Presidente da República veta decreto de reprivatização e pede clarificação
O Presidente da República vetou hoje o decreto do Governo que enquadra as condições para a reprivatização da TAP pedindo clarificação sobre a intervenção do Estado, a alienação ou aquisição de ativos e a transparência da operação.
Este veto foi divulgado através de uma nota publicada no sítio oficial da Presidência da República na Internet, na qual se lê que Marcelo Rebelo de Sousa "decidiu devolver ao Governo o diploma de privatização da TAP, solicitando a clarificação de três aspetos que considera essenciais".
O chefe de Estado pede ao Governo que clarifique "a capacidade de acompanhamento e intervenção do Estado numa empresa estratégica como a TAP; a questão da alienação ou aquisição de ativos ainda antes da privatização; a transparência de toda a operação", acrescenta-se na mesma nota.
Em carta dirigida ao primeiro-ministro, António Costa, divulgada juntamente com esta nota no sítio oficial da Presidência da República na Internet, Marcelo Rebelo de Sousa refere que "foram solicitados esclarecimentos complementares ao Governo" sobre "estas três questões específicas, mas cruciais".
"Infelizmente, as respostas, ontem [quinta-feira] recebidas, não permitiram clarificar na totalidade três aspetos que considero essenciais", lamenta.
Em primeiro lugar, o Presidente da República realça a importância da "futura efetiva capacidade de acompanhamento e intervenção do Estado numa empresa estratégica, como a TAP" e aponta que, "admitindo-se a venda de qualquer percentagem acima de 51%" da empresa, no decreto-lei "não se prevê ou permite, expressamente, em decisões administrativas posteriores, qualquer papel para o Estado".
Em segundo lugar, questiona o facto de "o diploma admitir que a TAP possa alienar ou adquirir, antes mesmo da decisão de venda, quaisquer tipos de ativos, sem outra mínima precisão ou critério, o que vai muito para além da projetada integração da Portugália na TAP SA".
Em terceiro lugar, o chefe de Estado critica o decreto-lei por "não assegurar a total transparência, numa fase de contactos anteriores à elaboração do caderno de encargos, ou seja, das regras que nortearão a escolha de eventual comprador, no mínimo tornando claro que não serão negociações vinculativas e que desses contactos ficará registo".
Na sua opinião, isso é "fundamental para garantir a prova da cabal isenção dos procedimentos, se for levantada, em momento ulterior, a questão da acima mencionada transparência do processo e da escolha do comprador".
Na carta dirigida ao primeiro-ministro, o chefe de Estado escreve que o diploma suscita "múltiplas dúvidas e reticências à luz da desejada máxima transparência do processo".
"Entendo que deve ser assegurada a máxima transparência em todo o processo que levará a uma decisão de venda do controlo da empresa", frisa.
Quando o Governo anunciou a aprovação deste decreto-lei em Conselho de Ministros, no dia 28 de setembro, Marcelo Rebelo de Sousa disse querer ver se "as condições legais de salvaguarda da posição do Estado" na reprivatização da TAP constavam do diploma que iria receber, ou se seriam remetidas para o caderno de encargos.
"Uma coisa é constar da lei, ter valor de lei, é mais duradouro, é mais forte. Outra coisa é constar de um conjunto de regras administrativas", declarou o Presidente da República aos jornalistas, em Oeiras, no distrito de Lisboa.
Marcelo Rebelo de Sousa salientou que o decreto-lei que enquadra as condições da reprivatização da TAP "provavelmente vai ser o único diploma legal na base da escolha que vier a ser feita".
Na apresentação do decreto, o ministro das Finanças, Fernando Medina, anunciou que o Governo pretende vender pelo menos 51% do capital da TAP, "essa é a percentagem mínima".
Quanto ao caderno de encargos, o ministro manifestou a intenção de o levar a Conselho de Ministros até ao fim deste ano, o mais tardar no início do próximo.
Uma semana antes, questionado se tinha alguma objeção a uma eventual reprivatização total da TAP, admitida no parlamento pelo primeiro-ministro, o Presidente da República respondeu: "Se for economicamente, financeiramente, do ponto de vista português, a melhor solução, é a melhor solução".
"Dir-se-á: mas o Estado deve ter instrumentos de intervenção. É possível haver privatização com instrumentos de intervenção. Portanto, depende das condições da privatização", acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa, em Nova Iorque, à margem da 78.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Segundo o Presidente da República, "qualquer Estado tem o cuidado de garantir condições mínimas de acompanhamento e de controlo", mas interrogou: "Isso é compatível com a privatização integral? Pode ser ou não ser. Veremos as condições".