O economista João Abel de Freitas, na edição de hoje do DIÁRIO, veio defender a necessidade de a Madeira ponderar a produção de electricidade a partir de energia nuclear.
Para muitas pessoas a palavra nuclear, só por si, já é suficiente para causar temores. Por outro lado, existem os incondicionais dessa fonte quase inesgotável de energia, ainda que seja considerada não renovável.
Neste trabalho, socorremo-nos de várias fontes, de que destacamos a Agência Internacional de Energia Atónica (AIEA), o relatório ‘O Estado da indústria Nuclear Mundial 2022’ da World Nuclear Insdustry Status Report (o próximo relatório é publicado no dia 6 de Dezembro deste ano), um artigo na revista Ágora do NEEA - Núcleo de Estudantes de Engenharia do Ambiente do IST (publicado em Julho 2023): A versatilidade da energia nuclear, e a revista National Geographic Portugal de Setembro de 2023.
O urânio é a fonte nuclear mais usada na produção de energia eléctrica. Trata-se de um elemento químico em que Portugal é rico. Isto é, tem combustível.
Na prática, nos reactores nucleares, provocam-se reacções químicas, que libertam uma quantidade enorme de energia. Essa energia é aproveitada para fazer mover turbinas que geram electricidade.
Vejamos as vantagens na leitura da Agência Internacional
“A energia é essencial para o crescimento económico sustentável e para a melhoria do bem-estar humano. A energia nuclear proporciona acesso a energia limpa, fiável e acessível, mitigando os impactos negativos das alterações climáticas. É uma parte significativa do mix energético mundial e espera-se que a sua utilização cresça nas próximas décadas.”
“A AIEA promove a utilização eficiente e segura da energia nuclear, apoiando programas nucleares existentes e novos em todo o mundo, catalisando a inovação e criando capacidades no planeamento energético, na análise e na gestão da informação e do conhecimento nuclear. A Agência ajuda os países a satisfazer a crescente procura de energia para o desenvolvimento, melhorando ao mesmo tempo a segurança energética, reduzindo os impactos ambientais e de saúde e atenuando as alterações climáticas.”
“A AIEA ajuda os países em todos os aspectos do ciclo do combustível nuclear, desde a extracção de urânio até à gestão do combustível irradiado e dos resíduos radioactivos, promovendo o intercâmbio de informações técnicas entre os países. Apoia também a ampla utilização de tecnologia nuclear pacífica através de reactores de investigação e aplicações não eléctricas, bem como o desenvolvimento da fusão.”
Os alunos do Instituto Superior Técnico, no já referido artigo, advogam as vantagens da energia nuclear lembrando que se trata de uma energia cada vez mais segura e que é possível fazer a gestão dos resíduos, a longo prazo, utilizando repositórios geológicos de profundidade, como está a acontecer na Finlândia e na Suécia.
“Da operação de reactores nucleares resulta uma pequena quantidade de resíduos e estes têm sido geridos com responsabilidade desde a entrada em operação da energia nuclear civil. Ao contrário de outros resíduos industriais, o principal perigo associado aos resíduos de nível elevado, a radioactividade, diminui com o tempo. As instalações de armazenamento provisório fornecem um ambiente adequado para conter e gerir resíduos existentes. Após 40 anos, a radioactividade do combustível usado diminui para cerca de um milésimo do nível quando o combustível foi descarregado do reactor”.
Como referiu João Abel de Freitas, neste momento, estão em desenvolvimento pequenos reactores modulares avançados (SMR). Esses reactores, além de muito mais baratos e mais fáceis de manter, vão assegurar energia, mas também uma outra variedade de benefícios como a dessalinização da água, a produção de hidrogénio e geração de calor para a indústria entre outros, lembram-nos os alunos do Instituto Superior Técnico.
Os defensores da energia nuclear citam um estudo norte-americano (Kharecha, P.A., & Hansen, J. E., 2013, Prevented mortality and greenhouse gas emissions from historical and projected nuclear power. Enviromental Science & Tecnology, 47(9)) que diz que, entre 1971 e 2009 teriam morrido dois milhões de pessoas se a energia nuclear tivesse sido substituída por energia fóssil e 76 mil pessoas por ano, em média 76 mil anuais entre 2000 e 2009.
Desvantagens do uso de energia nuclear
A grande desvantagem da energia nuclear é o risco de acidentes. Ainda que cada vez mais mitigado e controlado, em especial, com recurso aos pequenos reactores, ele existe.
Outra das desvantagens é a produção de resíduos radioativos, que têm de ser geridos durante dezenas e até centenas de anos.
Outra das desvantagens é o possível uso da energia nuclear para fins bélicos e/ou terroristas, ainda que, em teoria, os fins civis não estejam ligados aos militares.
Portugal já teve reactor nuclear
Portugal já teve um reactor nuclear, mas está a ser desmantelado há alguns anos.
O reactor nuclear português foi começado a construir em 1957 e ficou concluído em 1961 e esteve ao serviço da Junta de Energia Nuclear de Portugal, criada em 1954.
Tratou-se sempre de um pequeno reactor de investigação localizado nos arredores de Lisboa, na Bobadela.
A partir de 2012, ficou ao ‘cuidado’ do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa.
Em 2016, o combustível de urânio foi retirado do reactor e enviado para os Estados Unidos da América.
O equipamento, segundo o jornal Observados de 2 de Setembro de 2019, foi desmantelado em Março daquele ano e enviado também para os Estados Unidos.
O Observador explicava: “Esta é uma história que remonta a Maio de 2016: segundo o acordo assinado entre as três partes, Portugal só poderia devolver o urânio aos norte-americanos se o reactor parasse de funcionar até dia 12 desse mês; se continuasse a operar (tinha capacidade para o fazer até 2026), teria de ser Portugal a encontrar uma solução para se livrar desses materiais radioativos. A somar-se a isto, uma inspeção da AIEA detectou falhas técnicas e recomendou melhorias — as obras, explica José Marques, poderiam ser no valor de “dez milhões de euros”.
“Não mandaram parar o reator. Recomendaram é que fizéssemos diversas outras inspeções por causa do envelhecimento das estruturas”, acrescenta o físico. “Decidimos parar preventivamente.”
Foram pagos aos norte-americanos pelo menos 530 mil euros.
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