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O rei vai nu

A Sociedade da Informação parece estar a transformar-se na Sociedade do Efémero. A natural tendência para as novidades ultrapassou a capacidade de retenção e julgamento; tal como na Moda, onde a ênfase na inovação ultrapassou o critério da qualidade do tecido, deixando a função essencial da vestimenta para segundo plano.

Assim as memórias vão ficando mais curtas, na medida em que o volume de informação afoga o discernimento e a capacidade de processar essa informação.

Desta forma é fácil passar e impor uma certa ideia. Basta insistir nela e bloquear as restantes. Coisa que pensávamos que só sucederia em sistemas totalitários, mas não é bem assim. Há formas sofisticadas de atingir esse objectivo. Que o digam os que se têm debruçado sobre a manipulação de eleições ou condicionamento de mercados, em sociedades abertas.

Não é fenómeno novo. Fazer uma multidão acreditar numa coisa, e depois intimidar ou perseguir quem não acredita nela vem desde o fundo dos tempos; só que agora a dimensão e sofisticação aumentaram.

Vejamos um exemplo comezinho. Conhecemos bem a história popular “o rei vai nu”. Era algo que todos viam, mas não podiam assumir, e ainda menos falar, para não levar roda de estúpido.

Foi preciso uma criança inocente exclamar “o rei vai nu!” para que todos vissem o que todos já viam, mas não queriam (ou não podiam) admitir.

Recordando mais uma vez Winston Churchill, “nunca se mente tanto como antes das eleições, durante a guerra e depois da caça” (para ele, decerto, a pesca não era desporto de cavalheiros). E mais: mentir durante a guerra é um dever de ofício e uma obrigação patriótica; dizer a verdade ao inimigo pode ser considerado traição.

A guerra dos comunicados, na Ucrânia ou em Gaza, tem de ser compreendida nessa óptica. Enganar e manipular o adversário é um dever; o pior é que se torna muitas vezes necessário enganar os aliados e até os nossos próprios cidadãos.

Desabou uma tempestade quando António Guterres se referiu às acções de Israel em resposta aos massacres do Hamas. Até agora, ninguém de seu perfeito juízo apoiou aquela carnificina sobre a população israelita, nem contestou o direito de existência (e consequentemente, de defesa) de Israel. Mas aquelas declarações iam contra o pensamento maioritário (sem que se reflectisse porquê que era maioritário).

Claro que as reacções foram variadas, interna e externamente. Cá por casa, foi a reafirmação do princípio de que há quem tenha sempre razão e quem não possa, nunca, ter razão.

Há quem acuse Guterres de angelismo. Seguindo esta pista, as polémicas declarações têm algo de semelhante à candura do menino que disse “o rei vai nu”.

E assim ficou Netanya...nu.