Trabalhar e viver na rua
Hoje de manhã quando estava a passear a nossa cadela, passou por nós uma pessoa que devia estar em situação de sem abrigo porque trazia com ela todos os seus pertences num carrinho. Parecia estar tudo tão bem arrumado e a pessoa andava com tanta dignidade que pensei que a ser uma pessoa sem abrigo devia estar na situação faz pouco tempo ou tinha imensa força interior para aguentar a situação.
Lembrei-me de outra pessoa em situação idêntica que conheci faz uns anos. Costumava pedir à porta do Supermercado e um dia como era hora do almoço comprei-lhe a refeição e sentei-me a conversar com ele. Tinha trabalhado na hotelaria, mas teve um problema de saúde que o fez não poder trabalhar mais, por isso encontrava-se naquela situação de não ter onde viver. Falei-lhe em pedir ajuda, mas ele disse-me que não tinha encontrado ainda nenhuma resposta positiva aos seus pedidos. Teria menos ou pouco mais de 40 anos e parecia estar bem. Passados uns meses voltei a vê-lo a dormir num relvado aparentando terem passado anos desde a última vez que o tinha visto. A rua destrói e destrói muito rapidamente.
Por coincidência hoje uma das estações de televisão no noticiário da hora do almoço referiu o aumento do número de pessoas em situação de sem abrigo e de como algumas dessas pessoas se encontram nessa situação apesar de terem um emprego. Na realidade alguns empregos têm remunerações que não permitem que se consiga sobreviver e pagar uma habitação. Assim vão surgindo tendas não só nas cidades portuguesas, mas também por toda a restante Europa com trabalhadores a viverem acampados.
Verifiquei que existem sites que dão informações úteis para as pessoas que vivem na rua. Algumas dessas indicações levam-nos a refletir da dificuldade e do perigo da situação em que nunca se pode deixar de estar alerta.
Já imaginaram o que é ao fim de um dia de trabalho não ter aquela sensação agradável de entrar em casa, fechar a porta, respirar fundo e pensar: “em casa”. O direito à habitação é o direito a sentir que temos um espaço que é nosso, onde estamos bem e que nos faz querer voltar.
Festejar os 50 anos do 25 de Abril de 1974 com cada vez mais pessoas a viver na rua faz-me ver que falhámos, que não dedicámos energia suficiente a resolver o problema talvez porque tenhamos falado demais e agido de menos.
Sei que não vou estar vivo nos 100 anos do 25 de Abril, mas aqui ficam os meus votos para que nesse dia todos tenham um teto a protegê-los.