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Fact Check Madeira

Será verdade que os barcos roubados na Madeira são sempre recuperados?

O veleiro 'Quero-Quero', que foi alvo de furto da Marina do Funchal e recuperado no Porto Novo pela Polícia Marítima. FOTO SÉRGIO FERREIRA
O veleiro 'Quero-Quero', que foi alvo de furto da Marina do Funchal e recuperado no Porto Novo pela Polícia Marítima. FOTO SÉRGIO FERREIRA

Vários comentários nas redes sociais à notícia do recente furto do veleiro ‘Quero-Quero’ da marina do Funchal e posterior recuperação desvalorizaram o incidente e dão a entender que a embarcação não poderia ser levada para longe. Um cidadão refere que o larápio levou o barco “só para dar uma voltinha” e que o “ia devolver”. “Ia com isso para onde?”, questiona outro comentador no Facebook. Outro ainda garante que “bom marinheiro volta sempre a bom porto”. Mas será que as embarcações furtadas ou roubadas na Madeira voltaram sempre aos seus legítimos proprietários?

O nosso arquipélago encontra-se numa situação geográfica relativamente isolada no Oceano Atlântico, em que os territórios mais próximos são as Canárias (cerca de 500 quilómetros) e a costa de Marrocos (cerca de 700 quilómetros). Deste modo, não será fácil a alguém furtar uma embarcação na Madeira ou no Porto Santo e desaparecer sem deixar rasto. A acontecer tal situação, o normal é serem accionados os meios da Autoridade Marítima Nacional, Marinha ou Força Aérea, que muito provavelmente vão localizar o paradeiro do barco ou navio, sendo que as autoridades portuguesas dispõem de meios legais para obrigar à sua devolução.

Podemos dizer que este quadro de factores desincentiva os espíritos mais aventureiros a tomarem em mãos embarcações alheias e a fazerem-se ao mar. Mas a verdade é que isso já aconteceu na Madeira pelo menos uma vez e o barco não foi recuperado.

‘Dácia’. Assim se chamava o barco de pesca de atum, propriedade da empresa madeirense Somagel, que foi alvo de quatro assaltantes quando se encontrava fundeado no Caniçal, na madrugada de 24 de Fevereiro de 1982. O grupo de piratas era liderado por Ambrósio Gomes, um cabo-verdiano que cinco anos antes fixara residência em Machico. Os seus três comparsas tinham vindo dos Açores e de Peniche, nos dias que antecederam a façanha. Antes de soltarem amarras, puseram borda fora, sob ameaça de arma branca, quatro adolescentes do Caniçal que dormiam a bordo do ‘Dácia’.

O alerta para o roubo da embarcação só foi dado pela manhã, pelo que as buscas iniciaram-se com algumas horas de atraso, com recurso ao Aviocar da Força Aérea e ao patrulha ‘Zambeze’ da Marinha Portuguesa. Só em Dezembro seguinte, o atuneiro veio a ser localizado em Monróvia, capital da Libéria, já com outro nome no casco, pintado com cores diferentes e a ser operado por uma empresa local, a quem fora vendido. Um representante da Somagel deslocou-se àquele país africano para tentar reaver a embarcação, mas não teve sucesso. Em Setembro de 1983, foi noticiado que a Interpol estava a tratar da detenção e encaminhamento dos quatro piratas para Portugal, a pedido das autoridades portuguesas. Não há registo de que essas diligências tenham produzido resultados e o atuneiro ‘Dácia’ nunca regressou à Madeira.

Em resumo, não é verdade que qualquer barco furtado da Madeira “volta a bom porto”.

Barco roubado na Madeira “volta sempre a bom porto”. Comentário no Facebook