Bombardeamentos prosseguem apesar da trégua anunciada por Moscovo
Os duelos de artilharia prosseguiram hoje em Bakhmut, epicentro dos combates no leste da Ucrânia, com bombardeamentos em outras zonas do país, apesar do anúncio por Moscovo de um cessar-fogo unilateral de 36 horas, denunciado como uma "manobra" por Kiev.
Diversos disparos provenientes dos dois lados em conflito foram percetíveis após o início do cessar-fogo nesta cidade com as ruas destruídas e quase deserta, mas a sua intensidade era menor face aos dias precedentes, indicou a agência noticiosa AFP.
Pavlo Diatchenko, um polícia de Bakhmut, assegurou que a trégua constitui "uma provocação" russa que não vai ajudar os civis que ainda permanecem na cidade. "São bombardeados dia e noite e quase todos os dias há pessoas mortas", disse, citado pela AFP.
O exército russo assegurou respeitar a trégua, mas acusou as tropas ucranianas de "prosseguirem o bombardeamento de cidades e das posições russas".
O chefe adjunto da administração presidencial ucraniana, Kyrylo Tymochenko, registou dois ataques russos em Kramatorsk (leste), que terão atingido um edifício residencial se provocar vítimas. Antes da trégua, tinha referido um bombardeamento russo sobre Kherson (sul).
Na região de Lugansk (leste), segundo responsáveis ucranianos, foram assinalados 14 disparos de artilharia e três assaltos russos, com os civis a permanecerem nos abrigos.
Por sua vez, as autoridades separatistas russófonas do leste da Ucrânia revelaram que as forças ucranianas voltaram a bombardear o seu bastião de Donetsk, antes e após a entrada em vigor teórica do cessar-fogo, anunciado na quinta-feira pelo Presidente russo Vladimir Putin.
Em paralelo, Kiev também denunciou ataques russos na região oriental de Lugansk (leste), com pelo menos 14 disparos nesta frente e um assalto, por três veze, de forças russas a uma localidade.
A vice-primeira-ministra ucraniana, Irina Vereshchuk, também acusou a Rússia de planear ataques contra igrejas nos territórios que controla para os atribuir às forças ucranianas.
"Não acreditem numa única palavra dos ocupantes. Se for possível, evitar comparecer nas igrejas em zonas onde decorrem bombardeamentos, porque os ocupantes utilizarão as pessoas como objetivo de ataques terroristas", advertiu em declarações pela televisão.
O ministério da Defesa russo assegurou ainda hoje, após a entrada em vigor do cessar-fogo, que as tropas russas se limitam de momento a responder aos ataques ucranianos.
Grande parte dos russos e ucranianos celebram esta noite a consoada e no sábado do dia de Natal devido à prevalência do calendário juliano pelas igrejas ortodoxas dos dois países.
Questionado em Nova Iorque sobre as anunciadas tréguas, o porta-voz da ONU, Stéphane Dujarric, disse que a organização não recebeu das suas equipas no terreno "relatos de combates significativos".
Mas sublinhou que a ONU não está a "monitorizar todas as linhas de frente", já que não tem acesso a grande parte das áreas do leste da Ucrânia ocupadas pelo exército russo.
A Presidência russa (Kremlin) afirmou na quinta-feira que Putin respondeu a um apelo do patriarca da Igreja Ortodoxa Russa para uma trégua durante as celebrações natalícias, ordenando um cessar-fogo ao longo de toda a linha de contacto na Ucrânia desde as 12:00 (de Moscovo, 09:00 de Lisboa) de 06 de janeiro deste ano até à meia-noite de 07 de janeiro (21:00 de Lisboa).
Mykhailo Podolyak, conselheiro do Presidente ucraniano, qualificou de "hipocrisia" o anúncio de Putin e disse que "apenas se a Rússia deixar os territórios ocupados será possível uma 'trégua temporária'".
O Presidente dos EUA, Joe Biden, disse que Putin está a tentar "ganhar fôlego", com o anúncio de um cessar-fogo, depois de ter estado" em 25 de dezembro e no Ano Novo
A chefe da diplomacia alemã, Annalena Baerbock, desvalorizou o cessar-fogo russo, tal como Josep Borrell, Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança.
A ofensiva militar lançada a 24 de fevereiro pela Rússia na Ucrânia causou até agora a fuga de mais de 14 milhões de pessoas - 6,5 milhões de deslocados internos e mais de 7,9 milhões para países europeus -, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Neste momento, 17,7 milhões de ucranianos precisam de ajuda humanitária e 9,3 milhões necessitam de ajuda alimentar e alojamento.
A invasão russa - justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de "desnazificar" e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia - foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que tem respondido com envio de armamento para a Ucrânia e imposição à Rússia de sanções políticas e económicas.
A ONU apresentou como confirmados desde o início da guerra 6.919 civis mortos e 11.075 feridos, sublinhando que estes números estão muito aquém dos reais.