Madeira

“Acertos de contas” entre políticos e agentes da justiça “põem em causa a Democracia”

Foto Miguel Espada/Aspress
Foto Miguel Espada/Aspress

O presidente da Assembleia Legislativa da Madeira, José Manuel Rodrigues, disse, na abertura do Congresso dos Juízes Portugueses, que decorre esta tarde no Centro de Congressos, que “a Democracia corre sérios riscos”, sendo que um dos factores que contribui para o problema é o “clima de suspeição” e os “acertos de contas” entre os intervenientes na política e na justiça.

“A ética e o respeito pela lei têm de pautar todas acções dos agentes dos diversos poderes, combatendo o sentimento de impunidade, ou a sua percepção por parte dos cidadãos. O clima de suspeição que varre as nossas sociedades, alimentado por violações do segredo de justiça e acertos de contas entre política e justiça, corrói a confiança da sociedade nos seus dirigentes e põe em causa a Democracia”, sublinhou o presidente do principal órgão da Autonomia.

José Manuel Rodrigues assumiu ter ficado com uma “visão pessimista” depois de ter lido o último relatório do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral, que conclui que “o número de países que avançam na direcção do autoritarismo é o dobro dos países que vão na direcção da Democracia”. Para travar esta tendência e salvar a Democracia, o presidente do parlamento considera ser necessária uma acção em seis linhas de actuação, não só por parte dos responsáveis pelas instituições do Estado como também de todos cidadãos. A primeira frente passa precisamente pelo respeito entre as instituições, que não podem andar em “acertos de contas”: “julgo ser crucial um regresso ao institucionalismo, reforçando e dignificando as organizações legislativas, judiciais e executivas, no pleno respeito da separação de poderes, mas cooperando institucionalmente. O confronto entre instituições e protagonistas dos diversos poderes é fonte de descredibilização perante as populações”.

A segunda linha de intervenção passa pelo reforço da subordinação dos poderes económico e financeiro ao poder político, mas “sem pôr em causa a desejável colaboração para o crescimento e desenvolvimento das comunidades”. “É nosso dever pugnar para que, de forma harmoniosa, o Bem Comum se sobreponha a qualquer interesse particular”, referiu Rodrigues, que entende que “essa dialéctica de acção entre a esfera individual e a esfera colectiva não prospera sem uma base sólida de Educação e Formação individual da Cidadania”.

Uma terceira vertente depende de uma maior proximidade dos parlamentos em relação às populações: “Os parlamentos têm de estar mais próximos das populações e os eleitos dos eleitores, reforçando os mecanismos de participação dos cidadãos nos processos legislativos, para que as pessoas não sintam que a Democracia se reduz ao ritual das eleições e que o seu voto só conta de quatro em quatro anos”.

A quarta linha de intervenção consiste no reforço dos mecanismos formais e informais de controlo das instituições democráticas. Neste capítulo, entende que “os tribunais de Contas devem ser vistos como órgãos essenciais a uma boa governação e gestão rigorosa dos dinheiros públicos e não encarados como obstáculos a decisões executivas e à celeridade na execução das políticas públicas”. Outro dos “freios e contra-freios” é a comunicação social. Aqui “importa recuperar o papel essencial da comunicação social de referência” e implementar “uma regulação da informação ou desinformação que circula no ciberespaço e nas redes sociais, sob pena de, em nome das liberdades individuais, estarmos a matar a Liberdade e a Democracia”.

A quinta frente passa pela modernização das instituições: “Não podemos ter sistemas políticos e de justiça com mecanismos e instrumentos do século passado a governar e a julgar em sociedades altamente tecnológicas e digitalizadas do século XXI. É, por isso, urgente modernizar as nossas instituições, os seus métodos, o seu funcionamento e, sobretudo, o modo como estes se relacionam com os cidadãos e com a comunidade”.

Por fim, José Manuel Rodrigues considera que a defesa dos Direitos Humanos deve ser assumida como trave-mestra da sociedade. “A questão dos Direitos Humanos, desde o direito mais básico, como o direito à Vida, até ao direito a uma existência digna, não pode ser uma miragem e ainda menos podemos aceitar os seus retrocessos, seja onde for”, afirmou o presidente da Assembleia, que não aceita situações como a do abandono de barcos com migrantes nas águas do Mediterrâneo ou nas Canárias, nem a exploração e escravidão laborais em Portugal.