Artigos

Pessoas dos sete ofícios *

Estas três pessoas, que abaixo menciono, já falecidas, viveram no Campanário no séc. XX, são autênticos exemplos de trabalhado e habilidade, cidadãos dos sete ofícios, entre muitos outros que vivem no campo e que poderiam ser mencionados.

Malhinho da Ponte

Manuel Gonçalves viveu em meados do século XX, foi merceeiro, calafate, pescador, agricultor e mestre de obras. Ele tinha uma mercearia na sua casa, junto à ponte, no sítio da Porta Nova e outra mercearia no Calhau da Lapa, onde era calafate, reparava barcos de pesca. Tinha também um barco, no qual pescava quando o mar estava de feição. Era mestre de obras, foi responsável pela construção de várias casas. Trabalhava ainda nos seus terrenos de agricultura. Com tantas habilidades e ocupações, o Malhinho da Ponte quase nem tinha tempo para descansar.

Amiguinho

Assim era conhecido José Gonçalves Capelinha, cuja alcunha se adivinha o motivo. O Amiguinho foi barbeiro, pedreiro, pescador, vendedor de peixe, tocador de guitarra, além de contador de histórias e a todos recebia bem. Era na sua casa onde, muitas vezes, em criança, eu cortei o cabelo. Era também pedreiro e vivia numa casa à beira da rocha, no Caminho da Vigia, casa que o próprio Amiguinho construiu. Era pescador e numa furgoneta vendia peixe por várias freguesias. Tinha um hábito curioso: depois de vender o peixe, ia ao Caniço comprar cebolas. Trabalhava na agricultura e ainda tinha o talento de tocar guitarra. O seu cão elevava o focinho e emitia uma espécie de uivos, parecia cantar, enquanto o Amiguinho tocava guitarra, facto que maravilhava quem teve o privilégio de presenciar estas serenatas.

Malhinho da Placa

Manuel Fernandes tinha uma mercearia no caminho da Vigia, onde, na altura, não tinha acesso de carro. As mercadorias eram trazidas às costas ou numa corsa até à mercearia. Quando não estava na mercearia, o Malhinho cuidava da agricultura, tratava da vinha ou bananeiras e outras culturas e tinha sempre algum gado (vacas, bois e cabras) ao seu cuidado. No livro Caminho da Vigia (Ed O Liberal, 2011), descreve que, nesta localidade, o Malhinho da Placa era quem mais trabalhava. Na verdade, quase todos os dias eu o encontrava e não me lembro de o ver algum dia sentado a descansar.

* Esta expressão tem origem nas sete artes liberais clássicas: trivium (Gramática, Lógica e Retórica) e quadrivium (Aritmética, Astronomia, Geometria e Música). Quem as dominasse era considerado um autêntico sábio.