelamento da indústria dos media e uma fragmentação no exercício do jornalismo. Isto faz que haja comunidades com muito pouca informação", explicou Luz Mely Reyes à Agência Lusa.
Cofundadora do portal e da escola de jornalismo Efecto Cocuyo, explicou ainda que neste contexto "há também o que se chama de indústria da desinformação, com interesses muito claros, onde tanto o governo como alguns grupos interessados são responsáveis pela distribuição de desinformação".
"Não é só o facto de não termos meios de comunicação social suficientes e jornalistas que possam fazer o melhor jornalismo possível (...) estamos a caminhar para um contexto que tem por base as redes sociais, espaços que não têm uma supervisão ou controlo que evite que a desinformação prolifere", frisou.
Luz Mely Reyes alertou que as pessoas "tendem a compartilhar a desinformação, porque se adequa a uma parcialidade" e por isso "o ambiente está bastante afetados pela falta de informação", mas também pelas 'fake news'.
"Um estudo da 'Alianza Pro-Periodismo- identifica várias situações: estamos num contexto de autoritarismo com elementos de censura e autocensura, tem havido perseguições contra jornalistas e compras não transparentes de meios de comunicação social", disse.
Mas, disse, "existe também um sistema autoritário que pune, que condena e acusa os jornalistas e os media de serem inimigos", e "uma crise económica permanente, que tem feito que a indústria esteja praticamente desmantelada".
"Há uma mudança geracional, com o que aconteceu durante a pandemia (da covid-19) que fez que as grandes redações, esses espaços de inteligência coletiva, já não existam na Venezuela", disse.
Segundo esta jornalista, "os autoristarismo utilizam o medo para que as pessoas se inibam, para incentivar a autocensura, não só nos órgãos, mas também nos jornalistas e no cidadão comum".
"Quando estamos à procura de uma fonte (jornalística), por vezes a fonte se inibe porque tem um medo real, porque (sabe que) alguém sofreu algum tipo de perseguição por dizer o que pensa, por dar algum tipo de informação", frisou.
Por outro lado, Ana Carolina Griffin, explicou que a ONG Transparência Venezuela criou, há 3 anos, com o apoio da União Europeia, o portal web de verificação de factos espaja.com.
"O público contacta-nos, pede-nos verificações do circula nas redes e nós, por nossa própria iniciativa, verificamos o discurso público, de representantes do governo, da oposição, de figuras políticas e culturais (...) já fizemos mais de 1.600 verificações e fazemos também investigações em matéria de desinformação", disse.
"É um desafio particularmente importante porque há um governo que restringe a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa (...) porque trabalhamos basicamente com dados abertos, publicados na imprensa, com dados vitais que o Governo publica como o orçamento, boletins epidemiológicos, esse tipo de coisa", disse.
O encontro entre jornalistas e estudantes de comunicação social é, no seu entender, importante, porque permite divulgar fórmulas para combater a desinformação e inclusive apresentar dados sobre a situação da imprensa, "desde dentro".
Por outro lado, explicou que apesar das dificuldades em Caracas, cidade que define como "um oásis" no interior "informar é uma tarefa titânica" porque há localidades que passam até oito dias energia elétrica.
Segundo o secretário-geral do Sindicato de Trabalhadores da Imprensa na Venezuela (SNTP) "há pelo menos 47 portais e mais de 100 domínios web bloqueados na Internet".
"É grave, num país onde os meios de comunicação tradicionais desapareceram na sua maioria e onde a rádio continua a dar a luta, mas com um alcance cada vez mais limitado. Em 2022, documentámos o encerramento de mais de 100 estações de rádio, em processos arbitrários", disse.