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Para um 25 de Novembro sem preconceitos (e em contexto)

Que se comemorem, portanto, todas as datas sobre as quais historicamente se edificou a nossa Democracia

O “25 de Novembro” (de 1975) foi um contragolpe militar, promovido pelos sectores ditos moderados das Forças Armadas - com o apoio dos seus homólogos nos Partidos políticos - sob liderança operacional de Ramalho Eanes (escudado pelo “Grupo dos Nove” e por Jaime Neves), com um objectivo, inequívoco: fazer frente (e colocar ponto final) ao que consideravam (e temiam que fossem) movimentações organizadas por outras facções militares, ligadas à dita extrema-esquerda (onde ponderavam, entre outros, Otelo, comandante do COPCON, e Vasco Gonçalves), para perverter o rumo político do país. Em simultâneo, acabou por servir para travar a forte instabilidade política (com vários episódios violentos), que caracterizara (por entre decisões políticas, acções armadas, atentados, comunicados e manifestos) o chamado Verão Quente.

Isto não evita que continuem a persistir ambiguidades e até contradições, que só a investigação e o estudo ajudarão a ultrapassar.

Na verdade, tais tensões eram decorrentes de um conflito multifacetado (que aqui não cabe desenvolver), que desde o “25 de Abril” já levara a outras (re)intervenções militares, iniciadas com o “28 de Setembro” (de 74) e agudizadas com o “11 de Março” (de 75). Tudo num quadro político-institucional complexo, com eleições pelo meio (para a Constituinte), mas em que o poder tendia a “cair na rua” (ou nas mãos de facções militares ou populares armadas), num país a ser (também) governado por um Conselho da Revolução.

Na sua dimensão micro, convém ter presente que os acontecimentos de Novembro que hoje se evocam, sucederam (13 dias depois) a um cerco da Assembleia (então ainda) Constituinte, realizado (nos dias 12 e 13) por trabalhadores em greve, a maior parte da construção civil. Na prática, esta acção (que até tinha como referência histórica uma a outra, no longínquo ano de 1918) significara a sitiação, ou “sequestro” (nas famosas palavras de Pinheiro de Azevedo) dos deputados e do próprio chefe de Governo, impedidos de sair do Palácio de S. Bento durante 36h. Mas note-se que nem todos os parlamentares ficaram nestas circunstâncias, porque alguns, de dois partidos, foram autorizados a abandonar o edifício, por entre os aplausos dos manifestantes.

Nos dias seguintes, receou-se uma guerra civil. Vários deputados deslocaram-se para o Norte do país e muitos até admitiram a possibilidade da transferência dos legítimos Órgãos de Soberania para outro ponto do território.

É neste ambiente (volátil e no qual se contavam armas) que acontece o “25 de Novembro”, como “travão” e como “virar de página”, sem (contra?) unanimismos forçados e artificiais.

Mais: nem eram totalmente coincidentes os interesses e o pensamento político que lhe estava subjacente. Também por isso foi importante: porque abriu - em definitivo - a porta à diversidade e à liberdade política e individual.

Como? Porque representou o fim da expressão militar do Processo Revolucionário em Curso (PREC) e veio corrigir os desvios revolucionários; porque anulou o MFA e assegurou o início do regresso dos militares aos quartéis, dando assim um passo fundamental para a manutenção da paz política e social, inclusive nas Ilhas Adjacentes (futuras Regiões Autónomas); porque facilitou o caminho para aprovação e entrada em vigor da Constituição (em Abril de 1976) e, com isso, para a realização das primeiras Eleições Legislativas livres por sufrágio universal, para a instituição das Regiões Autónomas e para a aprovação dos seus novos Estatutos Políticos e, neste sentido, até para a realização das primeiras Eleições Legislativas Regionais, em Junho de 1976.

Nesta perspectiva, contribuiu até para recuperar (e recolocar) o espírito inicial (e sincero) do “25 de Abril”, através de um culminar (e extravasar) de tensões, que se deve entender como complementar àquela que foi uma data genética e a tanto do que ela havia anunciado.

Foi assim, também o “25 de Novembro”, parte importante no (árduo) processo de construção do modelo democrático, ajudando a fazer vingar a opção pela base parlamentar e constitucional, de matriz ocidental, multipartidária, pelo qual hoje nos regemos, sabendo-se que à partida eram diversos os projectos políticos possíveis.

Que se comemorem, portanto, todas as datas sobre as quais historicamente se edificou a nossa Democracia, aproveitando-as para, através de análises rigorosas e sem intuitos instrumentais, promover o conhecimento e fortalecer a Liberdade e a Autonomia. Sem preconceitos e (muito menos) sem (putativos) donos.

Mas esta - como várias das questões a que aludi - já é uma outra História.