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Fact Check Madeira

Será verdade que Guida Vieira participou na criação do feriado da Primeira Oitava?

Foto Manuel Nicolau Arquivo DIÁRIO
Foto Manuel Nicolau Arquivo DIÁRIO

A antiga deputada da UDP e do Bloco de Esquerda Guida Vieira partilhou hoje, na sua página no Facebook, o seu orgulho por “ter sido uma das autoras” do feriado da Primeira Oitava. Será que foi mesmo?

O actual quadro de trabalho na quadra natalícia em Portugal é em larga medida uma conquista da revolução de 25 de Abril de 1974. Logo no final desse ano, o governo provisório decidiu que dar tolerância de ponto nos serviços públicos no dia 23 de Dezembro, de modo a permitir que os funcionários públicos pudessem fazer as suas compras de Natal. E foi ainda autorizado o encerramento do comércio no dia 26 de Dezembro, o qual foi justificado com “a intensificação do trabalho” a estiveram sujeitos os funcionários do sector nos dias antecedentes. No ano seguinte, o decreto-lei n.º 713-A/75, de 19 de Dezembro, veio colocar a hipótese de escolha de feriado obrigatório a 24 ou 26 de Dezembro, mas em Abril de 1976 o Conselho de Ministros alterou aquele diploma e determinou que apenas a véspera de Natal seria feriado obrigatório.

Na Madeira, foi o primeiro Governo Regional (1976-78), presidido por Jaime Ornelas Camacho, quem tomou a decisão de fixar a Primeira Oitava como feriado obrigatório. A medida foi consagrada através da Portaria n.º 56/ 77, publicada a 17 de Dezembro de 1977.

Os executivos seguintes, já presididos por Alberto João Jardim, mantiveram esta tradição. Mas no ano 2000 houve problemas.

Através da resolução n.º 1936/2000, o Governo Regional decidiu que o 26 de Dezembro seria feriado obrigatório. A empresa de segurança privada ‘Securitas’ entendeu que este feriado regional não era legalmente válido e recusou-se a pagar o suplemento remuneratório extraordinário aos funcionários que trabalharam nesse dia. Na sequência, a Inspecção Regional do Trabalho instaurou-lhe um processo e aplicou uma coima no valor de 1.450 contos (cerca de 7.233 euros). A empresa recorreu ao Tribunal de Trabalho do Funchal, que lhe deu razão, considerando que o executivo regional se imiscuiu em matéria de legislação laboral, que seria competência da Assembleia da República. O Ministério Público recorreu para o Tribunal Constitucional, que em 15 de Outubro de 2003 decidiu que a resolução do conselho de Governo Regional que criava um novo feriado era inconstitucional.

Entretanto, ainda no decorrer deste processo, a questão da consagração do 26 de Dezembro como feriado regional transitou para a Assembleia Legislativa da Madeira, onde foi apresentada uma proposta de decreto legislativo regional com aquele objectivo. O primeiro diploma aprovado pelo parlamento madeirense foi vetado pelo então ministro da República, Monteiro Diniz. Mas a 8 de Outubro de 2002, o decreto legislativo foi novamente aprovado por todos os deputados da Assembleia, incluindo Guida Vieira, que então representava a UDP.

Mesmo após a aprovação do diploma na Assembleia da Madeira, a Securitas voltou a não reconhecer o feriado e recusou-se a pagar o suplemento aos seus 243 trabalhadores que trabalharam a 26 de Dezembro de 2003. A Inspecção do Trabalho aplicou-lhe uma nova multa de 130 mil euros. A empresa contestou no tribunal de trabalho do Funchal, que baixou o valor da coima para 2.500 euros. Fez novo recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), que a absolveu de qualquer pagamento, com a justificação que a Região já tinha um feriado regional (1 de Julho) e não poderia criar outro. Só que aqui o magistrado do Ministério Público junto do TRL assumiu o interesse específico da Região e enviou o caso para o Tribunal Constitucional, que a 23 de Março de 2007 decidiram que o diploma regional que instituiu o feriado da Primeira Oitava não violava os princípios da Constituição da República Portuguesa.

Em resumo, Guida Vieira participou efectivamente no processo legislativo que em 2002 instituiu o feriado regional de 26 de Dezembro, mas há que assinalar que este diploma contou com o apoio de todas as forças representadas na Assembleia Legislativa da Madeira e na sua origem está uma decisão do Governo Regional tomada já em 1977.

"Tenho muito orgulho de ter sido uma das autoras deste feriado" - Guida Vieira no Facebook