AL, o bode expiatório
O Governo da República fez bem em dar incentivos fiscais para os contratos de arrendamento a longo prazo, sendo uma das medidas de incentivo para maior oferta de habitação. É, no meu entender, uma das formas mais justas e eficazes para combater a escassez de imóveis no mercado de arrendamento. O que não pode é sacrificar uma atividade económica, promotora da reabilitação urbana, para resolver um problema de habitação.
A promoção do Direito à Habitação deve ser, primeiro, da responsabilidade do Estado, não dos cidadãos. E o Governo da República está a fazer o seu papel, mesmo que a aceitação das medidas não seja unânime.
Com o congelamento das rendas nos anos 70 e a sua manutenção até aos dias de hoje (estimam-se que 150.000 contratos não estejam abrangidos pelas novas regras do Novo Regime do Arrendamento Urbano), instalou-se um clima de tensão e desconfiança no arrendamento, que justifica também o estado de degradação de muitos edifícios nas cidades, justifica a sensação de injustiça acumulada por parte dos senhorios ao longo dos anos pelo investimento sem rentabilidade e sem possibilidade de uso e demonstra que a política social de habitação nas cidades estava a ser suportada, sobretudo, pelos privados.
Chegámos a um ponto em que são também os inquilinos a sofrer as consequências.
Falta criar mecanismos que deem confiança a quem põe o seu imóvel no mercado de arrendamento e garantias a quem arrenda. Entre outros mecanismos, um deles poderia ser uma plataforma onde se registam senhorios e arrendatários e se constrói um perfil, com a possibilidade de ambos serem avaliados. Quem cumprisse bem o seu “papel” seria beneficiado. Uns com benefícios fiscais e outros com possibilidade de apoios ao pagamento da renda.
Quando finalmente, se abre a possibilidade de reaver e rentabilizar os imóveis através de outra forma de arrendamento, através do Alojamento Local, eis que o AL se torna o bode expiatório da falta de habitação. Então, têm de ser novamente os privados a suportar a crise de habitação?
Atacar o AL é atingir proprietários e pequenos investidores, que tentam e tentaram rentabilizar os seus imóveis e que, muitos deles, durante décadas, estiveram a custear a habitação social, com rendas vergonhosas. Por consequência, os imóveis foram se degradando. Que incentivo tinham para manter os seus imóveis em bom estado? Algum privado vai investir para fazer política social?
Custa-me aceitar que se ponha em causa uma atividade que deu autonomia a tantos portugueses, que lhes deu receita extra para complementar os baixos salários, que permitiu a tantas pessoas serem pequenos empresários e criarem empregos, que democratizou, de certa forma, o acesso dos cidadãos a atividade geradora de riqueza e de autonomia.