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Crimes ambientais têm muitas vezes Estado como responsável

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Foto Culturgest/Renato Santos

O Estado é muitas das vezes o principal responsável pelos crimes ambientais, concordaram hoje os participantes num debate sobre o tema, no qual foram recordados atentados contra o ambiente, vários deles sem culpados.

Exxon, Volkswagen, Senado dos Estados Unidos ou São Pedro da Cova foram nomes recordados pela sua relação em algum momento com escândalos ambientais, num debate na Culturgest, em Lisboa, que juntou o filósofo e ambientalista Viriato Soromenho-Marques, o engenheiro do ambiente e ambientalista da associação Zero Rui Berkemeier e a jovem ativista Andreia Galvão.

A eles juntaram-se André Amálio e Tereza Havlícková, que se empenharam nas questões relacionadas com as quase 300 mil toneladas de resíduos perigosos provenientes da Siderurgia Nacional depositadas nas antigas minas de São Pedro da Cova, Gondomar, há duas décadas. A remoção dos resíduos só terminou no ano passado. Desse empenho resultam dois espetáculos, "A Mina" e "Tribunal Mina", na Culturgest de sexta-feira a domingo.

Do caso nunca saíram culpados, pelo que os participantes no debate de hoje também concordaram que há nas questões ambientais um sentimento de impunidade.

Viriato Soromenho-Marques questionou se não serão crimes contra a humanidade o facto de em 1982 a Exxon (petrolífera dos Estados Unidos, hoje ExxonMobil) ter silenciado um estudo que fazia o retrato exato da evolução da concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, passando antes a "financiar mentiras".

Ou o escândalo da Volkswagen, que manipulou automóveis para parecerem menos poluentes. Ou o senado dos Estados Unidos ter sido unânime a dizer ao Presidente que o país não entrava em acordos internacionais que prejudicassem a sua indústria, a propósito do Protocolo de Quioto (de limitação de emissões de gases com efeito de estufa).

Crítico, Soromenho-Marques lembrou outro tratado de limitação de gases, o Acordo de Paris, que apelidou de fraude por ser um tratado internacional sem obrigações, monitorização e penalizações, um acordo negociado entre os Estados Unidos e a China, uma "ilusão de que está a acontecer alguma coisa quando não está".

Rui Berkemeier centrou-se apenas em Portugal para afiançar que os crimes ambientais existem e que por vezes são premeditados, pelo próprio Estado.

Foi o Estado que permitiu a colocação de resíduos em São Pedro da Cova, que pagou a remoção e que não encontrou culpados, exemplificou, afirmando depois que nos crimes ambientais o Estado argumenta não ter recursos financeiros para fiscalização, quando na verdade tal é "uma opção política".

Rui Berkemeier falou de leis que são bloqueadas "nos corredores do poder", leis que funcionam perversamente, porque fica mais barato não a cumprir, ou leis em que o Estado faz uma "interpretação errada e propositada da lei".

Depois, disse ainda, há instituições do Estado, como a Agência Portuguesa do Ambiente, que dificultam a divulgação de dados, que usam números e os comunicam à Comissão Europeia que não são reais. E há a Comissão Europeia que atualmente também "não quer saber" de nada, acusou.

"Vivemos num mundo em que parece que o Estado não nos quer ouvir. Vivemos uma crise na democracia porque o Estado julga que a democracia é apenas o momento eleitoral", acusou André Amálio.

E a isto junta-se ainda, nas palavras de Viriato Soromenho-Marques, um direito internacional público em que nada funciona para o ambiente, sendo necessário que adote algo semelhante do direito dos condomínios, com uma parte privada e outra partilhada.

E porque "nada funciona" e as alterações climáticas estão cada vez mais presentes Andreia Galvão questionou se o mundo não está já a viver o apocalipse, o fim do mundo, tal como se imagina na cultura popular.