Caixa Negra
Tem sido uma autêntica festa dos compadres num desfile de saloios recauchutados
“Zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades”. Ora nem mais! Christine Ourmières-Widener, depois de ter sido despedida da TAP, foi, em audição na Assembleia da República, absolutamente arrasadora, confirmando o que se suspeitava: o invocado interesse estratégico da TAP sempre se resumiu a um conjunto leviano de manobras sujas de poder pagas pelos contribuintes portugueses. Christine Ourmières-Widener mostrou o lado mais negro dum filme no qual foi uma das principais protagonistas. Não nos podemos esquecer que também alimentou a promiscuidade que agora denuncia. Foi, por exemplo, ela que decidiu questionar o Governo socialista sobre um “pedido especial” para alterar um voo do Presidente da República que precisava “ficar mais dois dias em Maputo”, uma alteração que afetaria “mais de 200 pessoas”. A CEO da TAP questionou o Secretário de Estado das Infraestruturas com a indicação de que a sua “reação espontânea” seria “dizer não”. Terá recebido a seguinte resposta de Hugo Mendes: “A minha reação espontânea é dizer sim. A sério, entendo que isto possa ser um incómodo para si, mas não podemos perder o apoio político do Presidente da República. Ele tem-nos apoiado em relação à TAP, mas se o humor dele mudar, tudo está perdido. Basta uma frase dele contra a TAP/Governo e coloca o resto do país contra nós. Não estou a exagerar. Ele é o nosso principal aliado político, mas pode transformar-se no nosso pior pesadelo”.
Christine Ourmières-Widener revelou, também, agora, uma reunião secreta, “recomendada” pelo Ministério das Infraestruturas de João Galamba, ocorrida em 17 de janeiro deste ano, entre assessores do Governo, deputados socialistas e a Presidente executiva da TAP, na qual “alegadamente prepararam juntos perguntas e respostas” em véspera da audição parlamentar sobre a saída de Alexandra Reis da companhia aérea. Um dos deputados que integrava essa Comissão de Inquérito referiu que se tratou de uma “partilha de informação absolutamente normal”. Tão normal como a sua posterior saída dessa Comissão. E não se diga que o problema foi Christine Ourmières-Widener ter revelado essa reunião. Não é uma questão de “on” ou “off”. É a atitude de fundo que é censurável e repugnante.
Na aviação temos a “caixa negra” com registos que ajudam a explicar os desastres. E continuam a ser encontradas na TAP “caixas negras” que mostram o pior do Governo e de alguns “políticos” que sempre puseram os seus interesses pessoais e a estratégia de poder socialista à frente de tudo aquilo que a companhia devia representar para o país. Tem sido uma autêntica festa dos compadres num desfile de saloios recauchutados. A política assim é lixo. E, se o Presidente da República continuar a fingir que nada está a acontecer, poderá então estar a aceitar a permeabilidade referida pelo Secretário de Estado das Infraestruturas na resposta à CEO da TAP ao “pedido especial”.