Bazar do Povo – Souvenirs of Madeira
Na azáfama das compras do período natalício, o meu olhar deambulou algumas vezes entre a fachada desse estabelecimento icónico do centro do Funchal que é o Bazar do Povo e uma publicação recente da Direção Regional do Arquivo e Biblioteca da Madeira, alusiva aos postais editados por essa casa e, de forma esclarecedora, intitulada Bilhetes-Postais Ilustrados do Editor Bazar do Povo (1883 – 1951).
O estabelecimento, fundado então no ano de 1883 e no dia 19 de maio por Henrique Augusto Rodrigues, serve enquanto loja de quinquilharias, conforme estabelecido no contrato de arrendamento e de acordo com um artigo da autoria de Maria Helena Araújo publicado no Diário de Notícias, aquando da celebração dos cem anos do empreendimento. Além de licenciada em História, a autora – a quem agradecemos a generosa partilha de textos e imagem aqui reproduzidos – é bisneta de João Anacleto Rodrigues, irmão do fundador que se torna sócio do empreendimento em 1896, integrando ainda a sociedade fraterna Alfredo Guilherme Rodrigues.
A fotografia aparece como indelével paixão dos protagonistas e marca de um negócio que, em grande medida, se figura hoje historicamente através de imagens fotográficas, além de ter sido, ainda mais fundamentalmente, agente produtor e transmissor de uma visualidade turística da ilha que até hoje tem impacto sobre o imaginário que a partir dela se constrói e muito particularmente se ativa na época festiva – no Natal, mas sobretudo na passagem do ano.
Mas estas imagens não são o tema escolhido para o espaço desta crónica hoje. Tal como todo o álbum fotográfico e coleta de séries de imagens, em jeito de pastiche e colagem, fica para o ano novo que se inicia (talvez em torno de imagens do ano que findou e de objetos ou quinquilharias ainda a destinar) algumas impressões versadas sobre o Bazar do Povo reproduzidas nesse artigo de 1983.
Da autoria do Feiticeiro do Norte, e datando aparentemente de 1902, embora não descrevam postais fotográficos, estes versos trazem a superfície do universo dos materiais e dos gestos mais ou menos maquinais que a produção desses souvenirs fotográficos da Madeira exigiria.
O “Bazar do Povo”
“(…)
Temos o “Bazar do Povo”,
Poucos passos adiante…
Loja de quinquelharias
É esta a mais importante.
Entrar n’este estab’lecimento
Tão bellamente sortido
É, sim, da gente ficar
Mesmo com o queixo cahido.
E pela escada-caracol
Quem subir ao outro andar
E que vê então machinismos
Tudo ali a funcionar:
Machinas de tirar retratos,
Outras machinas de cortar,
Umas de imprimir livros
E outras de perfurar
Artigo ali em depósito
Não se pode numerar.
P’ra se poder descrever
O que ali vae em cabedal,
Era preciso um bom livro
Muito maior c’um missal.
É, sim, o “Bazar do Povo”
O que mais freguezes tem,
Porque vende mais barato
Servindo a todos bem.”
E terminamos com os votos de outros versos, desta vez feitos aquando dos cem anos do estabelecimento, pelo responsável pela contabilidade da firma que então o geria, a Henrique A. Rodrigues, de seu nome António Capelo, que deste modo traça ainda uma breve história do mesmo.
“A assinalar uma efeméride
Dois irmãos, certo dia,
Que não posso precisar,
Tiveram a alegria
De uma lojinha instalar.
Foi no Largo do Chafariz,
Que a sua vida começou,
E tem sido muito feliz,
Pois ainda não acabou!
E, assim, melhor pensando
Para a R. Bettencourt mudaram,
E foram, trabalhando, trabalhando
Para o fim que idealizaram.
Muitas alterações
Nessa loja praticaram
Com as várias ampliações
Que nela se realizaram.
E sempre em progressão constante
Alcançou posição cimeira
E, hoje, é um armazém importante
Que honra a nossa Madeira!
E a vida continua
E já é voz do povo
Que em verdade nua e crua
Haverá um armazém novo!
Com 100 anos de existência
Já está velho, velhinho
Mas tem a mesma consestência
De quando era novinho!
O certo é que, hoje em dia,
Estamos todos a aproveitar
Os efeitos, da teimosia
Daquele ambicioso par!
Que tenhais um Natal Feliz
Que o Novo Ano vos traga felicidade
É o que o coração me diz
Para desejar à colectividade!”