Crónicas

Poder e Oposição

Apesar destas tensões, as relações entre poder e oposição são essenciais para a manutenção da democracia

1. Disco: ter uma carreira musical tem muito a ver com o não se desviar um milímetro do som desenvolvido, ou então com a capacidade de reinvenção. Em “This Is Why”, é isso que os Paramore fazem. Um conjunto de músicas de grande qualidade que se afasta da sonoridade que os marcava. Músicas “catchy”, daquelas orelhudas. Em “This is Why” temos a invenção da música pós-pandémica. Tudo muito bem feito.

2. Livro: “O Mestre da Fuga”, de Jonathan Freedland, é um daqueles livros que se lê muito rapidamente. Uma narrativa verdadeira que nos agarra e envolve. Conta-nos a história de um sobrevivente do Holocausto, cuja história angustiante, assustadora e verdadeiramente épica, é de uma enorme brutalidade. Uma história de sobrevivência e engenho face ao mal absoluto.

3. As relações entre poder e oposição são fundamentais em qualquer sociedade democrática que se organize em torno de governos, lideranças e instituições. A dinâmica entre aqueles que detêm o poder e aqueles que o questionam, é uma constante da vida política e social, e influencia directamente o funcionamento das democracias.

Havendo vários, um dos modos de definir o poder é a que o vê como a capacidade de um indivíduo, grupo ou instituição, de controlar recursos e tomar decisões que afectam a vida de outras pessoas. Essa capacidade pode sustentar-se em diversos factores, como a riqueza, a força militar, a habilidade de persuasão, a autoridade formal ou o apoio popular. Em qualquer caso, aqueles que detêm o poder podem impor as suas vontades e interesses sobre os demais.

A oposição, no que lhe concerne, é o conjunto de indivíduos, grupos ou instituições que se opõem ao poder estabelecido, buscando contestá-lo, mudá-lo ou substituí-lo. O seu objectivo principal é fazer com que as decisões políticas reflictam uma variedade maior de interesses e valores, e não apenas os daqueles que detêm o poder.

As relações entre poder e oposição podem ser, por vezes, bastante tensas, e em muitos casos levam a conflitos, confrontos e, no limite, à violência. Isso ocorre porque aqueles que possuem o poder têm uma forte motivação para manter a sua posição e resistir às exigências e contestações da oposição. Por outro lado, a oposição muitas vezes sente-se frustrada por não conseguir influenciar as decisões políticas, e pode recorrer a medidas menos convencionais para atingir os seus objectivos.

Apesar destas tensões, as relações entre poder e oposição são essenciais para a manutenção da democracia e do equilíbrio de forças na sociedade. A oposição é uma voz importante na fiscalização do poder, apontando falhas, denunciando abusos e exigindo transparência. Numa sociedade democrática, a oposição deve ser capaz de actuar livremente e sem empecilhos, e o poder deve estar disposto a ouvir e negociar com aqueles que discordam das suas posições.

Para que a relação entre poder e oposição funcione, de forma saudável, é necessário que ambas as partes estejam dispostas a dialogar e buscar soluções que reflictam as diversas sensibilidades da sociedade. É preciso que haja respeito mútuo, tolerância e compromisso, de modo a procurar-se o bem comum. Quando o poder e a oposição conseguem actuar de forma equilibrada e cooperativa, a sociedade, como um todo, é beneficiada, e o funcionamento das instituições democráticas é fortalecido.

Já por diversas vezes aqui escrevi sobre o poder e o seu exercício. Desenganem-se aqueles que entendem que a “oposição” é de somenos. Ser oposição é também uma forma de poder. O poder da fiscalização, o poder da denúncia, o poder de indicar alternativa.

Ser oposição séria e com credibilidade, dá muito trabalho, porque sê-la com influência é da conveniência de todos. Até do Governo. Apresentar propostas, marcar agenda, promover o debate público, procurar informação e conhecimento, levantar questões, escrutinar a actividade governamental, promover investigação, ser claro na comunicação, promover grupos de trabalho, denunciar o erro e propor alternativas, etc., são tarefas de enorme importância.

Outra das mais importantes facetas de ser oposição é a atenção. A atenção ao pormenor, às variáveis e às circunstâncias.

A possibilidade de deixar de ser oposição apoia-se na adaptabilidade, na capacidade de se ajustar às mudanças. Se assim não for, escancara-se a porta para a inutilidade, devido à incapacidade de encarar as novas realidades políticas que surgem, como resultado das grandes mudanças sociais por que passamos. Fazer política, hoje, não é o mesmo que se fazia há vinte ou mais anos. Tudo muda muito rapidamente.

Uma oposição forte e bem organizada é um elemento essencial a uma democracia funcional. As oportunidades dos partidos políticos de envolver os cidadãos e influenciar o governo variam significativamente, com base no controlarem o governo ou servirem na oposição.

Os governos das democracias representativas podem, por vezes, seguir caminhos que não se alinham com as preferências dos eleitores. Quando estes carecem de informações sobre o viés político do governo e as consequências das suas políticas, terão sempre dificuldade em responsabilizar o governo. Um partido de oposição pode ajudar a resolver este problema, fornecendo informações sobre alternativas. A existência de oposição pode induzir um governo tendencioso a ajustar as suas políticas. Para que este equilíbrio funcione, a reputação da oposição e do governo devem estar próximas uma da outra, ou o eleitor acreditar que uma alternativa política tem muito mais probabilidade de ser boa que outra. Uma espécie de equilíbrio onde uma preocupação compensa a outra.

A legitimidade política da oposição, constitui um componente-chave de qualquer forma de democracia liberal.

4. De que têm medo os partidos com assento na Assembleia Legislativa Regional da Madeira? Porque fazem como os três macacos e fingem que não vêm, não ouvem e nada dizem? Nas últimas duas semanas foram contactados de diferentes maneiras, no sentido de se mexerem para alterar a Lei Eleitoral das Regionais para que o voto antecipado e em mobilidade, fosse possível. Alguém ouviu alguma coisa? Estamos em face de cobardia política ou de não quererem reconhecer a preguiça de, em quase quatro anos, tão pouco terem produzido?

Tenho para mim que não permitir este tipo de voto prefigura crime de lesa democracia, de lesa Autonomia. Os madeirenses serão tratados diferentemente de todos os outros portugueses, ao não lhes ser permitido votar por antecipação ou em mobilidade. E os responsáveis estão aí, à vista de todos: integram os grupos parlamentares do PSD, do PS, do CDS, do JPP, bem como do deputado único do PCP. No mínimo, somos todos merecedores de saber o porquê de nada fazerem.

5. Ouvi um jovem deputado do PSD na Assembleia da República a defender uma proposta do seu partido para mudar o modo como os emigrantes votam, permitindo que mais o façam. Nada a opor. Disse o deputado que, relativamente ao voto, não pode haver “portugueses de primeira e portugueses de segunda”. No entanto, o seu partido na Região Autónoma da Madeira não mexe uma palha para facultar o voto por antecipação ou mobilidade nas regionais deste ano, como acontece em todas as outras eleições, excepto — pela sua complexidade — as autárquicas.

Quem cospe para o ar…

6. A imagem de hoje é uma colagem digital, inspirada num quadro de Jeff Christensen, “Corruption”.