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Fact Check Madeira

Estarão as casas a serem vendidas muito acima da avaliação feita pelos bancos?

Foto Shutterstock
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O preço médio das vendas das casas na Madeira são mais altos do que o valor da avaliação bancária que os bancos usam para a concessão de crédito à habitação. Tem sido assim sempre, pelo menos até onde é possível analisar, par a par os períodos - ainda que no primeiro caso a contabilização seja feita trimestralmente e no segundo mês a mês. Assim, até ao segundo trimestre deste ano, o Valor Mediano das Vendas por m2 de Alojamentos Familiares na Região foi de 1.916 euros/m2, enquanto que o Valor Mediano de Avaliação Bancária de Habitação na Madeira em Abril, Maio e Junho foi de 1.538 euros/m2, 1.581 euros/m2 e 1.600 euros/m2, respectivamente (dá uma média de 1.573 euros/m2 no trimestre). Ou seja, há, claramente uma diferença desses valores da venda e da avaliação.

Contudo, essa realidade tem vindo a agravar-se nos últimos anos. O valor mediano das casas na Madeira no 2.º trimestre de 2023 cresceu significativamente desde o início de 2019, mais 58,5%, enquanto a avaliação bancária para a concessão de crédito à habitação aumentou 47,6%. E em 7 anos (desde o 1.º trimestre de 2016, período mais distante que se pode recuar nos dados publicados pela DREM) esta diferença quadruplicou.

O que antes significava quase 5% acima do valor venda face ao valor da avaliação no início de 2016, entre Janeiro e Março de 2019 estava 13,4% acima e há um ano a diferença já era de mais 14,8%. A mais recente actualização (até ao 2.º trimestre de 2023), ascendia a mais 21,8%.

Ou seja, no mesmo período (média de Abril, Maio e Junho de 2023) em que a avaliação do imóvel valia os tais 1.573 euros/m2, o valor médio da venda ascendia aos 1.916 euros/m2, aumentando para mais 343 euros por cada metro quadrado em relação à avaliação feita pelo perito do banco, criando um sério problema para o comprador.

Acresce nesta situação que no 3.º trimestre de 2023 (ou seja a média de Julho, Agosto e Setembro) esse valor da avaliação bancária aumentou ainda mais para 1.703 euros/m2, tendo aliás atingido em Setembro o valor recorde de 1.753 euros/m2. Ou seja, o valor mediano da venda já estará, muito provavelmente, acima dos 2 mil euros/m2, que terá sido ultrapassado no final do 3.º trimestre deste ano.

Lei da oferta e da procura acentua-se

A questão é: até quando vai continuar a aumentar esta diferença entre o que os bancos avaliam e o quanto os compradores, efectivamente, conseguem pagar pela casa? No ano passado, o mercado imobiliário na Madeira transaccionou quase 841,5 milhões de euros de 4.142 imóveis. Isso representou uma média de 203.155 euros por habitação. No ano anterior, tinham sido transaccionados 3.571 imóveis pela soma de quase 611,4 milhões de euros, à média de 171.202 euros por imóvel. Ora, este ano, nos primeiros seis meses foram vendidos 1.693 imóveis pela soma de quase 381,3 milhões de euros, o que dá uma média de 225.217 euros por venda.

O crescimento do valor de mercado dos imóveis é evidente, mas o principal contributo para o aumento dos preços tem sido dado pelo lado da procura face à oferta existente, não tanto pela qualidade. Tanto mais porque o pico das vendas terá sido atingido no 3.º trimestre do ano passado, quando foram transaccionados 1.180 imóveis pelo valor de perto de 229,15 milhões de euros (média de 194.193 euros).

Isto revela que no trimestre em que mais casa foram vendidas na Madeira e o valor global bateu no máximo de sempre, a média por imóvel estava bastante abaixo do trimestre mais recente. No 2.º trimestre de 2023, foram transaccionados 795 imóveis (a menor quantidade desde o 1.º trimestre de 2021) por uma soma de quase 186 milhões de euros (o quinto trimestre com maior volume financeiro de transacções pelo menos desde 2009). Daí a média por imóvel deste trimestre ascenda a 233.905 euros.

Quanto menor a oferta, mais caro tem ficado adquirir uma casa, dificultando a mais pessoas o acesso ao crédito. Uma vez que os bancos fazem avaliações pelo valor real do imóvel, mas o mercado rege-se pela lei da oferta e da procura, é muito provável que o valor dos imóveis continue a aumentar e mais capital próprio será exigido aos compradores para cobrirem a parte que a banca vai financiar.

50 mil de capital próprio quem tem?

Como explica o portal Dr. Finanças, especialistas em crédito, que se designam como intermediários de crédito vinculado e que são certificados pelo Banco de Portugal, trabalhando directamente com vários bancos na resolução de melhores ofertas para os consumidores.

"Se a casa for comprada através de um crédito habitação, a avaliação do imóvel pode ter influência no montante que a instituição de crédito vai financiar. Isto porque de acordo com as regras do Banco de Portugal, o limite máximo de financiamento é de 90% do LTV (loan-to-value) para uma habitação própria permanente. E nem todas as instituições de crédito financiam este valor. Há situações em que os bancos apenas emprestam 80% do valor do imóvel, o que significa que o montante do crédito será menor", explica.

E adianta mais: "Caso não saiba, o LTV corresponde ao rácio entre o valor financiado pelo banco para a compra de casa e o valor do imóvel. No entanto, o valor do imóvel que será considerado vai corresponder ao valor mais baixo entre: o valor da avaliação e o valor de aquisição."

Exemplificando, refere o Dr. Finanças, "imagine que uma casa está à venda por 180.000 euros. No entanto, após ser enviado um perito independente ao imóvel, este avalia a casa por 160.000 euros. Nesta situação, o banco pode financiar, no máximo, 90% dos 160.000 euros (pois o valor considerado é o menor). O que perfaz um empréstimo de 144 mil euros".

Ora, "tendo em consideração os valores acima referidos, um comprador nesta situação terá de ter capitais próprios no montante de 36.000 euros, para poder comprar a casa através de crédito. Este valor corresponde a: 10% dos 160 mil euros, acrescido de 20 mil euros para totalizar o valor de venda (180 mil euros) pedido pelo vendedor".

Transpondo essa perspectiva para os valores referidos na Madeira, um imóvel de 100 metros quadrados adquirido por 1.916 euros/m2 custaria 191.600 euros. Ora, se nesse trimestre a média da avaliação feita pelo banco ascendeu a 1.573 euros/m2 o que resulta em 157.300 euros o valor máximo estabelecido pelo perito, o que significa que poderá conseguir financiamento da sua futura casa em 141.570 euros. Ou seja, para conseguir a sua casa de eleição teria de ter 50 mil para cobrir a diferença do que o banco lhe empresta e o que o vendedor está disposto a receber.

O valor mediano das casas na Madeira no 2.º trimestre de 2023 cresceu significativamente desde o início de 2019, mais 58,5%, enquanto a avaliação bancária para a concessão de crédito à habitação aumentou 47,6%. Em 7 anos esta diferença quadruplicou