Katerina encontrou no povo ucraniano na Madeira uma família
Katerina Leacock, madeirense de 51 anos, até ao início da guerra não tinha qualquer ligação à Ucrânia, mas o conflito fê-la tornar-se voluntária e encontrou no povo ucraniano uma família.
Quando a guerra entre a Rússia e a Ucrânia começou, em 24 de fevereiro do ano passado, Katerina, que sempre esteve ligada ao voluntariado, teve conhecimento que a delegação madeirense da Associação dos Ucranianos em Portugal precisava de donativos e decidiu oferecer-se como voluntária.
"Separava as roupas, comida para bebés, comida para adultos, bens de higiene pessoal, medicamentos", conta à agência Lusa, acrescentando que foi conhecendo as primeiras mulheres ucranianas refugiadas da guerra e que, de imediato, entraram na sua vida.
"Aí começou a minha relação com elas. Eu comecei a entrar na vida delas e elas na minha", afirma.
Além do trabalho de voluntariado, há uma relação de amizade e Katerina faz questão de estar presente em datas especiais para as suas novas amigas ucranianas.
"Faço mesmo questão. Elas costumam dizer que eu já tenho sangue ucraniano e que um dia quando a guerra acabar que abrem as suas casas para me receber a mim e aos meus filhos, que também já fazem parte da vida delas", diz.
Katerina confidencia à Lusa que já sabe dizer algumas palavras naquela língua e vai até fazer um curso 'online' de ucraniano.
"Eu vou fazer porque preciso de aprender ucraniano. Não chega só o inglês e o tradutor. Eu quero mais", salienta.
"Eu sabia muito pouco sobre a Ucrânia até a guerra começar. Isto é incrível, mas é verdade. E, desde que a guerra começou, eu comecei a pesquisar, a perceber a importância da cultura, da língua, do valor", refere.
Neste momento, ajuda os refugiados ucranianos a encontrarem uma habitação e dirige-os para os vários serviços públicos de que necessitem, como o Serviço Regional de Saúde, a Segurança Social ou Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).
E adverte frequentemente nas redes sociais a população que a guerra não terminou: "Por favor não se esqueçam da guerra porque a guerra continua e é difícil".
"No início foi um grande choque para as pessoas e houve um grande envolvimento da parte dos madeirenses a nível de donativos, de entregas de muitas coisas, mas com o passar do tempo, as pessoas têm as suas vidas, os seus problemas, as suas situações complicadas e, por isso, é preciso também uma grande capacidade de entrega, de resiliência e de não baixar os braços", considera.
Para Katerina, o problema da guerra não atinge só a Ucrânia e "não tem a ver com o aumento de preços".
"Não tem a ver com a eletricidade mais cara ou a gasolina ou o gasóleo. Tem a ver com a Europa, com todos nós. Podíamos ser nós", frisa.
Valentyna Chan, representante na Madeira da Associação dos Ucranianos em Portugal, destaca, em declarações à agência Lusa, que os principais problemas que lhe chegam atualmente prendem-se com a demora no SEF em dar resposta aos pedidos de proteção temporária e em conseguir habitação, devido às rendas elevadas, assim como arranjar emprego sem dominar o português.
"Os que trabalham 'online' não precisam de língua para trabalhar, mas aqueles que precisam de trabalho aqui precisam de falar português e claro que aprender a língua demora algum tempo", nota.
Atualmente, o trabalho da associação tem sido, sobretudo, acompanhar e dar apoios às pessoas com questões burocráticas e encaminhar para os serviços de que necessitam.
"Quem tem crianças, por exemplo, vamos dirigir à Segurança Social e tentar perceber como é que se pede o abono", exemplifica.
"Nós, neste momento, orientamos. As pessoas muitas vezes chegam cá, muitas vezes estão um pouco perdidas na cidade e nós temos logo de estruturar o que é que a pessoa tem de fazer", aponta.
Valentyna sabe que já entraram na Madeira mais de 800 ucranianos desde o início da guerra, mas não sabe quantificar quantos ainda se encontram na ilha.
Contudo, assegura que, apesar das dificuldades que alguns enfrentam, há também quem esteja perfeitamente integrado e ninguém fica na rua.
A ofensiva militar lançada em 24 de fevereiro de 2022 pela Rússia na Ucrânia causou até agora a fuga de mais de 14 milhões de pessoas -- 6,5 milhões de deslocados internos e mais de oito milhões para países europeus -, de acordo com os mais recentes dados das Nações Unidas (ONU), que classificam esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
A ONU apresentou como confirmados, desde o início da guerra, 7.155 civis mortos e 11.662 feridos, sublinhando que estes números estão muito aquém dos reais.