Será que a idade é mesmo um número?
Quem é que não gosta que lhe digam que está bem e parece mais nova?
Tenho ouvido, cada vez mais, a propósito de muita coisa, que a idade é apenas um número, e que, por isso, nunca nos devemos sentir velhos, até porque o ser humano vive muito mais tempo do que antigamente, e que as pessoas de 60 e 70 de hoje, são as de 40 e 50 de há anos atrás. À partida, até parece uma grande notícia, e eu, que já estou nesse escalão, sinto-me muito lisonjeada por isso, e, normalmente, sorrio de prazer. Quem é que não gosta que lhe digam que está bem e parece mais nova?
Mas eu e todas as pessoas mais velhas sabemos que já temos mais idade, e, ao nos sentirmos bem com isso, é a nossa maior felicidade. Desde que tenhamos saúde e qualidade de vida, e que a nossa criatividade e vontade de viver não seja afetada, conseguimos sentir e desejar como se tivéssemos menos vinte anos. Somos felizes à nossa maneira e tornamos felizes também quem nos rodeia.
A idade não é apenas um número porque com ela carregamos toda uma experiência de vida que nunca deve ser apagada. Não devemos ter vergonha de dizer a nossa idade se nos sentirmos bem com ela. O que não podemos é aceitar que nos discriminem e nos tratem de forma depreciativa, só porque somos pessoas mais velhas.
O culto da imagem que predomina nas sociedades é de gente jovem, bonita e bem vestida. As pessoas que exercem cargos considerados mais elevados também têm padrões a preencher e se não o fizerem são preteridas, quase sem se aperceberem que é por isso. É claro que existem exceções, mas eu não gosto dessas em situações que deviam ser a regra.
As sociedades só têm a ganhar com gente ativa, tenha a idade que tiver. Com gente que ama tudo o que faz, que goza a vida, que contribui com a sua experiência para construir uma sociedade mais feliz e mais igualitária. Há gente bonita, inteligente, criativa, e com vontade de viver e amar em todas as idades. Há gente que se deixa levar pelo falatório e deixa-se ficar apenas a cuidar das crianças e dos animais porque acham que o resto já não é para elas. Isto está errado. Claro que podem cuidar de tudo isso, e muito mais, mas de livre vontade, integradas na partilha entre todos os membros que compõem a família. As tarefas devem ser partilhadas por todos para sermos pessoas felizes e realizadas, e não por sermos mais velhas e termos que cuidar dos mais novos.
Conheço pessoas que foram muito ativas, sofrendo para trabalhar e cuidar dos filhos que, quando já não estavam no ativo, com desejo de se divertirem e fazerem coisas adiadas, foram obrigadas a prescindir da sua vida para cuidar dos mais novos das famílias, ficando confinadas a essa tarefa. Muitas delas fazem por amor e amizade. Diria mesmo por paixão. Sentem-se felizes até o dia que, mais velhas ainda, olharem para trás e verem que o tempo já passou.
Não sendo a idade apenas um número, temos que a viver em plenitude, e com todo o vigor, enquanto tivermos forças e projetos para colocar em prática. Devemos rejeitar tudo o que cheire a discriminação idadista. Afirmemos o nosso querer demonstrando que, enquanto temos saúde e vida, temos todos os direitos, em plena igualdade com as gerações mais novas.
Quando tivermos que recorrer a ajuda para vivermos mais ainda, que ela seja célere e condigna, porque todo o ser humano devia ser feliz até partir deste mundo onde viveu o que tinha a viver.