Professores de rastos
Chego a, quase, fazer diretas para ter tudo pronto a horas. Fico revoltado quando me dizem que temos 3 meses de férias
(0 relato que se segue foi feito no singular, mas é uma amostra real do que vive a maioria dos professores e educadores)
No passado sábado, estivemos em formação, no SPM, cerca de 100 docentes. Foi um dia muito intenso, mas ainda houve tempo para conversar com alguns colegas sobre o que vivem nas suas escolas ou serviços. Numa dessas conversas, ouvi um relato de uma realidade que conheço bem, mas que nunca me deixa indiferente. Bem pelo contrário, cada um deles renova a minha energia e enche-me de vontade para continuar a contribuir para a alteração da realidade e conquistar condições de trabalho condignas que permitam aos docentes um equilíbrio entre as suas vidas profissionais e pessoais/familiares.
Seguem-se alguns excertos do que ouvi.
Sou professor há mais de 30 anos e gosto muito de o ser. Sinto-me realizado com o que faço. No entanto, de ano para ano, sinto-me cada vez mais cansado. É certo que já não vou para novo, mas o nosso trabalho podia ser bem menos desgastante. Não me refiro ao comportamento dos alunos, se bem que, muitas vezes, se torne difícil gerir. No entanto, aquilo que me desgasta mais é a burocracia e a sobrecarga de trabalho com que me defronto diariamente. Alguns exemplos sobejamente conhecidos, como preparação de aulas, elaboração de testes e sua correção, e outros bem menos famosos, mas não menos trabalhosos: elaboração de fichas (de leitura, funcionamento da língua, p.e.) e sua correção; exercícios de reescrita e sua correção; elaboração de guiões de leitura e sua aplicação; preparação das apresentações orais individuais dos alunos e sua avaliação; estruturação dos portefólios, acompanhamento da sua elaboração e horas a fio para a sua análise, correção e avaliação, etc.
São horas e horas de trabalho diário e, sobretudo, ao fim de semana. Quem conhece esta realidade? Só os professores e os seus familiares mais próximos, porque, há muito se habituaram a ter de prescindir da companhia daqueles. É sempre um corrupio para manter tudo sob controlo. No entanto, nas últimas semanas dos períodos, tudo se complica. Quem sabe que gasto mais de 200 horas (o equivalente a quase 6 semanas inteiras de trabalho!), por período, só para corrigir os testes dos meus alunos? As contas são fáceis de fazer: mais de 100 alunos, a uma hora por cada teste; duas vezes por período, nunca dá menos do que isso. Não estou a exagerar: temos de corrigir com os critérios de exame, em que cada resposta tem 3 cotações distintas. É duro, muito duro. Chego a, quase, fazer diretas para ter tudo pronto a horas. Fico revoltado quando me dizem que temos 3 meses de férias. A sociedade quer tudo dos professores e acha que eles não têm direito a direitos. Se não gostasse tanto de ser professor, já me tinha ido embora. Quem me dera um horário de 35 horas semanais!