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"Verdadeiro problema" do envio de ajuda para Gaza é a ofensiva de Israel

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Foto Andrea RENAULT / AFP

O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou hoje que o "verdadeiro problema" do envio de ajuda humanitária para Gaza é a "forma como Israel conduz a ofensiva" neste enclave palestiniano.

"Muitas pessoas medem a eficácia das operações humanitárias em Gaza com base no número de camiões do Crescente Vermelho egípcio, da ONU e dos nossos parceiros que estão autorizados a atravessar a fronteira. É um erro", declarou Guterres à imprensa em Nova Iorque.

"O verdadeiro problema é a forma como Israel conduz a sua ofensiva, que cria obstáculos maciços à distribuição da ajuda humanitária para Gaza", frisou o secretário-geral.

"Um cessar-fogo humanitário é a única maneira de começar a responder às necessidades desesperadas da população de Gaza e pôr fim ao pesadelo que ela vive", adiantou Guterres, pouco depois da aprovação no Conselho de Segurança da ONU, após uma semana de intensas negociações e de adiamentos sucessivos, de uma resolução exigindo o envio para a Faixa de Gaza de ajuda humanitária "em grande escala".

A resolução, com caráter jurídico vinculativo e apresentada pelos Emirados Árabes Unidos (EAU), teve de ser reescrita várias vezes ao longo da semana devido a objeções dos Estados Unidos, que têm poder de veto no organismo e que o exerceram em anteriores votações.

Hoje Washington absteve-se, assim como a Rússia (também com poder de veto), permitindo a passagem com 13 votos favoráveis da resolução, que ao contrário das primeiras versões não apela a um cessar-fogo imediato.

Guterres reconheceu que a sua esperança ao invocar de forma inédita no seu mandato, há duas semanas, o artigo 99.º da Carta da ONU (que permite ao secretário-geral dirigir-se ao Conselho de Segurança em caso de ameaça grave à segurança) era no sentido de a organização se juntar ao seu pedido de cessar-fogo.

"Eu tinha esperança. Isso não significa que as coisas aconteçam de acordo com as nossas esperanças", disse o líder da ONU - que não se mostrou intimidado quando Israel começou a questionar a sua imparcialidade no conflito e a exigir a sua demissão - e defendeu que hoje "se pode ver o copo meio vazio ou meio cheio".

Ainda assim, o antigo primeiro-ministro português espera que a resolução hoje aprovada mostre a importância de um cessar-fogo para garantir que chegue ajuda suficiente ao enclave palestiniano, onde as agências da ONU estimam que mais de meio milhão de pessoas enfrentam fome.

Antes da votação no Conselho de Segurança, a embaixadora dos Emirados na ONU, Lana Nusseibeh, admitiu que o seu texto "não é perfeito" e que só um cessar-fogo entre Israel e o Hamas servirá para aliviar as terríveis condições humanitárias na Faixa de Gaza, onde já mais de 20 mil pessoas morreram, segundo dados das autoridades locais, controladas pelo movimento islamita palestiniano Hamas.

A embaixadora norte-americana junto da ONU, Linda Thomas-Greenfield, defendeu, por seu lado, que o novo texto apela à "criação de condições para uma cessação sustentável das hostilidades" e que isso já representa "um forte passo em frente".

A resolução também solicita ao secretário-geral da ONU que nomeie um coordenador especial para acelerar o envio de ajuda humanitária.

Israel declarou guerra ao Hamas, em retaliação ao ataque de 07 de outubro perpetrado pelo grupo em território israelita, que fez 1.139 mortos, na maioria civis, de acordo com o mais recente balanço das autoridades israelitas.

Desde então, o Exército de Telavive conduziu uma poderosa ofensiva aérea, terrestre e marítima na Faixa de Gaza.

A operação militar já deixou mais de 20 mil mortos e acima de 52 mil feridos, a maioria dos quais mulheres, crianças e idosos, segundo números das autoridades locais de Gaza, bem como 1,9 milhões de deslocados, 85% da população total do enclave, de acordo com a ONU.

Desde o início da guerra, os combates na Faixa de Gaza só foram interrompidos durante uma semana - entre 24 e 30 de novembro - durante uma trégua mediada pelo Qatar, Egito e Estados Unidos, que incluiu a libertação de 105 reféns detidos pelo Hamas em troca de 240 prisioneiros palestinianos e a entrada de ajuda humanitária no enclave.

Cerca de 130 reféns permanecem em cativeiro no território palestiniano, onde a população deslocada sobrevive em tendas em pleno inverno e numa profunda crise humanitária, devido ao colapso dos hospitais, ao surto de epidemias e à escassez de água potável, alimentos, medicamentos, eletricidade e combustível.

O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, reafirmou na quarta-feira que Israel continuará "a guerra até ao fim", diluindo as esperanças de um cessar-fogo na Faixa de Gaza, no dia em que era esperado o reatamento de negociações com o Hamas.

"Continuamos a guerra até o fim. Ela continuará até que o Hamas seja eliminado, até à vitória", insistiu Netanyahu numa mensagem de vídeo.

O Hamas e outras fações palestinianas rejeitaram a possibilidade de iniciar conversações sobre a libertação de pessoas raptadas durante os ataques de 07 de outubro, a menos que haja "uma cessação da agressão" israelita