O projecto da construção de um ‘Sistema de Teleféricos e Parque Aventura de Curral das Freiras – Madeira’, que tem como promotor o Governo Regional, através do Instituto de Florestas e Conservação da Natureza (IFCN) está cada vez mais próximo de ser concretizado.
A assinatura do contrato de concessão, na semana passada, com a Inspire Capital Atlantic, Sociedade de Investimento e Consultoria, Lda., veio tornar cada vez mais difícil e onerosa a pretensão de algumas organizações não governamentais que pugnam pela defesa do ambiente e da paisagem.
Mas o que poderá ainda ser feito para reverter esta situação?
No recente contexto político regional, em que o PSD-M, por força dos resultados das últimas Eleições Legislativas Regionais, se viu privado de maioria absoluta na Assembleia Legislativa da Madeira e foi obrigado a assinar um Acordo de Incidência Parlamentar com o partido Pessoas – Animais – Natureza (PAN), forte contestatário do projecto, muito se têm questionado os cidadãos sobre o que estará ao alcance de Mónica Freitas ou de qualquer opositor ao teleférico do Curral das Freiras.
Da parte da deputada do PAN, muito pouco haverá a fazer, pelo menos é o que se deduz das suas declarações, esta manhã, quando confrontada com a assinatura do contrato de concessão. À rádio TSF-Madeira e ao DIÁRIO, a parlamentar confirmou ter sido informada, nos encontros que antecederam à assinatura do Acordo de Incidência Parlamentar com o PSD-Madeira, de que “já havia um contrato a decorrer”, referindo-se, certamente, à autorização da adjudicação, que tem data de 20 de Setembro, quatro dias antes das Eleições Legislativas Regionais.
Foi, precisamente por já ter conhecimento dessa situação, que Mónica Freitas justifica não ter sido contemplada a suspensão do projecto no acordo firmado com os sociais-democratas, mas sim “de haver uma abertura e de ficar aberto para discussão, para que o PAN possa ter um papel interventivo no sentido de minimizar o impacto ambiental ao máximo”.
A deputada diz já ter solicitado à nova secretária regional de Agricultura e Ambiente, Rafaela Fernandes, no encontro mantido na semana passada, a documentação relativa do projecto, de forma a poder analisar o que já está decidido e assim “tomar uma posição mais concreta”. Só depois disso diz estar em condições de “averiguar qual a melhor solução”.
PAN pouco pode fazer em relação ao teleférico do Curral das Freiras
Em declarações à TSF-Madeira, Mónica Freitas confirmou ter sido informada na reunião prévia à assinatura do acordo com o PSD-Madeira de que o contrato de concessão já estaria a ser ultimado
Marco Livramento , 23 Outubro 2023 - 13:09
De caminho, disse haver sempre formas de “tentar mitigar ao máximo aquele que certamente será, e que é, o impacto ambiental”, razão pela qual solicitou, igualmente, todos os pareceres ambientais prévios, no sentido de se inteirar do que já foi elencado e, ao mesmo tempo, ver de que forma podem ser implementadas novas acções.
Entre as medidas mitigadoras, Mónica Freitas refere algumas acções que já estão salvaguardadas nos respectivos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e Declaração de Impacte Ambiental (DIA), sem acrescentar nada de novo ao processo. É o caso da intenção de “responsabilizar o concessionário e ele ficar obrigado a implementar medidas ambientais nas áreas adjacentes ao projecto, como forma de mitigar o impacto ambiental, nomeadamente através da plantação de plantas nativas em redor”.
A utilização de autocarros para o transporte de pessoas para os locais de partida/chegada do teleférico é apontada como uma forma de reduzir o impacto da pressão automóvel e da construção de grandes partes de estacionamento; da mesma forma, a quota de empregabilidade para os habitantes do Curral das Freiras será algo a merecer a atenção da parte da deputada do PAN, realçando o papel activo que pretende ter nos aspectos “que ainda estão em aberto e que são susceptíveis de negociação”.
O DIÁRIO questionou, igualmente, a Associação Observatório das Paisagens e dos Panoramas (OPP), que, no passado, se mostrou contrária à construção desta infra-estrutura, sobre que medidas tinham tomado para conseguir impedir a sua concretização e que contavam fazer, agora, depois de dado um passo importante na respectiva concessão.
Dejhenir Reis, presidente da organização, além de frisar que “o assunto do Teleférico do Curral das Freiras não é um assunto de freguesia, mas sim um assunto regional, nacional e europeu”, apontou que “a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) coloca e especifica um conjunto de falhas e de dados errados e de falhas graves, muitos dados são inúteis por exemplo os metrológicos”, disse.
Marco Livramento , 23 Outubro 2023 - 19:00
Nesse sentido, e olhando para o futuro, referiu que “a Associação Observatório das Paisagens e dos Panoramas estará atenta e actuante judicialmente, se necessário, de forma a que se cumpram as solicitações técnicas e científicas da DIA”, colocando mesmo a possibilidade de recorrer aos tribunais da República Portuguesa e Europeus, “no sentido de garantir a protecção dos interesses culturais de qualidade de vida e paisagísticos naturais da nossa Região Autónoma”.
A presidente da associação refere, também que “a formalização de qualquer iniciativa passará por comunicações e interacções prévias com a Direcção Regional do Ambiente e Alterações Climáticas (DRAAC), com o Instituto das Florestas e Conservação da Natureza (IFCN) e com a Câmara Municipal de Câmara de Lobos”. Só depois disso, “se necessário”, haverá o recurso aos tribunais, nomeadamente para veicular o cumprimento da lei do ruído ou a “protecção de espécies de elevadíssimo estado de protecção”.
O DIÁRIO ouviu, também, David Francisco, um dos elementos que integrou o movimento ‘É Possível Impedir a Destruição do Geossítio do Paredão’, que além de uma petição on-line, promoveu uma providência cautelar, no ano passado, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal.
Garantindo que nenhuma decisão foi apontada pelo tribunal em relação ao assunto, o activista diz achar “estranho que o Governo tenha lançado um concurso quando há uma providência em tribunal”, recusando, ainda assim, baixar a guarda e deixar de lutar contra o projecto.
À parte estas posições, o DIÁRIO procurou indagar o que pode ainda ser feito para travar a obra. Numa primeira instância, é sempre possível, ao concessionário, no caso o Governo Regional, pôr fim ao contrato, por alegado interesse público, assumindo as consequências financeiras que daí possam resultar, nomeadamente o pagamento das respectivas indemnizações resultantes da aplicação da lei em vigor.
Neste caso, é certo que, à medida que o processo avança, uma decisão nesse sentido reveste-se de maiores custos para os cofres da Região, sobretudo porque a empresa contraente ganhou direitos e assumiu custos com vista ao objectivo a que se propôs, dos quais terá de ser ressarcido.
O DIÁRIO falou com Ricardo Vieira, que conhece bem os meandros da lei na área do Direito Público e do Contencioso Administrativo. O advogado aponta que é sempre possível travar a execução do projecto, pese embora ressalve, precisamente, os custos que tal possa implicar para a Região.
No caso, o caminho a seguir será uma acção administrativa, com a qual venha a ser impugnada a decisão de o Governo Regional avançar para a respectiva concessão, ressalvando a importância dos fundamentos que servirão de base a esse mesmo procedimento. “Nessa acção deverá ser pedida a suspensão dos efeitos dessa decisão do Governo”, aponta do advogado, o que implica que o contrato tenha de ser suspenso até decisão do tribunal.
Havendo lugar a indemnizações, é necessário que a entidade contraente prove a existência de prejuízos. “Não é só o facto de suspender um contrato que dá direito a indemnizações. Essa entidade tem de ter efectivos prejuízos, que tem de alegar e provar”, reforça Ricardo Vieira.