Madeira

O último adeus a Luís Silva, antigo dono do DN-Lisboa para quem os jornais sempre foram "espaços de liberdade"

Morreu, aos 91 anos, o antigo dono da Lusomundo, que deteve publicações como o Diário de Notícias de Lisboa, Jornal de Notícias e TSF, antes de vender a empresa à PT Multimédia em troca de 2,7% da Portugal Telecom

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Em 1997, por ocasião da sua vinda à Região para inaugurar a TSF-Madeira, Luís Silva deu uma entrevista ao DIÁRIO de Notícias da Madeira, onde falou sobre comunicação social e criticou os ataques do então presidente do Governo Regional aos referidos 'media' detidos pela Lusomundo

No passado sábado morreu Luís Silva, aos 91 anos, antigo dono da Lusomundo, que deteve publicações como o Diário de Notícias de Lisboa, Jornal de Notícias e TSF, antes de vender a empresa à PT Multimédia em troca de 2,7% da Portugal Telecom.

Filho de um alfaiate natural da Madeira que se estabeleceu em Ponta Delgada, Luís Augusto da Silva nasceu nos Açores. Pilotou aviões na Força Aérea Portuguesa e em 1955 casou-se com Maria Perpétua Ferreira Bordallo da Silva, a única rapariga da família Bordallo, com quem teve três filhos.

A obra 'Portugal à venda', escrita por Ana Suspiro e publicada em 2015, salienta que a "Lusomundo foi um dos maiores grupos de comunicação social em Portugal".

No início dos anos 90, o grupo do coronel Luís Silva comprou o Jornal de Notícias e pouco depois adquiriu o Diário de Notícias, numa transação singular. O título histórico foi disputado por várias cooperativas de jornalistas, que tinham vantagem na privatização. Ganhou a proposta liderada por Alberto do Rosário. No mesmo dia, o jornal foi revendido a Luís Silva e o vendedor viria a ser administrador da Lusomundo. Apoiado no crescimento do negócio dos cinemas, o grupo compra a TSF, mas falha a entrada na televisão, depois de abandonar o consórcio de investidores da SIC e de uma tentativa não concretizada para comprar a TVI. Ana Suspiro, na obra 'Portugal à venda'

O mesmo livro lembra que, no virar do milénio, "apesar da dívida, a Lusomundo é um alvo atraente para a Portugal Telecom, que investe 190 milhões de euros (contas de 2002) na sua aquisição. Foi um grande negócio para Luís Silva, que se torna acionista da PT e mais tarde investe em outras sociedades cotadas".

Os media da Lusomundo "são espaços de liberdade"

Antes, Luís Silva esteve na Madeira em 1997, por ocasião da inauguração do estúdio da TSF-M, concedendo uma entrevista ao DIÁRIO de Notícias da Madeira, merecendo destaque na primeira página da edição de 6 de Novembro.

Em conversa com o jornalista Ricardo Miguel Oliveira, o então administrador da Lusomundo classificava de "disparate" as acusações que Alberto João Jardim tecia sobre os órgãos de comunicação social ligados ao seu grupo, quando referia que estes se estendiam como um autêntico polvo de propaganda que visava sustentar o PS.

Luís Silva até dizia compreender os "timings" das declarações políticas, mas garantia que os seus 'media' "são espaços de liberdade", seja para quem neles trabalha como para quem os consome. 

Em causa, o facto de as empresas de comunicação social então ligadas ao Grupo Lusomundo estarem a ser alvo de múltiplas acusações e processos movidos por Alberto João Jardim. Frequentemente, o presidente do Governo Regional apontava o dedo ao DIÁRIO de Notícias de Lisboa, à TSF e ao DIÁRIO de Notícias da Madeira, sublinhando que estes órgãos "estão a estender um autêntico polvo de propaganda que visa sustentar o PS". 

Sereno, Luís Silva dizia que as considerações do líder madeirense não o preocupavam. Aliás, em relação a tais acusações, desabafava: "A única coisa que eu posso dizer é que isso é um disparate". Nem mais, na sua óptica, "cada um dos órgãos de comunicação social a que estamos ligados são espaços de liberdade, quer para quem neles trabalha como para quem os consome". 

De resto, Luís Silva encarava mesmo com optimismo o futuro da comunicação social portuguesa, considerando que 1997 seria "um ano interessante", para perdurar enquanto houver desenvolvimento económico, o que "irá acontecer nos próximos cinco anos", dizia. Desta forma, salienta que "os grupos de comunicação social têm uma enorme dependência dos factores que dominam a economia do País". Assim, se 1997 prometia, o mesmo não acontecera nos primeiros anos da década de 90, pois estes "foram complicados, já que a economia cresceu de uma forma negativa ou insuficiente, o que teve repercussões muito graves sobre a vida dos jornais, que vive dos leitores mas também dos anunciantes". Dizia que a lógica é simples: "Quando a economia atravessa períodos difíceis, a primeira coisa a ressentir-se são os investimentos em marketing e publicidade".

Luís Silva nasceu nos Açores, foi piloto da Força Aérea e chegou a ser um dos homens mais ricos do País

De acordo com o Dinheiro Vivo, Luís Silva, em conjunto com a mulher, Maria Perpétua Bordallo, era em 2012 a 10.ª pessoa mais rica de Portugal, com uma fortuna avaliada em 521 milhões de euros.

Detêm a Cinveste, uma holding de investimentos que ainda no mês passado vendeu 2,82% da ZON à empresária angolana Isabel dos Santos. Luís Silva ficou conhecido como ex-proprietário da Lusomundo, o grupo mais tarde adquirido pela Portugal Telecom (e agora pertença da ZON, após a separação da PTM). Há vários anos que o casal Luís e Maria Perpétua Silva se encontra entre os 20 mais ricos do país. Luís Silva, açoriano de raiz e piloto da Força Aérea, ganhou relevo na área dos cinemas e de media, embora tenha progressivamente desinvestido do sector. Dinheiro Vivo, notícia publicada a 25 de Julho de 2012

"Ninguém conhece bem a Madeira, porque a Madeira está a mudar todos os dias", dizia Luís Silva

Conforme escreveu o DIÁRIO em 1997, Luís Silva tinha uma relação muito antiga com a Madeira já que o seu pai era madeirense, mais propriamente do Funchal, embora depois tenha emigrado para o Brasil, para mais tarde se fixar em São Miguel, nos Açores. Com 7 anos, visitou a casa dos seus avós, pela mão da sua mãe, na primeira vez que veio à Região. Com 64 anos continuava a dizer que conhecia mal a Região. E justifica: "Ninguém conhece bem a Madeira, porque a Madeira está a mudar todos os dias". 

E cada vez que visitava a Madeira dizia-se surpreendido: "Vejo uma coisa nova e diferente". A 4 de Novembro de 1997, a surpresa voltou a acontecer. Viu a nova rádio DIÁRIO/TSF, mas também o seu velho amigo Alberto João Jardim a aceitar o convite para participar no directo radiofónico e no cocktail que assinalava o início das emissões, quando era ponto assente que Jardim tinha recusado o convivio social.