Santos Silva avisa que seria preocupante fazer depender legislatura de eleições europeias
O presidente da Assembleia da República considerou hoje que seria preocupante fazer depender a duração de uma legislatura de resultados de eleições europeias, afirmou compreender os protestos dos professores, mas criticou o modelo "anarcossindical" de novos sindicatos.
Estes avisos foram transmitidos por Augusto Santos Silva, deputado socialista eleito pelo círculo Fora da Europa e ex-ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, ao novo 'podcast' do Grupo Parlamentar do PS que se estreia hoje.
Interrogado se as legislaturas estão cada vez mais dependentes das lógicas dos calendários eleitorais, o presidente da Assembleia da República rejeitou e advertiu que seria "cair num erro preocupante não só sugerir que a duração da legislatura dependesse de outras eleições - as chamadas eleições de segunda ordem, designadamente as europeias -, como até sugerir que a duração das legislaturas devesse depender da evolução das sondagens".
"Isso seria profundamente antidemocrático. Toda a gente sabe que, ao longo de quatro anos -- e neste caso quatro anos que têm atrás de si seis anos -- haverá evoluções de sondagens mais ou menos favoráveis. Toda a gente sabe que as eleições de segunda ordem são também momentos em que o eleitorado pode exprimir distância em relação ao Governo -- o eleitorado que depois irá votar no partido de Governo", sustentou.
Augusto Santos Silva vincou depois que "as eleições europeias servem para eleger deputados ao Parlamento Europeu, as eleições locais servem para eleger os eleitos dos municípios, as eleições regionais já este ano na Madeira servem para eleger a Assembleia Legislativa dessa região".
"Ponto", acentuou o ex-ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, defendendo que o Governo "tem todas as condições necessárias para cumprir a legislatura".
"Tem maioria no parlamento, tem toda a colaboração institucional dos restantes órgãos de soberania - Presidente da República e parlamento -, tem um programa que foi sufragado pelo povo há muito pouco tempo e, portanto, tem todas as condições. É responsabilidade do Governo aproveitar essas condições únicas para realizar o seu próprio programa e responder aos problemas que o país sente", completou.
Em relação à greve dos professores, o antigo ministro da Educação do segundo executivo liderado por António Guterres, frisou que "é um direito" e "absolutamente normal em democracia" esta classe profissional estar a expressar o seu descontentamento.
"Há um processo negocial em curso -- e isso merece-me uma segunda saudação, porque em democracia, não só ouvimos as pessoas, como procuramos compromissos com as pessoas. Um processo negocial em que o Governo tem apresentado propostas muito fortes para resolver dificuldades que os sindicados assinalam", apontou.
Já numa alusão indireta ao STOP (Sindicato de Todos os Profissionais de Educação), o presidente da Assembleia da República disse que há "sindicatos genuinamente envolvidos no processo de negociação", mas assiste-se também "a formas de manipulação da greve".
De acordo com Augusto Santos Silva, há sindicatos "mais recentes que se reveem num modelo um pouco anarcossindical fora de tempo".
"Não aceito que uma classe profissional subcontrate junto de outra uma greve para obter o que quer sem ter que fazer essa classe profissional greve. Portanto, isto que se diz - e que aliás as famílias também encontram -, que é haver fundos pelos quais se procura financiar outra classe profissional para que as escolas sejam encerradas, não me parece inadmissível", concluiu.
O presidente da Assembleia da República criticou igualmente o modelo de greve 'self-service'.
"Também me parece eticamente inadmissível -- não sei se é legal ou não, a Procuradoria-Geral da República o dirá - esta forma da chamada greve self-service. Ou seja, faço greve quando quero, a um dos tempos e não um dia inteiro, e sem avisar. A luta social, que nós socialistas entendemos como uma das forças motoras da democracia, tem regras", defendeu.
Nesta conversa, o presidente da Assembleia da República recusou a tese de que esteja a beneficiar o Chega quando tem debates diretos com esta força política.
"Quem critica, quem combate, quem trava, é cúmplice? Então, o que se chamará a quem não critica, não combate, nem trava e até diz que está disponível para acordos? Se os primeiros são cúmplices, o que devemos chamar aos segundos?", questionou, aqui numa alusão à atual direção do PSD.
Ainda em relação ao Chega, Augusto Santos Silva advogou que prefere ter todas as correntes políticas dentro do parlamento, mesmo aquelas que são contra a democracia.