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O fardo do calendário

A página do ano horribilis de 2022 não virou após o tímido fogo do Réveillon. Provavelmente teremos de redefinir os critérios do que será “horrível”, para não banalizar o caráter hediondo e familiarizá-lo, tornando-o normal e íntimo. Temos uma guerra, uma inflação galopante e juros que nos inquinam a vida.

A tão desejada “estabilidade” política portuguesa advinda da maioria absoluta de Costa, é afinal, um exercício de nepotismo de clã, a que o absolutista Primeiro-Ministro, avisa desde o trono, a que nos habituemos, perante o inócuo Presidente da República, que já assimilou o adiantado estado de decomposição, até à total putrefação dos seus mandatos por nós outorgados.

A estabilidade política alcançou, uma categorização sacralizada no atual sistema político português. É o alfa e o ómega da nossa vida política, independentemente da qualidade da democracia, caucionada pelo cheque-em-branco de uma maioria absoluta sufragada, coadjuvada por um presidente tornado em apatetado adorno, cuja primordial função, tem sido vulgarizar cada vez mais, uma palavra esvaziada de autoridade, moderação e até de bom senso, assinando a posse de qualquer um, no reduzidíssimo apeadeiro socialista.

O fardo é cada vez mais pesado na vida dos portugueses, pois, a par das dificuldades económicas prometidas e as já instaladas, junta-se uma ebulição política em crescendo, com epicentro no governo que vem notoriamente tomando gosto, pela implosão, e autofagia com a deterioração crescente de um conjunto de funções básicas do Estado, que cronicamente se mantêm anémicas, como os serviços de saúde de todo o país em permanente falência, numa terra onde a demografia está erodindo.

O início de cada ano marca sempre uma pressão intolerável à dupla insularidade do Porto Santo. O perpétuo operador concessionário da linha, cujo contrato leonino foi recentemente “calibrado”, de forma invariável, nunca encontra na Terra um ferry disponível que assegure a continuidade do serviço durante as longas semanas de ausência do “nosso” navio vintage, pelo que, recorre à penúria dos cativos 50 lugares por via aérea, para crónico, resignado e “profético” contentamento.

Apesar das bem-vindas rotas que ligam a Madeira a mais mundo, e que nos trazem mais turistas e receitas, a mobilidade interna continua assim a ser, o calcanhar de Aquiles dos ilhéus da Madeira, sempre que pretendam se deslocar entre as parcelas do país, cujo espartilho burocrático e administrativo, a República ainda não nos desonerou, apesar das várias iniciativas legislativas aprisionadas na gaveta, viradas as páginas de tanto calendário.

O que nos rodeia, jamais nos pode fazer desesperançar. Por isso, em jeito de desconfiada confiança, desejo-vos um Feliz 2023!