Administrador da Fundação Berardo classifica de "contraditórias" decisões de ministério
O administrador da extinta Fundação de Arte Moderna e Contemporânea - Coleção Berardo (FAMC-CB) André Luiz Gomes considerou hoje "contraditórias" as "declarações e decisões do ministro da Cultura" relativas ao processo que pôs fim ao acordo do Museu Berardo.
Na segunda-feira, o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, anunciou o novo nome do até aqui Museu Coleção Berardo, instalado no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, cuja gestão passou para a administração daquele equipamento cultural, ao fim de 15 anos, passando a designar-se Museu de Arte Contemporânea - CCB.
"Não é altura para tecer comentários por agora, para não cair na mesma voragem de decisões e declarações contraditórias do sr. ministro da Cultura", afirmou o administrador da FAMC-CB, contactado pela agência Lusa.
A extinção da FAMC-CB foi aprovada na terça-feira, por decreto-lei, em Conselho de Ministros, promulgada pelo Presidente da República dois dias depois, e é um dos passos do processo de transferência da gestão das obras de arte contemporânea do Museu Coleção Berardo para a Fundação CCB, onde está instalado.
"A Cultura exige ponderação, como aliás parece ter concluído, e bem, o Conselho Consultivo das Fundações, que não deu parecer positivo à extinção da FAMC-CB", acrescentou à Lusa André Luiz Gomes, um dos administradores da fundação, nomeado pelo colecionador José Berardo, que era presidente honorário vitalício.
Em maio, o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, tinha revelado a decisão do Governo de denunciar o protocolo assinado entre o Estado e o colecionador de arte José Berardo, que se renovaria automaticamente no final de 2022.
Com a denúncia do protocolo e a extinção FAMC-CB, a Fundação CCB volta a gerir e a tomar posse do módulo 3, o centro de exposições do edifício, onde está instalado o museu, e de onde o nome foi retirado na segunda-feira.
A Coleção Berardo -- que se encontra arrestada pela justiça e entregue ao CCB como fiel depositário -- vai continuar no mesmo espaço, num museu com novo nome, mantendo os mesmos cerca de trinta funcionários que ali trabalhavam, garantiu o ministro.
O museu com nova identidade vai abrir por fases ao longo deste ano e reunir, além da Coleção Berardo, obras da Coleção de Arte Contemporânea do Estado e da Coleção Ellipse, adquirida pelo Estado em 2022, após ter sido arrestada no âmbito da falência do Banco Privado Português.
Nesse sentido, a tutela indicou na segunda-feira que o orçamento da fundação CCB contará este ano com mais 2,1 milhões de euros, que transitam da extinta FAMC-CB.
Pedro Adão e Silva tinha afirmado anteriormente que "o Estado continua disponível e interessado em assegurar os seguros, a preservação, a manutenção da Coleção Berardo, enquanto os tribunais não tomam uma decisão em relação ao seu legítimo proprietário, desde que a fruição pública seja garantida".
Na segunda-feira, o ministro acrescentou: "Nesse contexto de incerteza, o que nos cabe é manter o compromisso de pagar seguros, garantir conservação, como contrapartida a fruição pública. [...] A coleção está arrestada, é nos termos do arresto que vamos funcionar. Aguardamos pelo terminar do processo. Quando estiver concluído negociaremos com quem for".
O MAC-CCB terá um "perfil internacional", mas existirá em "complementaridade e articulação" com o Museu Nacional de Arte Contemporânea - Museu do Chiado, também na capital, explicou, sem adiantar mais detalhes.
As obras da Coleção Berardo estão arrestadas desde julho de 2019, na sequência de um processo interposto em tribunal pelo Novo Banco, a Caixa Geral de Depósitos e o BCP, para recuperarem uma dívida próxima de 1.000 milhões de euros.
Inaugurado em 25 de junho de 2007, o Museu Coleção Berardo foi criado na sequência de um acordo assinado em 2006 para cedência gratuita, ao Estado, por dez anos, de uma coleção com 862 obras de arte do colecionador e empresário José Berardo, avaliadas, na altura, em 316 milhões de euros pela leiloeira internacional Christie's.
Em 2016, concluídos os 10 anos do acordo com o Estado para criar o Museu Coleção Berardo, foi assinada uma adenda entre as partes para prolongamento por mais seis anos, com a possibilidade de ser renovada automaticamente a partir de 2022, se não fosse denunciado por qualquer das partes nos seis meses antes do fim do protocolo.
Globalmente, na sequência do processo contencioso movido pelos bancos, foram arrestadas cerca de 2.200 obras de arte de José Berardo.
A coleção inclui obras de artistas como Jean Dubuffet, Joan Miró, Yves Klein, Piet Mondrian, Duchamp, Picasso, Chagall e Andy Warhol, além de artistas portugueses como Rui Chafes, José Pedro Croft, Jorge Molder e Fernanda Fragateiro.