Animalismo
1. Disco: gosto de bandas que conseguem, em cima do palco, reproduzir a potência do que criam em disco. Os The Kills são uma dessas bandas. Já tive a oportunidade de o atestar por duas vezes. “God Games” é um trabalho fabuloso. Rock do bom, sem tretas nem peneiras. A deixar os meus colegas de escritório com os cabelos em pé.
2. Livro: “Roma Sou Eu”, de Santiago Posteguillo, é um livro fabuloso. O autor recriou um brilhante Júlio César, um leal Tito Labieno, um corajoso Caio Mário, um detestável Sula, um ambicioso Pompeu, um corrupto e desprezível Dolabela e uma Aurélia inteligente e açucarada. Personagens da história cheias de vida. Um livro para ler com gosto.
3. Participei há dias, na RTP Madeira, num debate sobre a reforma da Autonomia. Reformista que sou, para além de liberal, considero este um dos temas-chave do nosso tempo, no que à Madeira diz respeito.
Reformar a Autonomia é não só uma necessidade urgente, mas também uma obrigação de todos os que se dedicam à política. E tem de ser o Parlamento regional a encabeçar este importante processo.
Em primeiro lugar porque não se pode reformar nada sem que se faça uma revisão constitucional, que retire da lei mais importante da República Portuguesa, os constrangimentos que esta coloca às autonomias. Só depois disto é que é possível rever o tratado paraconstitucional, que é o Estatuto Político Administrativo da Madeira. Este será um segundo momento.
Importante é, desde já, uma alteração à Lei Eleitoral que permita o voto antecipado e em mobilidade, tal qual é possível nas outras eleições nacionais. Mas isto não é tudo. Pensar coisas como o sistema eleitoral, o voto electrónico, a possibilidade de a diáspora poder eleger e estar representada, os apoios financeiros aos partidos deixarem de ser assegurados pela ALRAM, o modelo dos debates eleitorais, etc.
É necessário que se consolide e alargue o âmbito e modo de funcionamento do CINM, que se avance para um Sistema Fiscal Regional como próximo passo para um Sistema Fiscal Próprio.
Repensar e tratar de uma reorganização administrativa, de modo a estender a subsidiariedade aos órgãos autárquicos. Reduzir a máquina do Estado, tornando-a mais ágil e competente. Implementar os Conselhos Locais e aprovar uma lei das incompatibilidades eficaz.
Há muito o que fazer, uma vez que a Autonomia perdeu a capacidade de se reinventar, de se renovar, de ir mais além. Andamos sempre a arquitectar constrangimentos para o exercício da nossa liberdade, quando devia ser exactamente ao contrário. Temos de partir do princípio de que, tirando a Defesa, os Negócios Estrangeiros, a Representação do Estado, a Segurança Interna e a Justiça, em todo o resto é lícito que a Autonomia seja aí exercida. Com isto vem a responsabilidade de sermos o que queremos ser, sem isso beliscar a soberania do estado.
É preciso acabar com esta Autonomia de mão estendida, tornando-a mais digna, mais orgulhosa, mais sabedora e mais responsável. Uma Autonomia de todos e para todos.
4. Comecemos por uma simples questão: o que torna os seres humanos “pessoas” e, por que é que isso significa defender a sua dignidade acima do valor que outros seres possam ter?
A superioridade do ser humano sobre os animais tem sido dada como certa ao longo dos séculos, alegando-se para isso a racionalidade, a liberdade e o livre arbítrio, que tornam as pessoas sujeitos com direitos e deveres. Porém, nos dias que correm, surgem correntes que questionam esta suposta “superioridade” da raça humana sobre os animais.
O animalismo abre um debate que precisa ser feito, sob pena de deixarmos de perceber diferenças óbvias entre uns e os outros. Procurarei estabelecer o meu ponto de vista o mais claramente que consiga, apoiado no humanismo que assumo e no personalismo que não rejeito.
O que os diferentes (porque os há) movimentos animalistas partilham é a rejeição do antropocentrismo. Acreditam que a “pessoa” não é o centro moral do universo, que o homem já não é a medida de todas as coisas. Constroem uma espécie de descentralização onde procuram que os direitos entre humanos e animais sejam praticamente os mesmos, incluindo os animais no quadro ético e político, reconhecendo-lhes direitos e não conseguindo explicar que deveres têm, a não ser o conseguirem ser “fofinhos”.
Como raio será possível fazer com que um animal exerça a racionalidade, decida em liberdade e escolha o que considera ser o melhor para si?
Bem sei que o óbvio é sempre fácil de defender. Começo por não entender como é possível comparar o humanismo com o animalismo. Goste-se ou não, há uma superioridade da espécie humana. Mesmo que isso seja determinado por nós, o que pode parecer um pouco arrogante ou mesmo totalitário. Mas é elementar.
Olhemos agora a questão sobre outro prisma, que tem a ver com enquadramento legal. O animalismo apoia-se no princípio da “totalidade”: o valor é reconhecido em todos os seres, inclusive os animais, sejam eles quais forem, pelo simples fato de estes serem “seres”. Ou seja, atribuem-lhes “identidade”. Este princípio está livre do antropocentrismo, que confere valor apenas aos seres humanos. Ao defenderem a referida “totalidade”, como viabilizam a aplicação da legalidade, ou seja, como enquadram os animais no quadro jurídico, de que todos fazemos parte?
Há todo um mundo de diferenças entre um ser consciente e um senciente. Uma das coisas que nos define é o sermos responsáveis pelos nossos actos, porque temos consciência, pensamento estruturado e uma moral que nos rege.
A defesa dos animais exige, especificamente, uma discriminação entre os tipos de seres que podem ser considerados sujeitos de direito. Tratamos um cão da mesma maneira que um qualquer e repelente insecto?
E se uma espécie de “naturalismo” trouxer à equação as plantas, que também são seres vivos? Sentamo-nos no chão e deixamo-nos morrer?
Não abdico da minha liberdade, dos meus direitos e deveres, da minha pretensa racionalidade e da minha capacidade e possibilidade de escolha. Sou único, individual, tenho a minha identidade que me distingue dos outros, uma personalidade que me define. E, reafirmo, tenho consciência de tudo isto.
Pela minha parte asseguro todo o respeito por outros seres valiosos e vulneráveis, para com os quais existem obrigações morais de cuidado e responsabilidade. Assim, estas, só pode ter a ver com a protecção dos outros seres, sabedores que pessoas são pessoas, e animais são animais.
Na minha casa vivem, connosco, dois gatos tratados com todo o respeito e atenção. E é assim que continuará a ser.
5. Pelo que acima vai dito, fica uma dúvida: os candidatos do PAN às regionais, foram autodesignados como “pessoas” no seu sítio web. O que é estranho, uma vez que este partido se assume como animalista. É que o conceito de “pessoa” tem a ver com “humanismo”, que define o homem como valor supremo e medida de todas as coisas. Ou seja, uma perspectiva antropocentrista. “Pessoa” é personalidade, é individualidade. Com tudo isto consegue-se concluir que estas “pessoas” do PAN, são gente estranha. Muito estranha.
6. São muitas as minhas preocupações com o conflito Israel/Hamas. Mas não cometo a cretinice de diabolizar a posição de Israel, como se o Hamas fosse uma organização de santos libertadores.
O ataque do Hamas, a 7 de Outubro, merece uma análise cuidadosa, que considere a necessidade de segurança do Estado de Israel e a complexidade do conflito na região.
Israel, como qualquer outra nação, tem o direito de se defender contra ataques terroristas. Por outro lado, o Hamas é uma organização internacionalmente reconhecida como terrorista: ataques bombistas, lançamento indiscriminado de foguetes direcionados a cidades, colocando em perigo a vida de civis, tanto palestinianos como israelitas, raptos, violações, coação e morte.
Querer que numa guerra, porque é disso que falamos, não se verifiquem danos colaterais, é sonhar com uma impossibilidade.
Ouço avidamente falar em paz. Sem dúvida que esta é necessária. Mas não conheço em Gaza um interlocutor que a procure. De Gaza só conheço o Hamas, cujo fim é acabar com o Estado de Israel. No entanto, em Israel, partidos é o que não falta. Há-os de todos os géneros e feitios. Comunistas, trabalhistas, social-democratas, liberais, conservadores, populistas… há de tudo desde a extrema-direita à extrema-esquerda.
Em Israel reconhece-se o direito à diferença. Não se apedreja quem não quer seguir a corrente religioso-determinista. Em Israel há democracia, eleições, equilíbrio de poderes, por mais que os seus radicais queiram acabar com isso.
No que me toca, e não sendo pessoa de arranjar desculpas e de me escusar com os “mas” que tudo anulam, sei bem o que escolho: entre a democracia e o terror.
7. Gostava que alguém me conseguisse explicar, por que raio é que uma vereadora, sem qualquer pelouro, precisa de assessores especialistas em artes perfomativas a 2500 € por mês. Gostava mesmo.