Argumentistas de Hollywood dão início a greve por melhores condições
O sindicato que representa 11.500 argumentistas de Hollywood avançou ontem para a primeira greve em 15 anos, depois de falhadas as negociações de contratos com os estúdios que começaram há seis meses.
O contrato vigente expirou às zero horas de ontem e a Writers Guild of America declarou o início da greve, que não tem data para terminar e pode resultar em consequências desastrosas numa indústria que está a passar por um momento difícil.
O sindicato obteve 97,85% de apoio dos membros para a greve e declarou a intenção de "exercer a máxima alavancagem possível", de forma a conseguir um contrato que considera justo, através da cessação completa do trabalho dos seus membros.
Para perceber aquilo que levou os argumentistas à primeira greve em 15 anos, eis algumas perguntas e respostas sobre as suas reivindicações:
Quais os efeitos imediatos da greve?
A suspensão do trabalho dos milhares de argumentistas que trabalham em Hollywood terá efeitos imediatos nas produções, começando pelos programas de variedades no horário noturno, como "Late Night" e "Saturday Night Live".
O impacto vai demorar mais a ser sentido nas séries e filmes, mas se a greve demorar meses isso irá afetar as produções durante o verão e, como tal, provocar o caos nos planos de programação na 'rentrée'.
Os estúdios e empresas de streaming poderão socorrer-se de conteúdos internacionais para colmatar lacunas provocadas pela greve de argumentistas nos Estados Unidos.
Como chegaram as duas partes até aqui?
O Writers Guild of America, que na verdade é a junção do sindicato do Oeste (WGAW) e do sindicato do Leste (WGAE), passou os últimos seis meses a negociar novas condições de trabalho com os estúdios representados pela Alliance of Motion Picture and Television Producers (AMPTP): Netflix, Amazon, Apple, Disney, Warner Bros. Discovery, NBC Universal, Paramount e Sony.
As negociações, que abrangeram argumentistas que trabalham em filmes, séries de televisão, programas de variedades e outros formatos, falharam numa altura em que o sindicato considera que os modelos de negócio do 'streaming' pioraram os salários e as condições de trabalho.
O problema central é a forma como os argumentistas são compensados nesta era da indústria de Hollywood, transformada pelo 'streaming' e pelo cinema em casa. O sindicato diz que não recebem o suficiente e trabalham mais porque as equipas foram reduzidas. Por exemplo, um 'showrunner' numa série de 'streaming' recebe menos de metade de um 'showrunner' num canal de televisão linear e antigas formas de compensação, como pagamentos residuais relativos ao licenciamento internacional de conteúdos, praticamente desapareceram com o 'streaming'.
Quais as exigências do sindicato?
A intenção do WGA é obter "um novo contrato com pagamento justo" que reflita o valor dos contributos dos argumentistas para o sucesso das empresas e inclua proteções "para garantir a sobrevivência da escrita como profissão sustentável".
O sindicato quer um aumento da compensação dos argumentistas e uma nova fórmula para calcular os pagamentos residuais, acusando os estúdios e empresas de 'streaming' de terem criado "uma economia de biscates" dentro de uma força laboral sindicalizada.
O pacote de aumentos pedidos chega perto dos 600 milhões de dólares (546,2 milhões de euros). "O que está em causa é a sobrevivência da nossa profissão", disse o sindicato.
O que oferecem os estúdios em contrapartida?
A AMPTP diz que ofereceu um novo contrato com "aumentos generosos" da compensação para os argumentistas e dos pagamentos residuais relativos ao 'streaming'.
Também disse que estava preparada para melhorar a oferta, mas foi impossível avançar devido à "magnitude das outras propostas em cima da mesa em que o sindicato continua a insistir".
Os estúdios, que estão sob pressão de Wall Street para apresentarem lucros, procederam a múltiplas restruturações e despedimentos nos últimos meses. A Disney eliminou mais de 7.000 empregos, a Netflix reduziu o orçamento e introduziu uma versão com anúncios e a Warner Bros-Discovery está a cortar custos de forma agressiva.
O que aconteceu em greves anteriores?
A última greve aconteceu em 2007 e durou 100 dias, ou pouco mais de três meses, gerando um prejuízo em torno dos 2,1 mil milhões de dólares (1,91 mil milhões de euros).
Milhares de profissionais da indústria perderam o emprego durante essa altura e os efeitos perduraram, com grandes produções afetadas. O filme James Bond "Quantum of Solace" foi uma delas, com o protagonista Daniel Craig a tentar reescrever cenas num argumento esquelético e sem poder contratar escritores.
A greve anterior a essa aconteceu em 1988 e durou 153 dias, ou cerca de cinco meses. As audiências televisivas caíram 4,6% durante esse período e os prejuízos foram estimados em 500 milhões de dólares, valores à época. Essa paralisação também gerou o fenómeno da 'reality TV', com as séries "Cops" na Fox e "Unsolved Mysteries" na NBC a começarem em resultado do que aconteceu.