Crónicas

As inesquecíveis sextas roxas

Descrevi no principio de Dezembro, neste mesmo espaço, o que me transmitiu na altura uma ida, na óptica do cliente às já famosas festas “Purple Friday´s”, organizadas em parceria pelos Nómadas Digitais e pela Estalagem da Ponta do Sol e que se realizam nesse mesmo local. O que mais me seduziu, foi mesmo a forma como o público, bastante transversal e oriundo de muitas e diferentes nacionalidades, se mesclava em torno de uma vontade comum. Essa vontade não era mais nem menos do que a da pura diversão, de serem felizes, viverem momentos singulares, aproveitarem uma vista magnífica e um local de sonho para em conjunto, promoverem encontros entre gente que sabe ao mesmo tempo apreciar boa música e “deslizar” de forma leve sobre a pista. O que eu senti nesse momento foi que estava a presenciar algo único, primeiro porque é de um arrojo tremendo mas digno de aplausos, realizar no nosso país uma festa em que a música começa às 20:30 e termina às 23:30 ( hora a que normalmente abrem as discotecas ), depois porque sentia-se a energia entre as pessoas, uma forma de estar muito própria que provavelmente só se consegue porque a grande maioria dos convidados eram expatriados.

Passados sensivelmente 3 meses, quis o destino que regressasse a este mesmo local que me transmitiu tão boas sensações, agora como dj convidado, um dos grandes hobbies da minha vida, muito por culpa da minha paixão pela música. Foi por isso com natural expectativa e uma boa dose de adrenalina que vim à Madeira com um grupo de amigos, para passar um fim de semana de exploração dos sentidos e com a vontade de sentir aquilo que não consigo sequer explicar. A simbiose entre quem passa música e quem a ouve, entre o que são os meus gostos e as minhas escolhas e os gostos dos outros e a magia que se cria entre gente que quer exatamente o mesmo e que se dá ao direito de ser livre através do som. Estava de facto muito expectante para perceber que sensação tão especial era essa que me tinha, uns meses antes ter desejado este preciso momento e de facto não defraudou as expectativas.

Passei nos meus tempos de juventude por muitas cabines, toquei em vários países, para milhares de pessoas ou festas mais exclusivas, em barcos, discotecas ou eventos. Posso por isso hoje dizer que aquilo que se vive e se sente durante aquelas 3 horas não se encontra em qualquer lado. Diria que foi sem qualquer tipo de dúvida um dos 3 melhores sítios onde toquei. O quadro perfeito entre a paisagem arrebatadora, a qualidade do sistema de som e um espetáculo de luz, cor e imagem fantásticos. Mal se inicia a viagem, não demora tempo até que as primeiras batidas de som façam pulsar os convidados. Ainda com pouca gente e já os olhares se cruzam e se percebe que quem veio, veio para dançar. A pista não demora a encher e rapidamente a estrutura montada a meio da sala é rodeada de gente animada. Por ali não há cabines, não há separações ou barreiras e por isso sem darmos por ela temos pessoas à frente, ao lado e atrás. Dá para sentir o respirar e somos facilmente conduzidos para um set que vai ao sabor do que nos é transmitido pelas caras e pelos movimentos. Ali a estrela é mesmo o público, são eles que tornam cada música um acto único com vida própria e uma história para contar.

À medida que o tempo vai passando o espaço vai-se tornando pequeno para tanta energia e o som vai aumentando ao sabor dos ritmos mais rápidos até terminar em êxtase com braços no ar e muitos sorrisos estampados nos rostos. Termino a pensar que ficava ali para sempre mas que é muito bom conseguir uma festa assim a horários decentes. São 23:35 e parecem 06h. Mas não são e essa é uma característica que pode ser explorada por outros. Uma coisa eu garanto, para quem não foi e gosta de música eletrónica sem estar a olhar para os outros ou com grandes conversas, vá. Ali respira-se paixão pela música e respeito pela produção. Desde os empregados simpáticos aos agradecimentos de pessoas visivelmente felizes. As dúvidas foram dissipadas, estamos perante um acontecimento que seria bom em qualquer parte do mundo e isso só nos deve orgulhar a todos. Parabéns a quem teve a capacidade de pensar tudo isto, à Estalagem pela organização fantástica e aos que semana após semana dão corpo a uma das melhores festas de que tenho memória. Obrigado pelo convite e obrigado aos que me acompanharam.