O bom, o mau e os copistas
Portugal tem um grave problema de habitação. A contribuir para esse drama social, temos um regime de arrendamento disfuncional
Os auto-intitulados pais do Serviço Nacional de Saúde celebraram, esta semana, o registo do ano com maior atividade assistencial da história do serviço público de saúde. Efetivamente, em 2022, os hospitais púbicos terão batido todos os recordes de cirurgias e consultas médicas realizadas. Na mesma semana, foi também notícia, embora sem celebração, a taxa de execução do investimento previsto, em 2022, no SNS. Dos 509 milhões de euros prometidos, apenas 230 milhões foram executados, ou seja, mais de metade nunca chegou a sair do papel. Ainda menos do que tinha sido investido em 2021. Com pais destes, não há serviço público que resista.
O bom: Associação Cultural MadeiraCine
Lembro-me de, no final do filme “O Feiticeiro da Calheta”, persistir na sala de cinema um sentimento de pertença. Como se a história acabada de contar na tela fosse, também, uma história sobre nós. Sobre os nossos antepassados, sobre as nossas tradições e sobre a terra onde vivemos. Esse sentimento é raro no cinema - mais habituado às grandes produções americanas e aos argumentos com final feliz. “O Feiticeiro” é o oposto desses lugares comuns. Uma produção pequena, quase caseira, personagens históricas, actores amadores e um argumento que é uma encruzilhada de pequenas histórias. É nessa genuinidade, simples mas verdadeira, que reside o apelo deste cinema. E é por isso que o anúncio ao público da Associação Cultural MadeiraCine partilha desse sentimento autêntico. Não só porque nasce da iniciativa de Luís Miguel Jardim e João Augusto Abreu, respetivamente realizador e actor do “Feiticeiro da Calheta”, mas porque dá corpo à vontade de continuar a fazer cinema na Madeira e a contar histórias sobre os madeirenses. Não faltam, em cada período da nossa história, argumentos à espera de serem filmados. O regime da colonia, as revoluções que daqui se lançaram, o fenómeno da emigração e a construção das levadas são exemplos de tudo o que falta contar. A primeira produção da nova associação será o projeto cinematográfico “Sonhos de Ilhéu” que, embora ainda em fase de pré-produção, promete ser o primeiro passo para um novo capítulo do cinema na Madeira.
O mau: Mariana Mortágua
Portugal tem um grave problema de habitação. A contribuir para esse drama social, temos um regime de arrendamento disfuncional, rendas incomportáveis para os inquilinos e um dos menores parques habitacionais públicos da União Europeia. Não há um culpado único para o caos habitacional em que vivemos e, por isso, não há uma solução milagrosa. A não ser que acreditemos no mundo da fantasia económica em que vive o Bloco de Esquerda e alguns dos seus dirigentes. Para o Bloco, o problema da habitação resolve-se com a proibição de vendas de casas a estrangeiros, a fixação de um preço máximo às rendas e a obrigação de todos os contratos de arrendamento terem o prazo mínimo de cinco anos. Escusado será dizer que, para a distopia bloquista funcionar, os proprietários colocariam os seus imóveis a arrendar, independentemente das condições. E se assim não fosse? Mariana Mortágua apressou-se a responder. Os proprietários têm de ser obrigados a arrendar as casas. A solução de Mortágua, proferida com ímpeto revolucionário, inquieta pela desconsideração absoluta pela propriedade privada. Para o partido dos pequenos tiranetes económicos, o mercado de arrendamento faz-se de casas imaginárias e de senhorios subjugados ao superior interesse da coletividade. É mais do que ideologia, é demagogia barata. Para o Bloco, o proprietário paga para comprar uma casa, volta a pagar anualmente o IMI, paga pela sua conservação e, no final, coloca-a ao dispôr de Mariana Mortágua. Problema da habitação resolvido.
Os copistas: Grupo Parlamentar do PS Madeira
Há coisas difíceis de explicar. O partido que nos prometeu mudança, que se disse com princípios, sem privilégios e que, hoje em dia, nos promete uma Madeira melhor, mostrou verdadeiramente ao que veio. A propósito de uma recomendação ao Governo Regional sobre a existência de espaços, nas marinas, reservados a embarcações movidas a energia limpa, os deputados do PS mostraram os seus dotes de monges copistas – profundamente preocupados com o ambiente, mas desinteressados da função para a qual foram eleitos. O plágio, em forma de iniciativa legislativa, juntava documentos estratégicos, teses de mestrado, livros e artigos de opinião, sem nunca identificar fontes ou autores. Descoberta a fraude, o plenário da Assembleia Legislativa tornou-se demasiado pequeno para tanta vergonha alheia. Miguel Brito, deputado que emprestou a assinatura ao documento, encolheu os ombros. Rui Caetano, líder parlamentar, remeteu-se a um silêncio comprometedor. Sérgio Gonçalves, fiel ao seu estilo de liderança, esteve ausente da sala durante parte da discussão. A embrulhada legislativa, para além de contrafeita, revela a profunda hipocrisia de quem repetidamente se arroga de uma superioridade moral imaginada e de uma ética parlamentar intocável. Afinal, na hora da verdade, os deputados socialistas preferiram brilhar à custa do trabalho alheio, em vez de identificarem, com modéstia, os autores citados. É óbvio que os deputados do PS sabem bem o que fizeram. Tenho muitas dúvidas que saibam o que andam a fazer.