UE nega que esteja a desviar para a Ucrânia apoio financeiro destinado a África
O diretor-geral das Parcerias Internacionais da União Europeia, Koen Doens, negou hoje que a UE tenha reduzido o apoio financeiro a África porque mobilizou as verbas para ajudar a Ucrânia devido à invasão militar da Rússia.
"Sei que se fala muito que a Europa está a desviar dinheiro para a Ucrânia. Isso não é verdade. Coletivamente, 23 mil milhões de euros em subvenções vão todos os anos da Europa para África, e a Ucrânia não diminuiu em nada esse valor", afirmou, durante um evento em Nairobi organizado pela Fundação Mo Ibrahim.
Doens explicou que "cada vez mais" a UE está a aplicar o financiamento em África em conjunto com bancos "para reduzir o risco dos investimentos".
Um estudo intitulado "Factos e Números" produzido pela Fundação Mo Ibrahim com base em análises próprias e estatísticas de instituições internacionais afirma que "quase todos os fundos desembolsados pelo novo Mecanismo Europeu de Apoio à Paz (MEAP) da UE, que substituiu o anterior Mecanismo de Apoio à Paz em África, foram redirecionados para a compra de armas para a Ucrânia".
"O MEAP atribuiu 3,6 mil milhões de euros a Kiev do total de cinco mil milhões de euros previstos no Quadro Financeiro Multilateral 2021-2027. Em comparação, atribuiu 600 milhões de euros à UA [União Africana] para operações de apoio à paz em 2022-2024", refere.
O mesmo estudo alega que a guerra na Ucrânia resultou também numa "correria da Europa para obter gás [natural] africano para reduzir a dependência da Rússia", com acordos negociados bilateralmente entre países europeus e africanos.
Esta posição, afirmam os autores, representa "uma reviravolta na oposição anteriormente existente ao desenvolvimento de combustíveis fósseis em África".
Doens não esconde o "interesse económico" no continente, de tal forma que tem sido a UE a deslocar-se a África com empresas para encontros em países como Ruanda, Uganda, Zâmbia ou Senegal.
"No último ano, realizámos dez fóruns económicos", revelou, acrescentando que existe uma "mudança de mentalidade, uma mudança de abordagem" e que, só no ano passado, 23 chefes de Estado e de Governo ou primeiros-ministros europeus visitaram África.
De acordo com a Fundação Mo Ibrahim, o potencial económico de África está a atrair interesse não só dos parceiros já estabelecidos, como Estados Unidos, UE, Rússia ou China, mas de outros parceiros como a Turquia, Japão ou países árabes.
Entre novembro de 2021 e dezembro de 2023 realizaram-se nove cimeiras ou reuniões de alto nível em África, estando agendados para breve o 2.º Fórum Económico e Humanitário Rússia-África em julho em São Petersburgo, a Cimeira da Liga Árabe -UA em dezembro em Riade, na Arábia Saudita, e 2.ª Cimeira de Investimento Reino Unido-África em abril de 2024 em Londres.
"O nosso objetivo é absolutamente a parceria. A ideia de que estamos a convocar pessoas para ir a Londres para a nossa conferência de investimento não poderia estar mais longe da verdade", garantiu o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros britânico, responsável pelos assuntos africanos, Andrew Mitchell.
A ideia de "países ricos a dizerem aos países pobres o que fazer acabou há 20, 30 anos", vincou.
Os dois responsáveis falavam num painel intitulado "O Mundo em África: uma concorrência crescente - atores estatais", no âmbito do chamado Fim-de-Semana de Governação Ibrahim (Ibrahim Governance Weekend, IGW na sigla inglesa), que este ano tem como tema "África Global: O lugar de África no mundo de 2023".
Jin-Yong Cai, sócio da consultora Global Infrastructure Partners e membro do conselho de administração da Fundação Mo Ibrahim, negou a "narrativa totalmente falsa" de que a China está a competir por influência devido ao interesse geopolítico no continente.
"A China tem muitas pessoas presentes em África. Existem problemas e não é uma situação perfeita. Mas existe um desejo, na perspetiva da liderança chinesa -- com a qual interajo com bastante frequência -- de tentar ser um parceiro dos EUA, da Europa e de outros países em África", afiançou.