É verdade que a "Ilha da Madeira nunca foi tão segura como agora"?
A 24 de Janeiro de 2023, o presidente do Governo Regional da Madeira relativizou a criminalidade, ou a sensação que os cidadãos têm da falta de segurança no seu dia-a-dia, mantendo nessa altura a "convicção de que não há insegurança na Madeira, nem sequer no Funchal", escrevíamos. Ora, o recente Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), referente a 2022, vem desmentir o governante, embora Miguel Albuquerque se escudasse no "crescente número de sem-abrigo e de casos relacionados com o 'bloom' que dão a falsa sensação de insegurança". Recuamos aos dados do RASI mais antigos disponíveis (1998) e esclarecemos esta dúvida.
Mas antes disso, situemos as declarações de Albuquerque, que referiu que a "sensação de insegurança ou de desconforto não se pode confundir com insegurança ou com o aumento da criminalidade", escrevíamos na edição em papel, por ocasião das declarações proferidas na cerimónia de entrega de novo equipamento informático à PSP.
Albuquerque insistia que "os índices de criminalidade na Madeira são diminutos" ou mesmo "residuais", para relativizar o sentimento de insegurança que muitos 'apregoam', salientamos, embora considerasse "que tal realidade não configura 'violência, furtos e roubos', estas sim, práticas que configuram insegurança".
A manchete de hoje do DIÁRIO revela que a Criminalidade violenta e grave cresceu mais na Madeira, sendo que "a Região registou, em 2022, a maior subida do país e o número mais elevado de casos dos últimos 11 anos. PSP fez mais de 1.300 detenções, um aumento de 95%", acrescentamos.
Ainda esta semana, o partido Chega voltava ao tema, recordando que "o Relatório Anual de Segurança Interna revela que, na Região Autónoma da Madeira, a criminalidade aumentou mais de 22%, em relação a 2021, o que se reflete num aumento de 1.247 participações. Mais preocupante, ainda, é o facto da nossa Região liderar o país em termos de criminalidade violenta e grave, parâmetro no qual a Madeira registou um acréscimo de 52%, estando também à frente de outras regiões do país, como Lisboa, Porto ou Faro", apontava Miguel Castro, líder regional daquele partido.
"Talvez seja para quem anda com segurança, motorista e passa a vida nos corredores do poder. Para o cidadão comum, a realidade é bem diferente e faria muito bem ao governo andar nas ruas, ouvir as pessoas e perceber as questões que eles enfrentam no seu dia a dia, também em matérias de segurança", referiu ainda o dirigente partidário, que acrescentou: "O presidente do Governo diz que gosta de falar em dados objectivos. Ora bem, eles aí estão. E o que os dados objectivos apontam é que a Madeira é a região do país onde a criminalidade mais sobe e onde a criminalidade violenta mais cresce. Há maior demonstração da inépcia do governo do que esta?"
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Voltando ao RASI 2022, na sequência da visita do ministro da Administração Interna à Madeira, José Luís Carneiro explicava que o documento visa o "diagnóstico de circunstâncias de vida, onde se verificam em determinados territórios indicadores que carecem de uma intervenção multidisciplinar, para procurar dar resposta muito particularmente aos mais jovens, que por razões diversas acabam por se ver enredados em circunstâncias de vida que os conduz à delinquência e posteriormente à criminalidade".
Prometeu "o reforço do número de agentes da Polícia de Segurança Pública na Região, lembrando que a República já o fez em 2022 'com o reforço de mais 30 elementos da PSP e mais 20 da GNR'", escrevíamos neste artigo. Isto na sequência da reivindicação que o presidente da Câmara Municipal do Funchal vem fazendo há largos meses para o reforço do patrulhamento da cidade, tendo Pedro Calado aproveitado a visita oficial de José Luís Carneiro à Região para expor a necessidade de combater os novos focos de criminalidade com a actuação policial.
Assim, perante estes pressupostos, recuamos atrás no tempo para perceber até que ponto as palavras do presidente do Governo Regional não condizem com a realidade ou há algum exagero da sociedade geral. Os números já referidos no DIÁRIO de hoje respondem, em parte a essa pergunta. Ou seja, é verdade que a criminalidade violenta e grave sofreu um incremento significativo na última década, mais precisamente desde 2011, mas também é verdade que estes números já foram maiores, sendo certo que a criminalidade geral, de onde se extrai as situações mais violentas e graves, também era maior.
Recuámos a 1998, ou seja há 25 anos e comparamos os números da criminalidade geral na Região Autónoma da Madeira e os da criminalidade violenta e grave nesse período.
Os números, expressos nestas imagens, mostram que, efectivamente já houve anos com muito maior criminalidade participada e, igualmente, maior criminalidade violenta e grave do que em 2022. Contudo, o aumento registado no ano passado, sobretudo por se atingir números que estavam bem abaixo de 2022, revelam que, de certa forma, o presidente do Governo tem razão em relativizar, porque o passado assim o prova, já houve anos bem piores. Contudo, relativizar o problema, culpando os sem-abrigo e os casos de 'nova' toxicodependência, pode não ser a melhor forma de encarar um problema social como este.