Miguel Pinto, dos 'Iron Brothers', destaca "esforço titânico" de Álex Roca
O atleta Miguel Pinto, que, juntamente com o irmão Pedro, que tem paralisia cerebral, forma os 'Iron Brothers', classifica um "esforço titânico" o feito de Álex Roca, ao completar a maratona de Barcelona com uma incapacidade de 76%.
"O que o Álex Roca fez foi incrível, porque a dificuldade que isto teve para ele é imensa. Foi um esforço titânico para ele, e exigiu um trabalho prévio gigantesco", afirmou Miguel Pinto, à agência Lusa.
Habituado a fazer provas de triatlo juntamente com o irmão Pedro, que tem paralisia cerebral, Miguel Pinto destaca as dificuldades que Álex Roca, que também tem paralisia cerebral e uma incapacidade de 76%, teve para completar, no domingo, a maratona de Barcelona, com o tempo de 5:50.51 horas.
"Enquanto para quem não tem deficiência há apenas desgaste muscular, para ele, pelas posturas que desenvolveu ao longo de anos, há um desconforto físico grande muito aliado ao muscular", referiu.
Miguel Pinto destacou o exemplo dado pelo espanhol, de 31 anos, que foi anunciado como o primeiro atleta com paralisia cerebral e uma incapacidade de 76% a concluir uma maratona.
"O que ele mostra é que, de facto, toda a gente consegue fazer o que quiser desde que se empenhe e se dedique. Não há impossíveis. Há obstáculos e barreiras que nasceram para ser derrubados", referiu.
O atleta português lembra que Álex Roca, que tem o lado esquerdo do corpo imobilizado, "não gosta que se use a palavra incapacidade".
"O que ele fez foi mostrar que é apenas diferente, mas que isso não o impede de fazer o mesmo que todos os outros", afirmou Miguel Pinto, acrescentando: "O Alex conseguiu trazer a deficiência para primeiro plano e mostrar que ele pertence onde todos os outros pertencem. No meio de todos os outros, ele fez o mesmo".
O atleta português lamentou que ainda haja "vergonha da deficiência e que muitas vezes os pais ainda tenham a tendência de esconder os filhos".
"É isso que é preciso mudar, de uma forma positiva", afirmou, destacando a importância de feitos como o do espanhol para essa alteração de paradigma.
Antiga paralímpica elogia feito de Álex Roca, mas acha abusivo dizer que é inédito
A ex-nadadora paralímpica Maria João Morgado elogia Alex Roca, que, com uma incapacidade de 76%, concluiu a maratona de Barcelona, mas alerta para a necessidade de contextualizar, antes de se assumir que o espanhol conseguiu "um feito inédito".
"Não se pode desvalorizar o feito de uma pessoa com paralisia cerebral ter conseguido correr uma maratona, mas é essencial perceber as características físicas", disse Maria João Morgado à agência Lusa, lembrando que as tabelas de incapacidade não são uniformes na Europa.
A antiga nadadora paralímpica, que marcou presença nos Jogos Sydney2000 e Atenas2004, considera "pouco preciso dizer, como se tem dito nas notícias" que Álex Roca se tornou, no domingo, a primeira pessoa com uma incapacidade de 76% a concluir os 42,195 quilómetros da maratona de Barcelona em 5:50,51 horas.
"Elogio a pessoa com os pés na terra, mas é abusivo dizer que é o primeiro. Será, provavelmente, o primeiro com aquelas características", afirma, deixando um lamento: "É muito mais bombástico escrever isto de ser o primeiro, do que fazer um texto contextualizado e explicar que as pessoas são diferentes e têm capacidades diferentes".
Maria João Morgado, que tem paralisia cerebral e uma incapacidade de 80%, duvida muito que Álex Roca, que tem o lado esquerdo do corpo imobilizado, seja o primeiro a conseguir terminar uma maratona com um grau de incapacidade de 76%.
"Além das pessoas que fazem a maratona em cadeira de rodas, há, quase de certeza, atletas nas competições adaptadas com um grau de incapacidade idêntico que já o fizeram", refere Maria João Morgado, admitindo que a sua opinião pode fazer com que algumas pessoas a olhem como "bruta e insensível".
"É muito complicado não passar por bruta e insensível. Muitas vezes sinto que só somos vistos de duas formas: ou somos super-heróis, porque conseguimos algo que os outros acham fantástico, ou somos desgraçadinhos, porque precisamos de ajuda", afirma, assumindo-se "cansada da dicotomia de pessoas com deficiência versus pessoas sem deficiência".
Aos 44 anos, a antiga atleta, que vive em Almada e trabalha numa empresa de consultoria em sustentabilidade, deixa um alerta: "Não somos nós [pessoas com deficiência] contra vocês [pessoas sem deficiência], nem vocês contra nós, temos de ser todos com todos, porque todos ganhamos se as coisas estiverem acessíveis a todos".
"Se eu quero que os outros se ponham no meu lugar, também tenho que me pôr no dos outros. Não me ponham nunca como a desgraçadinha a apelar ao sentimento, eu não sou especial. Especial é o menu do dia, eu sou a Maria João, com os meus defeitos e as minhas virtudes, como qualquer pessoa", prosseguiu.
Maria João Morgado assume que ela e o marido, também deficiente, tentam "desconstruir de forma natural muitos mitos" que existem sobre incapacidades, tendo "um emprego e uma vida normal".
"Eu quero ser como o comum dos mortais. Não vivo só na redoma da deficiência, sou muito mais do que a minha deficiência", assume.