O nosso sistema governativo
A Madeira iniciou o processo de uma nova dinâmica política, no quadro da governação, ao qual não estamos habituados e que causa estranheza e confusão. A necessidade de criar soluções para que a nossa ilha possa ser governada e governável resultou num acordo inédito na nossa história política.
Muitas vezes, torna-se difícil entendermos que as soluções políticas de governação têm de adaptar-se ao sistema político democrático parlamentar vigente em Portugal.
Na Madeira, habituados a uma governação, por maioria, com um rosto temos de perceber que no futuro e tendencialmente tudo irá mudar. Todos os partidos, sem exceção, terão de fazer acordos prévios ou posteriores às eleições de incidência meramente parlamentar ou até de governação. Não haja ilusões, sem vitórias com maioria absoluta, seja qual for o partido, acordos terão de ser feitos entre vários partidos cujas as afinidades ideológicas poderão não ser tão evidentes.
E é neste quadro que os partidos terão de se apresentar no futuro ao eleitorado, com verdade política e grande sentido de responsabilidade. Cada um terá de apresentar as medidas das quais não pode prescindir, nas negociações que terão obrigatoriamente que acontecer. Quais as linhas vermelhas que não podem ser transpostas e com que partidos não será possível realizar qualquer tipo de acordo.
Para que as pessoas percebam bem o que estou a dizer vou dar um exemplo prático e de forma simplificada:
Foram eleitos representantes de 9 partidos diferentes para o nosso Parlamento e não houve nenhum partido (ou coligação) que obteve mais de 50% dos lugares no Parlamento (maioria).
Para o Representante da República aceitar uma proposta governativa, um conjunto de partidos terá de assumir um compromisso de estabilidade governativa, totalizando no mínimo 50% de deputados eleitos. Atenção que não têm de estar de acordo em todas as matérias, mas terão de ocorrer negociações, cedências, compromisso, bom senso, equilíbrio (tudo coisas que não estamos a ver na política, especialmente na relação entre partidos diferentes). Só assim a Região pode ser governada e as instituições podem funcionar.
Assim sendo e usando o exemplo da Região:
A Coligação PSD/ CDS para ser opção de governação tinha de obter um acordo com um partido que tivesse pelo menos um deputado. A opção foi o PAN.
Caso não tivesse conseguido fazer um acordo com o PAN ou qualquer outro partido, o representante da República perguntaria ao segundo partido mais votado, neste caso o PS se este teria condições de garantir estabilidade parlamentar por via de acordos com todos os outros partidos da oposição (para obter a maioria parlamentar - mais de 50%).
Para formar governo, o PS teria de fazer acordo com o CHEGA, BLOCO, PCP, INICIATIVA LIBERAL, JUNTOS pelo POVO e PAN.
Vamos ser sinceros, olhando para este cenário, alguém consegue imaginar um acordo destes?
O PAN foi acusado de trair os eleitores para viabilizar um governo do PSD/CDS, mas o que diria a opinião pública ou os eleitores sobre esse abrangente acordo, composto pelos partidos acima mencionados, para viabilizar um governo Socialista. Seriam aqui todos traidores entre si?
A não acontecer qualquer acordo, o resultado seria desastroso para a Região pois seria impossível formar governo e teria de haver novas eleições. A manter-se esta dispersão de votos e a falta de acordos estáveis, estaríamos perante uma situação onde tudo parava e onde os partidos teriam de desdizer tudo que haviam dito anteriormente e formar as alianças mais improváveis.
É por este motivo que daqui para a frente todos os partidos, sem exceção, terão de ter um discurso muito responsável e transparente sobre todos os cenários de governação e possíveis acordos parlamentares.
Perguntam-se os leitores se isso irá querer dizer que os governos serão formados por vários partidos? A resposta é não. Toda a base é o acordo no parlamento, isso é o fundamental. A formação de Governo com elementos de vários partidos é facultativo e decorre meramente do resultado das negociações.
Neste contexto, a comunicação social terá também um papel fundamental neste processo de esclarecimento das populações e promover a literacia política.
Os eleitores e os partidos deverão ter consciência que:
Um voto num partido como manifestação de revolta contra outro, pode significar a formação de um governo legitimado por ambos, por acordos parlamentares e/ou governativos. O sentimento de traição do eleitor será justificado caso os partidos continuem com uma abordagem pouco realista e pouco clara para com os seus eleitores. Os partidos e os seus líderes devem prezar pela honestidade para com o eleitorado sobre esta matéria.
O voto num partido, até à data, apenas ouvido no parlamento, pode significar que efetivamente a sua voz, as suas medidas sejam desenvolvidas no quadro governativo pelos acordos alcançados. Os partidos devem ser responsáveis e criarem programas efetivos e exequíveis que possam acrescentar real valor e os eleitores devem exigi-lo.
Os responsáveis políticos deverão ter um discurso absolutamente responsável por forma a promover o sentido crítico saudável das populações sobre o funcionamento dos órgãos democraticamente eleitos, sem demagogia ou lançando mensagens confusas e de soluções inexequíveis.