A nossa Madeira, o meu PS
É certo que nem tudo vai mal na Madeira, mas escusam de nos dizer que está tudo bem
A nossa Madeira vive um momento atípico: fustigada pelas consequências da pandemia, da guerra na Europa e de quase cinco décadas de governação pela direita, antecedidas de outras tantas de ditadura de extrema-direita e abandono centralista, continua a acentuar-se o fosso entre ricos e pobres, entre quem nada tem e quem tem demasiado. São sucessivas gerações fustigadas pelas mesmas dificuldades, que agora se agravam em áreas fundamentais da nossa vida em sociedade.
Na Habitação, ao mesmo tempo em que se multiplicam construções para o mercado de luxo, há uma geração totalmente incapaz de, com os seus baixíssimos rendimentos, aceder a qualquer tipo de habitação, seja no praticamente inexistente mercado de arrendamento, seja no hiperinflacionado mercado de aquisição. Na Saúde, enquanto quem nada tem desespera em macas nos corredores das Urgências ou é vítima do abandono que multiplica os casos sociais, o mercado privado, a que só acede quem pode pagar, floresce como nunca. Na Economia, enquanto governantes se entretêm em visitas de cortesia para distribuição de verbas milionárias, os salários não só estancam como, porque expostos à inflação, diminuem abruptamente.
Quando mais competia aos poderes públicos enfrentar essa realidade e criar equilíbrios, aquilo a que continuamos a assistir não pode deixar de surpreender. Na Saúde, continuam a surpreender as opções que condenam o Norte da Região a viver com Serviços de Urgência encerrados, sem um único meio de Emergência Médica descentralizado, à semelhança do que se optou, e bem, por colocar no Porto Santo. Surpreende a possibilidade de futuramente vender-se o actual Hospital, numa Região com tantas dificuldades em responder, por exemplo, às necessidades de procura crescentes em lares, ou Cuidados Continuados. Na Economia, surpreende o discurso contraditório de empresários contra os subsídios entregues a quem mais precisa, ditados em cerimónias em que recebem os seus. Surpreende que o Governo Regional esteja transformado numa máquina de distribuir dinheiro, com visitas diárias a tudo o que mexe, sem que ninguém diga que o dinheiro vem da Europa e com fim destinado. Na Habitação, surpreende o tom das críticas às medidas nacionais, sem que se questione o porquê de não existirem medidas regionais. Surpreende que a única política de habitação pública resulte, mais uma vez, da aplicação de fundos europeus e que não se dê uso à Autonomia para fazer mais e melhor.
É certo que nem tudo vai mal na Madeira, mas escusam de nos dizer que está tudo bem. É entre o que corre muito bem para uns e o que corre muito mal para outros que cresce o fosso que condena diferentes gerações à pobreza, ou ao risco de pobreza, ou à precariedade, ou à emigração. Só políticas públicas eficazes serão capazes de estancar essa realidade. Surpreende também por isso que ao fim de quase 50 anos de governação continue a existir tanta dificuldade na oposição para afirmar-se como alternativa. É nela que deve concentrar-se o meu PS. Porque há alternativa e é preciso torná-la clara. Há alternativa na Saúde, porque abrir em vez de fechar urgências é uma opção. Investir em produção adicional no serviço público, que garanta consultas e cirurgias dentro de tempos máximos de resposta garantidos, é uma opção. Há alternativa na Habitação, porque investir mais no parque público e em programas regionais de apoio ao arrendamento é uma opção. Há alternativa na Economia, porque pagar mais a quem se qualificou mais é uma opção. Há alternativa na Educação, porque alargar a gratuitidade do Ensino é uma opção.
Em 2019, o meu PS lutou para ganhar eleições e retirou, pela primeira vez, a maioria absoluta ao PSD - mas, apesar disso, o meu PS não se satisfez com os 19 deputados que elegeu, porque o que queria mesmo era governar para mudar a Madeira. E não se satisfez de tal forma que houve quem tivesse sentido a necessidade de mudar quase tudo o que tantos frutos deu para iniciar um ciclo novo. Quatro anos depois, não se compreenderá que o PS abdique de ir a eleições para ganhar e que se satisfaça com aritméticas que apenas traduzem a condenação da Madeira a andar para trás. Evitá-lo implicará capacidade de envolver e de multiplicar com maior eficácia, proximidade e combatividade uma mensagem simples: é que a Madeira tem mesmo alternativa - mas para além de precisar dela, primeiro precisa de acreditar nela. Na nossa Madeira, no nosso PS.