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Carta Aberta a D. Nuno Brás

Lamentável este silêncio. Que mensagem estão a transmitir às famílias e crianças que neste momento seguem a sua formação cristã?

Absolutamente dececionante, absolutamente intolerável. O seu silêncio relativamente aos casos de pedofilia na Região, perpetrados por sacerdotes católicos, a quem famílias, pais e avós, confiaram os seus filhos e netos, não é simplesmente aceitável.

O Estudo de Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, elaborada por uma Comissão Independente, personalidades de indubitável integridade e competência profissional, revelou que pelo menos 4.815 crianças foram vítimas de abusos na Igreja Católica entre 1950 e 2022. Podemos presumir que será apenas a ponta do “iceberg”, tendo em conta que a esmagadora maioria dos casos foi verificada por denúncias e testemunhos, e que haverá muito mais pessoas e vítimas que não foram capazes de falar de possíveis abusos do seu passado.

Na Madeira foram revelados 14 casos, e podemos inferir que pouco foi contado na região, mas esses casos existiram e não podemos tratá-los como algo circunstancial e esporádico.

Não pode haver uma cultura de displicência ou negligência relativamente à pedofilia, e o primeiro a dar o exemplo teria de ser a mais alta autoridade religiosa na Região, V.exa. D. Nuno Brás, no mínimo tendo uma palavra perante as vítimas e as suas famílias, e condenando veementemente todos os abusos perpetrados por membros da sua igreja. A sua palavra não pode ser apenas para um “tempo certo”, que só gera incerteza, confusão e desilusão.

Não esperou pelo “tempo certo” o Presidente da Conferência Episcopal, que com a informação pública do relatório declarou logo e imediatamente o seu pedido de perdão a todas as vítimas, e expressando a realidade trágica dos abusos sexuais provocados por clérigos da igreja católica.

Pode ler-se no relatório que “(…) em muitos dos relatos que de seguida podem ser lidos é bem notório o grau de desamparo emocional sentido perante o trauma, de que são exemplo os sentimentos vividos de «medo», «culpa», «vergonha» ou outros referidos como «humilhação», «nojo», «desconfiança/insegurança» e, evidentemente, de «solidão», que nos retroprojetam para a profundidade traumática de infâncias destruídas por crimes cometidos por aqueles de quem afinal se esperava o oposto: segurança, proteção, compreensão e, acima de tudo, e na sua mais vasta expressão, «amor incondicional» (…)”.

Decidiu pelo silêncio. Quando quem tem a responsabilidade hierárquica na Madeira não se interessa, ou pelo menos assim dá a entender, como poderemos debelar um problema que existe pelo encobrimento de décadas, pela tentativa de menorizar, de esconder, de obstaculizar a verdade. Foi demasiada gente com as suas vidas destruídas. O relatório identificou casos concretos e alertou de forma séria e assertiva para problemas que toda a gente sabe que existem, mas poucos agem sobre eles. Se V.exa. D. Nuno Brás nem sobre o relatório se pronuncia, o que poderemos pensar para o futuro?

Lamentável este silêncio. Que mensagem estão a transmitir às famílias e crianças que neste momento seguem a sua formação cristã? Que segurança transmitem às crianças e jovens que hoje frequentam as vossas catequeses, que ouvem estas notícias sobre os abusos sexuais, mas apenas silêncio por parte da mais alta entidade religiosa madeirense.

Na verdade, os únicos que quebraram o silêncio foram as vítimas. E da igreja, parece que nada se quer fazer ouvir sobre este assunto na Região.

Permita-me dizer, se na pior crise da igreja católica portuguesa, no mais escandaloso caso que alguma vez terão de lidar, na mais escabrosa das descobertas e evidências, se a sua resposta aos abusos sexuais perpetrados a menores é o silêncio, então já não está a fazer nada no lugar que neste momento ocupa.