Israel usa sistema de reconhecimento facial para localizar palestinianos
A Amnistia Internacional (AI) denunciou hoje a utilização por Israel de um sistema experimental de reconhecimento facial, denominado "Red Wolf" ("Lobo Vermelho"), para localizar palestinianos e impor restrições à sua liberdade de circulação.
Segundo a organização não-governamental (ONG), o uso deste sistema visa garantir uma "política de 'apartheid' [regime de segregação]" nos territórios palestinianos ocupados.
Num relatório de 81 páginas, intitulado "'Apartheid' Automatizado: Como o Reconhecimento Facial Fragmenta, Segrega e Controla os Palestinianos" nos territórios ocupados, a ONG de defesa e promoção dos direitos humanos, com sede em Londres, salienta que o "Red Wolf" é apenas uma parte de uma rede de vigilância "crescente" que visa reforçar o controlo de Israel sobre a população palestiniana.
O sistema, segundo a AI, funciona em postos de controlo militares na cidade de Hebron, na Cisjordânia ocupada, bem como em Jerusalém Oriental, onde examina os rostos dos palestinianos e os adiciona, sem consentimento dos visados, a enormes bases de dados de vigilância.
"As autoridades israelitas utilizam instrumentos de vigilância sofisticados para promover a segregação e o 'apartheid' automático contra a população palestiniana", denunciou a secretária-geral da AI, Agnès Callamard.
Este sistema, que começa com uma rede de câmaras de vigilância em circuito fechado, faz, segundo a Amnistia Internacional, "parte de uma tentativa deliberada das autoridades israelitas de criar um ambiente hostil e coercivo para os palestinianos, a fim de minimizar a sua presença em zonas estratégicas".
Na Cisjordânia, segundo a ONG, o "Red Wolf" predomina no setor H2 da cidade de Hebron, que é totalmente controlado por Israel. Aí vivem cerca de 33.000 palestinianos, juntamente com aproximadamente 800 colonos israelitas que residem em pelo menos sete enclaves de colonatos.
A AI recorda que os palestinianos do setor H2 estão sujeitos a restrições de circulação "draconianas", uma vez que não podem aceder a certas estradas e passam os dias de um posto de controlo para outro, o que dificulta a sua vida quotidiana.
Nos termos de um acordo de 1997 entre as autoridades israelitas e a Organização de Libertação da Palestina (OLP), Hebron foi dividida em duas secções, conhecidas como H1 e H2. A H1, que constitui 80% da cidade, é administrada pelas autoridades palestinianas, enquanto Israel mantém o controlo total da H2, que inclui a Cidade Velha.
Em Jerusalém Oriental e, em particular, na Cidade Velha, a AI refere que Israel mantém uma rede de milhares de câmaras de videovigilância, conhecida como 'Mabat 2000', atualizada constantemente desde 2017, "para melhorar as capacidades de reconhecimento facial e alcançar um poder de vigilância sem precedentes".
Em ambos os locais, o procedimento é o mesmo: quando um palestiniano passa por um posto de controlo onde opera a "Red Wolf", a respetiva cara é digitalizada, sem o seu conhecimento ou consentimento, e comparada com entradas biométricas em bases de dados que contêm informações exclusivamente sobre palestinianos.
O sistema utiliza estes dados para determinar se uma pessoa pode passar por um posto de controlo e regista automaticamente os dados biométricos de qualquer novo rosto que seja analisado. Se não houver registo de uma pessoa, é-lhe negada a passagem.
A Amnistia Internacional defende que o sistema pode também recusar a entrada com base noutras informações armazenadas nos perfis dos palestinianos, como, por exemplo, se uma pessoa é procurada para interrogatório ou detenção.
Com o passar do tempo, o "Red Wolf" está a expandir a base de dados de rostos palestinianos.
Numa declaração à ONG israelita Breaking the Silence, um comandante do exército de Israel estacionado em Hebron disse que os soldados estão encarregados de treinar e otimizar o algoritmo de reconhecimento facial para que este comece a reconhecer rostos sem necessidade de intervenção humana.
"A Amnistia Internacional não pode afirmar com toda a certeza quais as empresas que fornecem às autoridades israelitas o 'software' de reconhecimento facial, mas as suas equipas de investigação identificaram os fornecedores de uma série de câmaras que encontraram em Jerusalém Oriental ocupada", referiu a organização.
Os investigadores encontraram câmaras de videovigilância de alta resolução fabricadas pela empresa chinesa Hikvision instaladas em áreas residenciais e montadas em infraestruturas militares. Alguns destes modelos, de acordo com a publicidade comercial da própria Hikvision, podem ser ligados a 'software' externo de reconhecimento facial.
A Amnistia Internacional também identificou câmaras fabricadas pela empresa neerlandesa TKH Security localizadas em espaços públicos e montadas em infraestruturas policiais.
A AI apela às autoridades israelitas para que ponham fim à vigilância "tanto em massa como direcionada" dos palestinianos e que levantem as restrições arbitrárias que impuseram à liberdade de circulação da população palestiniana nos territórios ocupados, "como medidas necessárias para desmantelar o 'apartheid'".