Novo Conselho Regulador da ERC tem de estar capacitado para os desafios
O presidente da Associação Portuguesa de Imprensa defende, em entrevista à Lusa, que o novo Conselho Regulador da ERC tem de estar capacitado para os desafios do setor, onde se inclui a lei europeia da Liberdade dos Media.
"No momento em que se vão implantar" as leis sobre os serviços digitais ('Digital Services Act - DSA') e sobre mercados digitais ('Digital Markets Act - DMA') ou a diretiva 'ePrivacy', entre outros, "é fundamental ter uma entidade reguladora que tenha a capacidade para dizer que há uma fatia disto que é para ser regulado por mim", aponta João Palmeiro.
A ERC deveria ter a capacidade de, no momento da transposição destas diretivas, "ser capaz de dizer: 'isto é comigo'", reforça o presidente da Associação Portuguesa de Imprensa, recordando que esta é uma entidade constitucional.
Até porque "quando a DMA e a DSA forem transpostas para Portugal, por exemplo, é indispensável ir mexer na Lei de Imprensa".
Aliás, "este modelo de Entidade Reguladora enfrenta grandes desafios", diz.
Dos três Conselhos Reguladores "que tivemos até agora, o que podemos dizer é que a forma como foi interpretado o funcionamento, as competências e as obrigações da entidade reguladora nos fazem crer que o modelo de nomeação coloca em risco uma forma proativa, ativa e necessária para que a entidade reguladora possa integrar-se neste modelo europeu que vai existir", refere.
O 'European Media Freedom Act' (EMFA), a lei europeia da Liberdade dos Media que, segundo João Palmeiro, grande parte dos Estados-membros quer ver pronta "no final deste ano ou até às eleições europeias", prevê a criação de um regulador central, pelo que um dos desafios é saber, caso isso avance, como é que a ERC se vai integrar neste modelo europeu.
João Palmeiro defende que não há regulação sem supervisão e que esta tem faltado em Portugal, já que a ERC é "reativa".
Além disso, a Assembleia da República, a quem a ERC tem de prestar contas, trata a atividade de regulação da ERC apenas como "cumprimento administrativo", com a entrega, por parte do regulador, do relatório.
"Ora, como o relatório é entregue muito tempo depois de ter terminado o ano anterior, as questões que são feitas sobre o relatório já não têm nenhum interesse, ou porque já estão tratadas no tempo ou não permitem que sejam tratadas iniciativas legislativas" pela comissão parlamentar que acompanha o tema, "que era aquilo para que o relatório deveria servir", lamenta.
"O Conselho Regulador que for nomeado é um Conselho Regulador que vai ter que lidar" com vários desafios, quer legislativos, quer com os modelos de inteligência artificial (IA) generativos como o ChatGPT, entre outros.
"As pessoas que forem nomeadas para o Conselho Regulador não são mais pessoas que têm que perceber o que se passa em Portugal e qual é o funcionamento das instituições de media em Portugal, são pessoas que têm de estar altamente informadas e conhecedoras do que se está a passar na Europa", defende João Palmeiro.
Relativamente ao 'Media Freedom Act', além do "olhar" que o parlamento tem sobre a matéria na sequência de um "parecer da 12.ª comissão", há a "questão do regulador central", elencou.
No que respeita ao regulador central, "temos duas questões fundamentais: a natureza diversa dos reguladores" -- em Portugal, a ERC consta da Constituição, em França é só um regulador audiovisual e em Espanha e na Alemanha os reguladores fazem parte dos direitos dos governos regionais, só para citar alguns exemplos -- e "as obrigações de transparência" sobre a propriedade das publicações periódicas.
"Aqui há duas tendências europeias: uma que diz que é preciso concentrar, mas para isso é preciso haver transparência", criar condições de concentração, e a outra é que não deve haver concentração e para isso "é ter um sistema de transparência muito claro", refere.
Para Portugal "é um bocado indiferente", porque "o modelo de transparência que temos já é suficientemente avançado para servir qualquer uma interpretação" política, adianta.
João Palmeiro aponta que a ERC deveria ter tido definido quais são os mercados preferenciais no setor, o que "nunca definiu", informação que é importante no âmbito da questão da concentração dos media.
A terceira questão versa "as relações com os jornalistas e como os jornalistas participam na responsabilidade editorial das publicações", que está na Lei da Imprensa de 1975.
A um ano dos 50 anos do 25 de Abril, João Palmeiro diz que em "Portugal as pessoas dão como certa a Liberdade de Imprensa".
E "isso é uma conquista fantástica", sublinha, salientando a dificuldade das pessoas em definir o conceito da mesma.
"É uma definição pura e simplesmente analógica", aquela que dão, a qual não considera nenhum dos elementos fundamentais que o mundo digital trouxe para o exercício daquilo que é fundamental na Liberdade de Imprensa que é a difusão e o acesso", aponta.