Será verdade que o PS tem “tudo para ganhar” as próximas eleições regionais?
Num artigo de opinião publicado na edição impressa do DIÁRIO, o deputado socialista Carlos Pereira traça um quadro de factores económicos, sociais e políticos absolutamente favorável a uma vitória do PS nas eleições regionais deste ano na Madeira. O título do texto é taxativo: “O PS-Madeira tem tudo para ganhar”. Será que o cenário é assim tão ‘cor-de-rosa’ para o partido que é hoje liderado por Sérgio Gonçalves?
O deputado na Assembleia da República aponta alguns factores favoráveis aos socialistas que podem ser comprovados mas também outros que carecem de sustentação. É verdade que os governos nacionais de António Costa (PS), que tiveram início em Novembro de 2015, têm-se mostrado solidários e generosos com a Madeira, diferenciando-se dos executivos de José Sócrates e Pedro Passos Coelho, que adoptaram uma postura por vezes hostil com o Governo Regional. Carlos Pereira elencou um conjunto de “coisas boas” que “ajuda a mostrar as vantagens dos madeirenses confiarem no PS”: transferências de 1,7 mil milhões de euros em fundos europeus (incluindo PRR) nos próximos anos, financiamento de 160 milhões de euros para pagar metade do valor da construção do novo hospital da Madeira, 200 milhões de euros para a substituição dos cabos submarinos de comunicações, obras nas esquadras de polícia, apoios para lidar com a crise da pandemia (lay-off, moratórias de créditos e vacinas) e apoios para combater a inflação.
Por outro lado, o deputado socialista sublinha que Sérgio Gonçalves foi eleito presidente do PS-Madeira “sem oposição”, com o apoio do anterior líder (Paulo Cafôfo) e que tem gozado de “estabilidade interna”. De facto, as direcções do PS-Madeira lideradas por Emanuel Jardim Fernandes, Mota Torres, João Carlos Gouveia, Victor Freitas, Jacinto Serrão e Carlos Pereira enfrentaram oposição interna e foram frequentemente fustigadas por críticas públicas de militantes e ex-dirigentes, num clima de guerra interna que não favorecia a imagem do PS perante o eleitorado regional. Alguns desses críticos encontram-se hoje em cargos políticos e alinhados com a actual direcção.
Mais difíceis de encontrar são as “condições de contexto económico e social” que, segundo Carlos Pereira, “não favorecem quem governa” a Madeira. Os principais dados estatísticos mostram o cenário inverso. A taxa de desemprego na Região baixou nos primeiros três meses de 2023 para 6,5%, sendo inferior à média nacional, que é de 7,2%. A Madeira tem a terceira taxa mais baixa do país e lidera as quebras mensal e homóloga do desemprego. O turismo, principal actividade económica do arquipélago, continua a apresentar números muito positivos. Se no ano passado a Madeira registou um recorde de turistas, o arranque de 2023 mostra que os indicadores podem voltar a ser superados. No primeiro trimestre deste ano passaram pelos aeroportos da Região um milhão de passageiros, o que representa um aumento de 68 por cento face ao mesmo período de 2022. Há também dados estatísticos negativos, como os relativos à inflação e ao baixo valor das remunerações, mas que reflectem problemas que são sentidos no resto do país. A conjuntura económica e social não será desfavorável a quem governa a Madeira.
A direcção do PS-Madeira terá alguns factores que jogam a seu favor, mas será excessivo concluir que “tem tudo para ganhar” as eleições legistativas regionais.
Como compreender então a avaliação exageradamente positiva das condições que se colocam ao PS na próxima corrida eleitoral? Num exercício de análise política, sempre se notará que Carlos Pereira não está propriamente alinhado com a direcção de Sérgio Gonçalves, nem esteve com a anterior direcção de Paulo Cafôfo. Aliás, o grupo de militantes que se formou em torno do actual secretário de Estado das Comunidades foi determinante para afastar Carlos Pereira da liderança dos socialistas madeirenses em Fevereiro de 2018, numas eleições internas em que teve Emanuel Câmara por adversário. Há um mês, o deputado à Assembleia da República voltou a sentir essa atitude de afastamento, quando Sérgio Gonçalves qualificou como “assuntos de índole pessoal do deputado Carlos Pereira” a polémica relacionada com a reunião secreta para preparar a audição parlamentar da administradora da TAP.
Nas entrelinhas do artigo de opinião de Carlos Pereira também se percebem críticas à estratégia da actual direcção do PS-Madeira, quando fala na inconsequência da “política feita nos corredores dos tribunais”, isto na mesma semana em que Sérgio Gonçalves anunciou que vai enviar para o Ministério Público as conclusões da comissão de inquérito às “obras inventadas” e ao favorecimentos dos grandes grupos empresariais. No que parece ser um comentário irónico, o deputado constata “a forte convicção que parece existir entre as figuras principais da direcção socialista” de que “o que é decisivo e importante para que os madeirenses reparem no projecto político a ser sufragado” nas eleições está patente numa campanha de "cartazes espalhados pela Madeira inteira” com “factos negativos que, por si só, podem levar os eleitores da Região a mudar de voto e confiar no PS-M”.
Em jeito de balanço Carlos Pereira, no seu artigo de opinião, procura colocar sobre os ombros da direcção de Sérgio Gonçalves a responsabilidade por tudo aquilo que vai acontecer nas eleições apontadas para Outubro, tentando evidenciar as boas condições de contexto, para que estas não sirvam de desculpa em caso de eventual desaire nas urnas.
Haverá efectivamente alguns factores que beneficiam a candidatura socialista, mas é muito forçado concluir que agora "o PS-Madeira tem tudo para ganhar”.