Crónicas

Quando é que a máscara vai cair?

Por trás de todas as máscaras há uma autoestima que pede para ser nutrida

São nove, as Máscaras da Masculinidade – segundo Lewis Howes, que as descreve na sua obra ‘The Mask of Masculinity: How Men Can Embrace Vulnerability, Create Strong Relationships, and Live Their Fullest Lives’. São tão densas que, num determinado momento, o homem transforma-as em identidade. Máscaras que quando colocadas oferecem a falsa sensção de segurança e impedem a criação de relações saudáveis, honestas. Até porque, condiciona o homem a viver uma vida de faz de conta, perante os amigos, a/o companheira/o, filhos... E é por isso que vemos tantos homens “bem-sucedidos” a sentirem-se insuficientes.

Quanto mais densas foram as máscaras, menos vontade terá de ler esta crónica ou vai ler e procurar contrariar o conteúdo, defendo as máscaras instaladas. Se acontecer, está tudo bem. Dê as boas vindas a esses ‘demónios’, como se de hóspedes se tratassem. Eles trazem uma mensagem importante sobre algo que ainda quer ser visto, integrado e transcendido.

O convite de hoje é estimular mais mulheres a observarem que máscaras estão a nutrir nos homens que educam e que as rodeiam e para os homens, o convite é o de olharem para estas máscaras e perguntarem:

- “Até que ponto estas máscaras estão instaladas em mim, ou até que ponto recorro às mesmas para evitar mostrar quem realmente sou?

- “Até que ponto é que estas máscaras me impedem de ter relações autênticas?”

- “Até que ponto utilizo estas máscaras para satisfazer as expetativas dos outros?”

Esta é ainda uma conversa difícil e será tão mais bem-sucedida quanto mais formos capazes de construir pontes para o diálogo ao invés de erguer muros.

1 - Estóica – É a mais comum na sociedade, é uma armadura. Acontece quando o homem se desconecta das suas emoções, ao ponto de poder ter dificuldade em aceder às próprias emoções. Começa a acontecer quando os meninos aprendem: “Não sejas mariquinhas”, “homens não choram”... Acabam por exteriorizar as emoções apenas em contexto de jogos, de futebol, por exemplo, ou recorrer ao álcool, à dependência do jogo e outras.

2 - Atleta – A que convida a olhar para a identidade de homem quando exterioriza as capacidades atléticas. Tem por base a crença de que “sou homem, por isso aguento, sofro com dor, lesionado”... Aprendem a anestesiar a dor e a não pedir ajuda. Impede de mostrar vulnerabilidade.

3 - Material – Quando o homem mede o seu valor através da ostentação dos bens materiais que possui. Do dinheiro que tem, dos carros, das roupas, dos ‘social media’... Está muito ligada ao mascarar a autoestima.

4 - Sexual – Quando o homem procura provar o seu valor através das conquistas sexuais. Quanto mais atraente for, mais homem se sente. Atrair, seduzir, conquistar... uma máscara que coloca os homens em territórios perigosos e que os impede de ter paz interior, porque precisa, permanentemente, de ter a confirmação externa de que é desejado.

5 - Agressividade – A máscara que diz que “homem que é homem, luta, grita, defende e ataca”. Um adulto pode ficar incomodado porque o filho não luta. Um menino, um jovem é desculpado se for violento por ser do sexo masculino.

6 - Joker – O brincalhão. “Homem que é homem ri-se dos problemas e usa as piadas como forma de se mostrar duro”. É uma defesa muito forte e impede de construir relações autênticas. Muitas vezes é utilizada para ocultar a vulnerabilidade que as situações podem acordar.

7 - Invencibilidade – Quando o homem acredita que não tem medo de nada, que não fica para trás, que é corajoso ao ponto de não ter medo. Crescem a ouvir: “Sê homem, enfrenta isso como um homem, sem medos.” É uma máscara que o impede de lidar com o medo, que é afinal, um estado natural e protetor.

8 - Eu sei tudo – Uma máscara muito utilizada em discussões. Leva os homens a entrar no ‘mansplaining’ – comentar ou explicar algo a uma mulher de uma maneira condescendente, excessivamente confiante, e, muitas vezes, imprecisa ou de forma simplista. Foi educado a acreditar que a opinião dele é a única que conta ou, pelo menos, é a mais importante entre todas as opiniões.

9 - Alpha – Convida o homem a assumir-se como líder, como dominador. “Homem que é homem” tem que dominar, no ringue, no trabalho...

Não, a culpa não é dos homens!

Podemos todos quebrar o ciclo de propagação destas máscaras, através da forma como nos relacionamos com os meninos. A forma como comunicamos com os nossos filhos, programa-os para as máscaras. Todos os pormenores contam nesta equação.

Masculinidade Tóxica

De acordo com autores, especialistas na área, pode ser definida como os comportamentos condicionados que emergem da necessidade de ser agressivo, competitivo e dominar os demais. Abrange os comportamentos mais problemáticos dos homens.

Não é o ser homem em si que é tóxico, são antes, determinados comportamentos que alguns homens podem adotar em resultado da forma como são educados, do ambiente no qual crescem. Esta masculinidade dominante pode, de facto, ser destrutiva, não apenas para as mulheres, perpetuando as desigualdades, a violência e a opressão; também o é para muitos homens, aprisionando-os num modelo que os desconecta da sua essência, que os isola e causa dor física e emocional, limitando o seu pleno desenvolvimento. Um modelo que não permite ao homem ser quem é e deseja, mas sim apenas o que se espera que seja. Ou seja, é tóxica para todos.

E toda esta toxicidade está inscrita no nosso ADN emocional, como nos demonstra a psicologia transgeracional. Por exemplo, a realidade do homem preto integra mais de 300 anos de escravidão, o que tem impacto até hoje. Estes homens enfrentam a realidade perversa da violência policial e da desigualdade social como um todo. Além disso, sentem uma pressão para corresponder a um ideal masculino ainda mais forte do que os homens brancos.

Os homens, vítimas da masculinidade tóxica, acabam por passar por uma dissonância cognitiva. Por um lado, sentem-se mal com a pessoa que são, por outro vão ao encontro do que esperam de si e isso impede-os de explorar porque é que se sentem mal.

A masculinidade tóxica é inconsciente e é preciso lembrar que o inconsciente tende a interpretar a informação generalista como sendo sobre si próprio, que usa a presença de emoções como indicador da importância das coisas para cada um, que tende a interpretar tudo literalmente (daí a importância das metáforas), que protege e implementa o sistema de valores e crenças de cada pessoa, interpreta aquilo que se observa de acordo com as experiências passadas. Um último lembrete, o consciente é a parte do inconsciente que está a prestar atenção agora.