A falta de saneamento afecta milhares de pessoas?
"Se há problema ambiental que na ilha da Madeira afecta milhares de pessoas é tudo quanto resulta da falta de investimento público na criação de uma rede de saneamento básico”. A declaração foi proferida pelo coordenador da CDU, Edgar Silva, na sequência de uma iniciativa política realizada na qual alertou que, "para tanta gente, em vários concelhos, este é um problema dramático", que "atenta contra a saúde pública e é a causa directa da degradação das condições de vida de milhares de pessoas”. Será verdade esta denúncia?
Para destrinçar este assunto é preciso perceber que a ARM - Empresa de Águas, Resíduos da Madeira - é responsável pelo Sistema Multimunicipal de drenagem e tratamento de águas residuais da Região, actuando nos municípios de Ribeira Brava, Câmara de Lobos, Machico, Santana e Porto Santo. Deste modo, a empresa pública procede à gestão de 9 Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) e 14 Estações Elevatórias de Águas Residuais (EEAR), distribuídas pelos cinco concelhos. Os restantes municípios actuam sozinhos, ou seja por administração própria.
É aqui que reside, pelo menos para alguns, o ‘busilis’ da questão, porque a ARM não tendo responsabilidades nessas áreas geográficas não tem a obrigatoriedade de efectuar investimentos. Mas será que, ainda assim, todas as localidades onde actua a ARM estão cobertas? Todas as freguesias destes cinco concelho possuem rede? E a resposta é: Não!
Vejamos o caso de Santana.
Será que freguesias não possuem à data saneamento básico? “Faial, São Roque do Faial, Ilha, São Jorge e Arco de São Jorge não estão cobertas por rede pública de drenagem de águas residuais por serem freguesias tipicamente rurais, de baixa densidade populacional, sendo que a pressão sobre os recursos hídricos é menor comparativamente com as zonas urbanas de maior densidade populacional”, responde a ARM que aproveita para recordar os termos da legislação em vigor, nos locais ainda não servidos por rede pública de saneamento, as águas residuais dos prédios/habitações deverão ser encaminhadas para instalações adequadas para fazer a depuração dessas águas, por exemplo para fossas sépticas com poço de infiltração, que também são soluções funcionais, se estiverem devidamente dimensionadas e executadas.
Sendo assim, quantas redes de drenagem estão activas neste momento? Existem 13 redes de drenagem de águas residuais activas geridas pela ARM, nos municípios aderentes a esta empresa (Câmara de Lobos, Machico, Porto Santo, Ribeira Brava e Santana).
E em Câmara de Lobos?
A ARM garante que já investiu, desde 2016, 12,1 milhões de euros na melhoria do sistema de saneamento básico no município de Câmara de Lobos, o equivalente a 350 euros por habitante. Neste momento este concelho tem cerca de 60% de taxa de cobertura por redes de água residuais. Investiu numa ETAR em Câmara de Lobos e outra no Curral das Freiras bem como em 18,5 km de redes de águas residuais em todo o concelho. Ainda assim, muitas são as queixas, conforme à RTP-M foi relatado. Uma comissão de moradores do Garachico entregou um abaixo-assinado na Câmara onde exigiram o direito ao saneamento básico. O documento foi assinado por 250 moradores que pagam por um serviço que dizem não usufruir.
Recuemos na linha do tempo.
A 23 de Junho deste ano. Ao Porto de Recreio da Calheta. Nesse dia decorreu a sessão solene comemorativa do aniversário do concelho. O presidente da Câmara Municipal apontou no seu discurso que o projecto de saneamento básico iniciado pelo Governo Regional “nunca foi concluído”.
Pior. Que a ETAR, construída em Janeiro de 2007, num investimento de 4,1 milhões de euros, situada no extremo da marginal, a poucos metros de onde estava o edil, distintos convidados e o próprio presidente do Governo, necessita de um emissário submarino para melhorar a própria operacionalidade da estação.
O facto de o município não ser um dos concelhos aderentes à empresa pública Águas, Resíduos da Madeira, como são Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Santana. Porto Santo e Machico, dificulta a realização de investimentos por parte da tutela.
Ainda que se garanta que não há namoro aos municípios desalinhados, não é de Junho que se reclama atenção ao Governo para este dossier mas sabendo que não fazem parte dos aderentes, no entanto são os mesmos que dão grandes percentagens de votos dados ao partido que suporta o governo, como tem sido no caso da Calheta.
Outro problema.
A orografia acidentada obriga muitas vezes à construção de estações elevatórias de águas residuais onerando ainda mais estes investimentos. Num terreno acidentado, com estas características, mesmo quando existem colectores públicos para recolha de águas residuais, as construções desniveladas em relação aos arruamentos e veredas, onde os mesmos se encontram instalados, dificultam a ligação das redes prediais a esses colectores, obrigando que nos prédios sejam instalados sistemas elevatórios para vencer esses desníveis.
Logo os principais desafios no que se refere à expansão da rede pública de drenagem de águas residuais é a dispersão populacional, o que envolve grandes extensões de tubagem para recolher o esgoto e encaminhá-lo para as instalações de tratamento, envolvendo, portanto, investimentos muito avultados razão pela qual a própria Comissão Europeia considera sistema de saneamento adequado as fossas sépticas bem construídas.
Sabia que…
O sistema de drenagem e tratamento de águas residuais urbanas da Madeira compreende cerca de 410 km de rede de drenagem de águas residuais, que as transportam para tratamento nas ETAR e subsequente devolução ao meio natural?
Conclusão.
A falta de saneamento afecta milhares de pessoas? O concelho da Calheta possui pelo censos de 2021, 4.383 agregados domésticos, se apenas 20% estão ligados à rede, é fácil concluir que 3.507 casas estão sem rede de saneamento básico. Se no concelho de Santana existem 2.681 habitações e boa parte das freguesias não estão ligadas igualmente à rede, o número sobe drasticamente.