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O que é o preço justo? (Aumento da cana de açúcar)

Uma pergunta frequente que fica quase sempre sem resposta. Ouve-se e lê-se muitas vezes que esta ou aquela atividade é deficitária e a única solução que aparece, é pedir aumentos baseados nas lamúrias de quem exerce essa atividade.

Recordo-me que depois do 25 de Abril de 1974, talvez em Fevereiro ou Março de 1975, o Diário de Notícias publicou na primeira página um trabalho meu sobre o cultivo da Cana do Açúcar na Madeira e que originou um aumento daquele produto à lavoura n ordem de mais de 90%. A cana do açúcar era paga ao produtor a 55 centavos (estávamos ainda no tempo os escudos). E pedi um aumento para um escudo e vinte centavos. Várias agricultores produtores de cana de açúcar decidiram ocupar o Engenho do Hinton e ao mesmo tempo admitiam não entregar cana aos diferentes engenhos Da Ilha. Umas horas mais tarde foi ocupada a delegação da AGAA (Administração geral do Álcool e do Açúcar) que funcionava no mesmo edifício do Instituto do Vinho Madeira e que era a responsável pela fixação dos preços a pagar à lavoura da cana sacarina.

No dia seguinte recebi um telefonema de alguém que se dizia Engenheiro da Secretaria de Estado do Comércio dizendo que queria se encontrar comigo, para falarmos sobre a publicação do DN. Com efeito encontramo-nos e conversamos sobre as minhas contas, que curiosamente coincidiam com os resultados de um trabalho que tinham encomendado na Inglaterra, que eu desconhecia e, que, por caminhos diferentes diferiam apenas um centavo no custo de produção de 1 kg de cana sacarina, tendo como diferença o facto do estudo inglês ter custado uma pequena fortuna e o meu ter sido de borla….

Seguidamente acompanhei o referido técnico até ao engenho do Hinton onde estavam os produtores de cana para que tivesse uma reunião com eles para decidirem o preço a pagar nessa campanha. Prometeu-me que iria fazer o possível para se aproximar dos valores que eu sugeria. No preço de custo tinha incluído, além de todas as despesas e receitas (chama-se conta de cultura), o seguro da mão de obra, a Segurança Social, juros do empate de capital, etc… e uma margem de lucro da ordem dos 30% para o agricultor. As negociações chegaram ao escudo, ou seja menos apenas 20 centavos do que eu tinha pedido, representando um aumento de 45 centavos.

Penso que esta é a maneira correta de chegar a qualquer aumento. Este ano prometeram pagar 36 cêntimos que é visivelmente insuficiente. No meu livro que publiquei há quase dois anos, pedia um aumento de sete cêntimos, sem contar com os aumentos que entretanto se verificaram nos fatores de produção. A “canica” do Porto da Cruz que dá origem uma um Rhum mais aromático, deveria aumentar muito mais, porque a produção da cana é muito menor por hectare.

Sabe-se que para produzir 1 litro de Rhum Agrícola são necessários cerca de 8 kgs de cana, dependendo do grau provável, que neste caso se designa por grau Brigs. Assim, por exemplo se aumentarmos para 50 cêntimos cada kg de cana significa que cada litro de aguardente passará a custar (sem contar com outros custos que se mantêm constantes, como as despesas de destilação e de embalagem) quatro euros com um aumento de doze cêntimos (36 cêntimos X 8 = 2,88). Considerando que grande parte do consumo do chamado Rhum Agrícola é na poncha e se 1 litro dá para 20 ponchas, teremos um aumento inferior a 1 cêntimo por cada poncha, ou seja sem qualquer aumento significativo no produto final.

Se existir essa tal conta de cultura a que nos referimos, bastará atualizar os seus números todos os anos para sabermos o custo de produção e o respetivo aumento anual.

A cultura da cana do açúcar tem uma particularidade que é de atingir o máximo de produção no seu 2.º ano e de ir diminuindo sempre, chegando à altura que é mais rentável estar um ano com muito pouca produção do que ir aumentando anualmente o prejuízos. Por isso a conta de cultura deve ser feita numa base de oito anos no máximo. Note-se que em África, por exemplo renovam a cultura cada 4/5 anos. Por outro lado a qualidade vai diminuindo de ano para ano. É necessário fazer calagens estrumações e adubações químicas com alguma frequência. Os produtores de Rhum Agrícola, leu-se um dia destes nos jornais, querem mais e melhor qualidade, mas não querem pagar melhor, duas coisas antagónicas. Daqui a algum tempo vão querer cana do açúcar para a sua Indústria e não vão ter e de nada vale dizer que é a cana mais cara do mundo, porque os agricultores não podem continuar a produzir e perder dinheiro. Da maneira que as coisas estão, daqui a “dias” nada é rentável na Madeira e se os industriais do sector não tomarem a iniciativa de um aumento capaz e que compense todo o esforço que é necessário fazer para continuar a produção deste secular produto da nossa Região.

Grande parte deste raciocínio adapta-se a outras culturas como a Bananeira, a vinha, a Semilha, a Cenoura, a Cebola, etc…).