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A arte do possível!

A 15 de Janeiro de 2023, em declarações ao Diário de Notícias de Lisboa, Sérgio Marques, então deputado à Assembleia da República, fez graves acusações à atuação do Governo Regional. Desde obras inventadas a investimentos loucos, passando por pressões exercidas por grupos económicos sobre o Presidente do Governo Regional que, segundo o próprio, levaram à sua dispensa do cargo de Secretário Regional que desempenhava no primeiro Governo liderado por Miguel Albuquerque, bem como de Eduardo Jesus.

Perante a gravidade das acusações, que poderão igualmente ser consideradas confissões, nenhum madeirense tem dúvida de que teria de ter sido constituída uma Comissão de Inquérito no parlamento regional. Assim foi, por iniciativa do PS-Madeira.

Acontece que desde o primeiro momento, a maioria que suporta o atual Governo Regional se comportou como uma verdadeira força de bloqueio, votando contra tudo o que era proposto, fossem personalidades para serem ouvidas, fossem documentos necessários ao apuramento dos factos. Compreende-se que PSD e CDS estejam comprometidos, mas os madeirenses não podem perdoar a atitude, apenas igualada pela falta de transparência que é imagem de marca deste Governo Regional.

A muito custo e fazendo uso dos direitos potestativos, foi possível ouvir inicialmente dois dos empresários visados. Destas audições, saíram ataques ferozes a Sérgio Marques e a negação das acusações que este tinha feito. Posteriormente, resguardado no seu gabinete, Miguel Albuquerque também respondeu, por escrito às questões que lhe tinham sido colocadas pelo PS e PCP (mais ninguém quis perguntar o que quer que fosse). Em grande parte das respostas, o presidente do Governo foi evasivo, com lacónicos “sim”, “não” ou “não tenho conhecimento”. Nas restantes, fez questão de não criticar obras do passado e também se escusou a justificar respostas quando tal era solicitado. Muito pouco, para quem foi, em tempos idos, muito crítico à atuação dos Governos liderados por Alberto João Jardim e se propunha concretizar uma renovação. Por último, repetiu várias vezes que não reunia com ninguém, que não tratava dos assuntos, reforçando o desconhecimento que supostamente tem das mais variadas matérias da governação. No limite, fica a dúvida se alguém que nada sabe e nada trata deve ser Presidente do Governo Regional.

Já esta semana, coube a Sérgio Marques vir ao parlamento para ser inquirido. Fê-lo, reiterando tudo aquilo que tinha dito anteriormente, acrescentando sentir que mais parecia quererem matar o mensageiro do que apurar a verdade. Efetivamente, é preciso recordar que Sérgio Marques tem uma longa carreira política, tendo sido merecedor da confiança de Alberto João Jardim e de Miguel Albuquerque ao longo de décadas, até há poucas semanas atrás. Foi deputado regional, eurodeputado, secretário regional e deputado na Assembleia da República, e conhece como poucos o PSD-Madeira e a atuação do Governo Regional. Emite opiniões, é certo, mas fá-lo com conhecimento de causa e na primeira pessoa. Por esta razão, e por existirem versões diferentes, entendo que a justiça deverá investigar e atuar, independentemente do relatório que venha a ser elaborado pelos deputados do PSD/CDS. O verdadeiro relatório é aquele que cada madeirense fez, com o seu próprio juízo, ao assistir em direto a todo este processo. As atitudes foram claras, e bem distintas, entre quem quis apurar a verdade e para quem a Comissão de Inquérito era apenas algo de incómodo e que interessava desvalorizar e fazer esquecer rapidamente.

Na realidade, ninguém consegue fazer esquecer as acusações de afastamento de governantes devido a pressões, de obras inúteis que ainda hoje todos pagamos, de promessas de Albuquerque que não foram cumpridas, quer nos portos quer na prioridade às obras públicas, de indícios de favorecimentos materializados em ajustes diretos e acordos extra-judiciais, entre muitos outros temas que são do conhecimento geral da população. Dos milhões gastos, disse Sérgio Marques na passada segunda-feira, que dariam para termos já o novo hospital, só para citar um exemplo.

Enquanto deputado à Assembleia Regional, eleito para defender a população e os interesses da Região, mas sobretudo como candidato a Presidente do Governo já este ano, retive duas mensagens importantes desta última audição. Em primeiro lugar, que quem tem legitimidade democrática é o poder político, motivo pelo qual este não deve em circunstância alguma submeter-se ao poder económico. Em segundo lugar, que a política é a arte do possível. Ora, se a primeira não parece ser uma realidade na Madeira, já a segunda revela que a Madeira que temos é aquela que é possível sendo governada pelo mesmo PSD há quase 50 anos. A Madeira das obras públicas, da falta de oportunidades, da emigração jovem, das listas de espera na Saúde, das carências de habitação, dos baixos salários, dos 240 milhões injetados nas Sociedades de Desenvolvimento desde 2015 ou dos 33 milhões gastos por ano em tachos, quando os madeirenses ainda pagam a fatura destes 46 anos com impostos mais altos que os Açores.

Eu acredito numa Madeira diferente, em que o possível é muito melhor do que aquilo que temos, e se há uma conclusão a que todos os madeirenses já chegaram, é que para o PSD é impossível fazer melhor. Por isso, afirmo convictamente que é tempo de mudar, Madeira!