O bom, o mau e o morto-vivo
Esquece-se, Dinarte Fernandes, que o rali não é do Funchal, é de todos os madeirenses, incluindo os que vivem em Santana
Em plena Assembleia da República, ficámos a saber que o inspetor-geral de Finanças alterou um parecer que apontava várias falhas, desde duplo financiamento a conflitos de interesses, no controlo dos fundos do PRR. A justificação para a correção foi o interesse nacional, pois, pelos vistos, sem parecer não haveria distribuição de dinheiro. O episódio de patriotismo abnegado, mas profundamente duvidoso, obriga a uma pergunta inquietante. Estaria o interesse nacional em causa quando, a mesma Inspeção Geral de Finanças, analisou o processo de saída de Alexandra Guerreiro da TAP e concluiu que António Costa e Fernando Medina não sabiam de nada?
O bom: Marcelo Rebelo de Sousa
“Quem acredita que com um Presidente da República como Marcelo Rebelo de Sousa uma maioria do PS poderia passar a linha?” Um ano após António Costa ter lançado a pergunta, a linha, para além de ultrapassada, parece nunca ter existido. Apesar da solidariedade institucional que, por vezes, nos fez questionar onde terminaria Belém e onde começaria São Bento, não creio que o Presidente da República tenha saído derrotado do confronto com o primeiro-ministro. Não julgo sequer, ao contrário do que ouvi repetido à exaustão, que Marcelo estivesse forçado a escolher entre a dissolução, a demissão ou a sua extinção. A comunicação ao País, provou que – quando quer – Marcelo é capaz da autoridade serena que se exige a um Chefe de Estado, especialmente quando confrontado com um primeiro-ministro transformado em argumentista político de qualidade duvidosa. Até na promessa de estar mais atento e de ser mais severo, Marcelo, em claro ato de contrição, acertou. E não lhe faltam argumentos para fugir à dissolução. O mar de autopiedade em que mergulharia o PS, o momento de reorganização que ainda se vive no PSD, a possibilidade de crescimento eleitoral do Chega e, porventura mais grave, o encerramento precoce da comissão de inquérito à TAP. Ao Presidente da República cabia tudo dizer e nada fazer. Pelo menos, para já. O calendário de Costa, que já percebeu que quanto mais cedo for a votos melhor, não é o de Marcelo. E é cada vez menos o do País.
O mau: Dinarte Fernandes
Do mais jovem presidente de Câmara da Região, espera-se muita coisa. Arrojo, inovação, ousadia, até algum atrevimento político. O que não se adivinha, nem se compreende, é um gosto pelo pequeno conflito, muito menos a busca constante pela guerra de faca e alguidar. Infelizmente, tem sido assim na Câmara Municipal de Santana. Primeiro, com o cancelamento da Mostra Gastronómica, já com artistas contratados mas com apenas dois restaurantes confirmados. De seguida, a escaramuça sobre o Festival “24 Horas a Bailar” e o desejo presidencial de transformar um evento etnográfico numa festa pimba com discoteca ao ar livre. Até que chegou a vez de brigar com o Rali Vinho Madeira. Uma vez mais, o conflito é trivial, quase corriqueiro. Não se discute a importância do evento para Santana, não se põe em causa a pertinência do apoio municipal ao rali. Para o Presidente da Câmara de Santana, o debate é sobre regulamentos e sobre a urgência do seu cumprimento rigoroso. Nada contra. O problema é que os regulamentos de todos os outros municípios, de variadas cores políticas, permitiram apoiar financeiramente o Rali Vinho da Madeira. Só em Santana é que um regulamento é motivo de birra presidencial e consequente calote municipal. E se não bastasse a borla, disfarçada de lisura financeira, a ânsia pelo conflito do Presidente da Câmara, rapidamente degenera para considerações bafientas sobre como Santana não se ajoelha perante os senhores do Funchal. Esquece-se, Dinarte Fernandes, que o rali não é do Funchal, é de todos os madeirenses, incluindo os que vivem em Santana.
O morto-vivo: João Galamba
Imensas condições. Foram as palavras que João Galamba encontrou para justificar a sua continuidade como Ministro das Infraestruturas. Na verdade, não identificou uma condição ou razão que fosse, muito provavelmente porque sabe da sua escassez. Todavia, as razões que faltam para a permanência de Galamba avultam para a sua saída. O deplorável episódio com um adjunto - escolhido por si - no seu ministério, a chamada do Serviço de Informações de Segurança, como se se tratasse de um serviço de perdidos e achados, a mentira sobre a convocatória de reuniões sobre a TAP, a desconsideração gratuita a outros membros do governo, a classificação de documentos da TAP após o início da comissão de inquérito. Haveria muitas mais. E, ainda assim, Costa segurou-o. Não satisfeito, elevou-o a personagem principal de uma degradante encenação política, montada para mostrar a Marcelo quem é que manda. Tudo, confessou o primeiro-ministro, por uma questão de consciência. Da sua, claro. Certamente não terá sido por ser o melhor para a governação. Quanto ao ministro, num par de dias, passou de demissionário, sacrificado no altar da tranquilidade institucional, a governante morto-vivo que, a cada aparecimento público, atingirá a credibilidade do primeiro-ministro que o ressuscitou. Galamba pode ter sobrevivido à demissão exigida por Marcelo, mas assinou o seu óbito como ministro perante os portugueses.