A Madeira tem a cana-de-açúcar “mais cara do mundo”?
Decorre esta semana a 5.ª edição do Festival do Rum da Madeira na Placa Central da Avenida Arriaga. Na abertura do evento, o DIÁRIO ouviu alguns dos produtores, entre os quais Mário Gomes, que afirmou que a Madeira paga a Cana-de-Açúcar “mais cara do mundo”.
O preço pago pelos engenhos da Madeira por cada quilograma de cana-de-açúcar é tido como insuficiente para muitos agricultores da Região, que justificam a posição com a subida dos custos de produção, bem como com a elevada carga de trabalho.
O DIÁRIO aproveitou a abertura da 5.ª edição do Festival do Rum da Madeira para aferir, junto dos produtores da bebida, o actual estado do sector. A diminuição da produção e da qualidade da cana-de-açúcar na Região foi um ponto assente. Entre as propostas para salvar a cultura, esteve o aumento do preço pago ao agricultor.
Apesar de reconhecer que a cana-de-açúcar é de um cultivo “muito difícil”, Mário Gomes, do Engenho Novo da Madeira, alerta que é necessária cautela quanto às exigências feitas.
“Há uma série de circunstâncias que fazem com que o preço pago pela cana-de-açúcar não seja suficiente para o agricultor, mas é necessário colocar esse valor em perspectiva”, aponta.
Em declarações ao DIÁRIO, o empresário afirmou que a Madeira tem a cana-de-açúcar “mais cara do mundo”. Será mesmo?
Se recuarmos até ao ano de 2000, a cana-de-açúcar comprada aos agricultores pelos engenhos custava 0,135 euros por quilograma na Madeira. O valor foi aumentando ao longo dos tempos e desde 2015 o preço por quilo pela cana descarregada nos engenhos passou de 28 para 36 cêntimos, um aumento considerável, mas que para alguns agricultores ainda sabe a pouco.
Do ponto de vista do agricultor nunca vai ser suficiente. É muito difícil o cultivo da cana, é tudo feito à mão, os declives dos terrenos não facilitam, existe a impossibilidade de pôr maquinaria... Há uma série de circunstâncias que fazem com que o preço pago pela cana-de-açúcar não seja suficiente para o agricultor, mas é necessário colocar esse valor em perspectiva. Mário Gomes, Engenho Novo da Madeira
Segundo o responsável, o preço pago por cada quilo de cana na Madeira é o mais elevado “do mundo”.
No panorama mundial, já pagamos a cana mais cara do mundo. Cerca de quatro vezes o valor que se paga na Martinica, que produz um rum agrícola, tal como o nosso. No Brasil compram a cana 10 ou 15 vezes mais barata. Mário Gomes, Engenho Novo da Madeira
Na Madeira, o valor pago pela cana-de-açúcar é proveniente dos privados e do público. O Governo Regional financia, através de fundos comunitários, nomeadamente do POSEI, 0,21 euros por cada quilo de cana descarregada. Os restantes 15 cêntimos são assumidos pelos engenhos, que dada à diminuta oferta têm subido o preço para até 0,39 cêntimos.
O DIÁRIO apurou, junto de entidades oficiais do Brasil e da Índia, o valor pago pela cana. Os dois países são os maiores produtores de cana-de-açúcar do mundo. Do total de 1.889.268.880 toneladas de cana-de-açúcar produzidas por ano no globo, 768.678.382 toneladas são provenientes do Brasil e 348.448.000 toneladas da Índia.
A Companhia Nacional de Abastecimento do Brasil revela que os produtores de cana-de-açúcar são remunerados pelo teor de ATR – Açúcar Total Recuperável, que a matéria-prima apresenta ao chegar aos engenhos.
De acordo com os dados divulgados pelo CONSECANA-SP, em Fevereiro de 2023, o preço do ATR situou-se nos 1,17 reais o quilograma, o que equivale a 22 cêntimos.
O Governo Central da Índia define anualmente o preço mínimo, denominado ‘justo e remunerado’, que os engenhos devem pagar aos produtores de cana-de-açúcar. O preço definido para a safra de 2022 e 2023 foi de 305 rúpias (3,38 euros) por cada 100 quilogramas de cana, o que se traduz em 0,03 euros/Kg.
A introdução da cana sacarina na Madeira deu-se no início da colonização da ilha, por volta de 1425. Nos cerca de 30 anos seguintes a expansão da cultura na ilha foi tanta que a Madeira chegou a ser a maior produtora europeia de açúcar.
Conheça a história, o cultivo, a colheita e a distribuição das plantações de cana-de-açúcar na Madeira:
