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Natal é Navidad

A quadra natalícia evoca um universo de magia, memórias e tradições. Recordo com especial afeto os Natais da minha infância passados na casa dos meus avós maternos em Carmen de Uria, na Venezuela. À beira do Mar das Caraíbas, as missas do parto foram substituídas pelas de “aguinaldo” e o Menino Jesus transformou-se num “niño”. O aroma da carne de vinha d’alhos misturava-se com o cheiro do “guiso das hallacas”, e as “gaitas” (música originária da Região de Zulia) ecoavam, enquanto a minha avó pegava na braguinha para entoar as letras das romagens madeirenses e fazer despiques com os familiares, em tom de saudade.

Os despiques, a bisca, o som das peças de dominó na mesa faziam parte dessa paisagem natalícia com aroma a bolo de mel e “torta negra”, numa família que nunca esqueceu as suas raízes, mas soube abraçar de coração aberto os costumes da terra de acolhida. Lembro-me vividamente dos momentos em que, ao redor da mesa, as histórias eram contadas, misturando-se as narrativas das duas terras que agora chamamos de lar.

Ao retornar à Madeira, trouxemos a “Navidad” connosco e continuamos a entoar “si la Virgen fuera andina y San José de los Llanos, el niño Jesús sería un niño venezolano”. Acrescentamos novos costumes, como decorar o pinheirinho com balões, ver as luzes no Funchal ou fazer uma digressão pela ilha para visitar os presépios. Uma infinidade de tradições que se renovam com a chegada de cada Natal, tornando-se gradualmente indistinguíveis, sem sabermos já o que é daqui ou de lá. Uma realidade compartilhada por centenas de famílias ao longo da nossa ilha, todas elas com uma parte do coração na Venezuela.

O Natal é muito mais do que uma árvore enfeitando a sala ou uma lapinha decorada com trigo semeado no início de dezembro. O Natal é um momento de reencontros familiares e da entrega de abraços esperados durante todo o ano. É um mundo de tradições construídas com a certeza de que serão transmitidas de geração em geração. Esta quadra também serve para evocar memórias de tempos passados, daqueles que já partiram, mas que deixaram o seu legado presente numa receita de broas de mel, numa canção, numa fotografia ou numa decoração da árvore de Natal. Essas memórias são uma segunda oportunidade para voltarmos a ser felizes.

É inegável que o Natal, independentemente do lugar, transcende as fronteiras geográficas, conectando-nos por meio de laços intangíveis de amor, família e tradição. Este é o verdadeiro espírito natalício que une o passado ao presente, moldando o futuro com uma harmonia cultural que celebramos com gratidão e alegria.

Seja Natal ou “Navidad”, temos a certeza que será Feliz.